Luz Bendita

Capítulo VIII

… A abençoada mediunidade de Chico Xavier é dado indiscutível na história …



Palavras também do coração

No cristão e principalmente no espírita há como que um “sentimento de urgência” quando se está diante do.imperioso dever de testemunhar.

“Calar a verdade é omissão”, diz um provérbio antigo. E o Evangelho do Cristo, cujas palavras são “espírito e vida”, propõe à reflexão de cada ser humano: “Porventura, toma-se uma lanterna para colocar debaixo do alqueire ou do leito? Por acaso não é para colocar sobre o candelabro? Porque nada se oculta senão para depois ser manifestado. Nem coisa alguma se esconde, senão para depois vir a lume. Se alguém tem ouvidos para entender, entenda.” (Mc 4:21)

E é imbuída desta necessidade profunda de “colocar a luz sobre o alqueire”, (Mt 5:15) que rememoro um dos dias mais comoventes para o meu coração no ano de 1974 — o inesquecível 5 (cinco) de agosto. E olhando demoradamente… exaustivamente… para os três anos passados-presentes, porque permanecem dentro de mim, relembro fatos que, aparentemente sem significação, dentro do contexto, ganham conotação extraordinária. Relembro, por exemplo, quando Chico, o nosso querido Chico Xavier, adiou por uns dias um encontro que havíamos combinado para o final de julho em Uberaba.

Encontro-necessidade, encontro-afeição, encontro-luz, encontro-paz.

Estes encontros já vêm sendo feitos há alguns julhos de cada ano, antes mesmo da partida do nosso Carlinhos. Acompanhavam-me sempre, além do meu esposo, Clóvis Tavares, as amigas Profª Ruth de Oliveira Monteiro e Gilda Duncan Tavares e minha filha Margarida.

Neste ano, o nosso Chico, por motivos de compromissos seus, telegrafou-nos, adiando o tão esperado encontro, para o dia 5 (cinco) de agosto. Dias antes toda a cidade de Campos havia sofrido o golpe da perda brusca, em acidente de automóvel, de um grande professor e amigo, o Prof. Osvaldo Peixoto Martins. Na véspera do acontecido estivemos juntos numa reunião do Conselho de Professores da Escola Técnica Federal de Campos e durante alguns minutos conversamos sobre a sua filha mais velha Luciana e também sobre sua viagem do dia seguinte — a viagem do acidente.

Ao tomar conhecimento de minha próxima ida a Uberaba, a sua então viúva, Profª Ruth Maria Chaves Martins, escreveu para Chico uma carta, narrando o triste fato. Nesta carta, a nossa irmã, tomada da dor, abre o seu coração a Chico, contando-lhe o acidente fatal, embora reconhecendo, numa prova de coragem e fé incomparáveis, a proteção que tivera do Senhor quando poupou seus três únicos filhos de penosa situação.

Nenhum detalhe a mais havia no relato de nossa querida Ruth Maria.

Na tarde do dia 5 (cinco) de agosto deveríamos encontrar-nos com o querido médium em sua casa acolhedora. Ninguém se lembrara do detalhe do meu aniversário nesse dia, exceto Margaridinha, minha filha; que prevenida por mim, não comentou sobre o assunto com ninguém, justamente para evitar constrangimentos.

Mais ou menos às 16 horas chegamos à casa do nosso Chico. Ao abrir-nos o portão fui recebida por ele, D. Zilda e Sr. Weaker que, juntos, cantaram “Parabéns para você.” Não é preciso dizer o quanto me comovi e esquecendo-me, por um momento, de quem se tratava, perguntei-lhe:

— Chico, quem lhe contou?

— Ora, Hilda, foi o Carlinhos.

Esta prova maravilhosa da mediunidade límpida, espontânea, a cada momento mais surpreendente, de nosso Chico me levou, pela inefável doçura ambiental, à sensação de Deus presente…

Sob aquela sensação interior, misto de alegria e afeto, tivemos Chico, eu e minhas companheiras de viagem: Ruth Monteiro, Gilda Duncan, Dinan Tavares e minha filha Margarida, alguns momentos de troca de palavras vivas…

Não percebi a hora exata em que leu a carta que levara de Ruth Maria. Apenas comentou comigo, mais tarde, que havia se comovido bastante com o sentimento de que estava impregnada.

Mais ou menos às 18 horas caminhamos para o Centro Espírita Eurípedes Barsanulfo, de Peirópolis, a uns 20 km de Uberaba, um lugar humilde mas que toca de perto à sensibilidade religiosa de qualquer um. O presidente do Centro, Sr. Langerton, ficou surpreso com a nossa chegada. Não parecia esperar por nós, dada a sua admiração.

Entre pessoas humildes e sinceras, estudantes e praticantes do espiritismo cristão, velhos, jovens e crianças, iniciamos a reunião da noite, presidida pelo Sr. Langerton. Enquanto as palavras do Evangelho eram lidas e comentadas, o nosso Chico psicografava algumas páginas…

Ao final da sessão, como é de praxe, as mensagens foram lidas por ele, entre lágrimas e orações íntimas do grupo.

Uma era a do nosso Carlinhos (a sua segunda mensagem) “Palavras do Coração” e outra de Lenora, filha da Profª , que com poucos meses de vida havia desencarnado em meus braços, por uma dessas coincidências que só Deus explica, precisamente 8 (oito) anos antes do desastre.

Este fato era inteiramente desconhecido por Chico, pois a carta enviada por Ruth Maria foi um dos poucos contatos que mantivera até aí com o médium.

Não pude dominar minhas emoções. Afinal quem era Chico senão um mensageiro da Espiritualidade Maior, distribuindo provas de tal teor?

E as “Palavras do Coração” ditadas por Carlinhos ressoavam profundas dentro de mim como o seria para qualquer um que já tivesse tido um filho como Carlinhos, que jamais pudera em vida demonstrar perceber maiores detalhes que se passavam em seu derredor. Ressoavam como se fossem pérolas sonoras que o tempo não deveria consumir.


“Minha mãezinha querida,

Eis o seu filho de volta,

Trago hoje por escolta

Antigos votos em flor!…


Com eles, escrevo agora

Meu bilhete de alegria,

Comemorando o seu dia,

Abrilhantado de amor.


Aniversário feliz!…

Estranha força me invade,

É a presença da saudade,

Revendo o bolo de luz!…


Resguardando-me no colo,

Você dizia que eu era

Sua flor de primavera,

Seu presente de Jesus!…


A festa de nossa casa,

Em seu natalício lindo,

É sempre júbilo infindo

Que da memória não sai…


Margaridinha comigo,

Todos nós em seu carinho,

Flávio e Luís com Celsinho

E o coração de Papai!…


Meditando, agradecia

A nossa doce ventura.

Quantas lições de ternura!…

Benditos silêncios meus!…


Nosso lar foi minha escola,

Em que, de novo, criança,

Tive retorno à esperança,

Buscando a Bênção de Deus!…


Mãezinha, meus parabéns!…

Seja a fé, por luz sublime,

O apoio que nos arrime

Nas lutas que vêm e vão!…


Em seu lindo aniversário

— Dia feliz e dileto —

Nas flores de meu afeto,

Receba o meu coração!…


Depois desta o nosso filhinho escreveu, através da dedicação abençoada de Chico, mais duas mensagens, repletas de provas e de autenticidade.

Detalhes descritos nos versos acima, Chico os desconhecia completamente.

Com Carlinhos ao meu colo quantas e quantas vezes repeti-lhe:

— Você, meu filho, é que é o meu maior presente!

— Você é para mim um presente do Céu!

— Carlinhos, você é primavera constante em minha vida. Que seria de nossa casa sem você?

Durante quase dezessete anos era habitual entre nós, em todos os nossos aniversários, saborear juntos, ele no meu colo, o “bolo de luz” a que se refere tão carinhosamente em sua mensagem.

Só mesmo uma pessoa que estivesse presente em nosso dia a dia com o nosso Carlinhos teria condições de descrever de modo tão real a nossa saudosa convivência. E Chico, é claro, nunca esteve presente nesses momentos marcantes de nosso lar.

Há um outro detalhe dessa minha viagem que não pode deixar de ser relatado. Ao terminar a reunião Chico, que ignorava que eu mantivera um diálogo com o Prof. Osvaldo na véspera de sua morte e em circunstâncias especiais, me disse:

— Hilda, Carlinhos está me pedindo que você avise a D. Ruth que ela fique tranquila, pois desde o dia 6, véspera do acidente, ele conduziu até a Escola Técnica, onde estava o Prof. Osvaldo, as suas duas filhinhas, Lenora e Analaura, para permanecerem com ele até a hora fatal.

Provas maiores não poderia ter. A abençoada mediunidade de Chico Xavier é dado indiscutível na história do fato espírita. Não só indiscutível, mas fundamental.

Esse é o nosso médium… Mais que isso: um discípulo do Senhor que vive o bem, doando de si amor, sabedoria, segurança e consolo.



(Rua Benta Pereira, 112 - Campos, Rio de Janeiro)


Mãezinha Hilda, peço a bênção de Deus para nós.

Desculpe chamá-la assim… Penso em mãezinha Ruth, nestes dias de prova e compreendo que todas as mães aqui são minhas mães também. Especialmente a senhora que meus pais nos habituaram a considerar desse modo.

Rogo dizer à mãezinha Ruth que Deus não nos abandona. Ela se sente tão só depois do que sucedeu… Mas o papai não está morto. Ele e a nossa companheira estão hospitalizados. Muitos amigos estão velando por nós. Meu avô Martins que vim a conhecer-reconhecer aqui e a nossa tia Maria nos tranquilizam.

Mãezinha Hilda, peça à nossa mãe para não chorar mais à noite chamando papai, porque isso vai até ele sem que nós possamos saber como evitar-lhe a dor de querer dar resposta sem as forças precisas. Tudo será renovado para o bem de nós todos. Analice, Luciana e André Luiz precisam de nossa mãezinha robustecida e mais forte. Nossa vovó também necessita amparar-se mais em mãezinha Ruth.

Nós estamos juntos, todos juntos. O lar maior que não admite separação é o amor com que nos amamos. Todas as sombras vão passar. Estávamos, muitos de nós, com o papai Oswaldo no dia 7. Mamãe não precisa pensar que ele tenha sofrido dores. Aquilo que na terra foi choque, aqui foi sono aplicado. Ele acordou com serenidade, mas ainda chora com as lágrimas dos nossos entes queridos, especialmente minha mãezinha Ruth e minha vovó em pranto.

Diga por favor à mãezinha Ruth que nós estamos crescendo, a Aninha e eu estamos aqui para lembrar isso. Mãezinha Ruth terá forças para o trabalho e, pelo trabalho, teremos tudo o que for preciso para que nada nos falte. A vida não termina quando o corpo desaparece de nós. Tudo aqui é melhor, mas a saudade e a falta que sentimos uns dos outros não nos deixam pensar que assim seja. Mas os instrutores nos dizem que sem a luta e sem o sofrimento não aprenderíamos a seguir para Deus, em cujo amor todos nos reuniremos um dia.

Mãezinha Hilda, estamos gratas à senhora e a todos. Deus recompense a senhora e a todos os que puderem auxiliar a mãezinha Ruth a vencer a dor da separação, sustentando-se na fé.

Boa noite ao grupo fraterno. Escrevi com o coração. É tudo o que pude fazer. Deus nos proteja e nos abençoe.




(Mensagem recebida por Francisco Cândido Xavier no Centro Espírita Eurípedes Barsanulfo, de Peirópolis, Minas Gerais, em 5 de agosto de 1974).


() A Mensagem é dirigida particularmente à Profª Hilda Mussa Tavares, Profª de Matemática no Liceu de Humanidades de Campos e na Escola Técnica Federal de nossa cidade, amiga da família de Lenora.

() Profª Ruth Maria Chaves Martins, tanto quanto a Prof.a Hilda, cooperadora da Escola Jesus Cristo.

() Prof. Oswaldo Martins, professor de Geometria Descritiva e Desenho Geométrico na Faculdade de Filosofia, na Escola Técnica Federal e no Liceu de Humanidades de Campos. Vítima de desastre automobilístico, na manhã do domingo 7 de julho deste ano, nas proximidades de Casimiro de Abreu, RJ., desencarnou, cerca de quatro horas após, no Hospital da cidade de Macaé.

() Referência à jovem Eliceia, ama das crianças, também desencarnada no desastre.

() O Vovô Martins, de que fala Lenora é Adamastor Martins, pai do Prof. Oswaldo, desencarnado em 31 de janeiro de 1973. Em carta dirigida ao médium Francisco Cândido Xavier, agradecendo-lhe a mensagem espontaneamente por ele psicografada, a Prof.a Ruth Maria testifica: “Não há nenhum detalhe contraditório ou inexplicável no texto da mensagem. É toda ela íntegra e autêntica da primeira à última linha.” E sobre o Vovô Martins declara que “ele só viu Analaura e Lenora uma vez”… Daí a expressão “conhecer-reconhecer” da gentil mensageira espiritual.

() “Estávamos com o papai Oswaldo no dia 7”. Esta afirmativa de Lenora se desdobra em um fato admirável que, após a recepção da mensagem, o médium Xavier relatou à destinatária da mesma, prof.a Hilda Tavares. Declarou o médium que Carlinhos (Carlos 5ítor Mussa Tavares) que acabara de ditar para sua Mãezinha uma mensagem em versos, “Palavras do Coração”, lhe estava dizendo, no momento, que na véspera do desastre que vitimara o prof. Oswaldo, ele, Carlinhos, em companhia de outros Amigos Espirituais, conduzira as meninas Analaura e Lenora até junto de seu pai Oswaldo, que se encontrava em uma reunião de professores da Escola Técnica Federal. E ainda que as duas filhinhas ficaram em companhia de seu papai, desde a tarde de 6, a fim de ajudá-lo espiritualmente para a dolorosa provação da manhã de 7 de julho. Isso comprova a lição dos nossos Benfeitores Espirituais a respeito de uma relativa porcentagem de determinismo no quadro de nossos sofrimentos e provações terrestres.

() Na referida carta que a profª Ruth Maria escreveu ao médium Xavier, ela confirma esse estado de sonolência do Prof. Oswaldo, que, pela mensagem, ficamos a saber que era uma providência de ordem espiritual para evitar-lhe maiores sofrimentos: “Mas quando eu lhe perguntava o que sentia, ele dizia-me apenas que estava muito cansado e desejava interromper a viagem.”

() Aninha é Analaura, irmã de Lenora, desencarnada antes dela, em 3 de maio de 1964.

() O grupo fraterno é o das irmãs cooperadoras da Escola Jesus Cristo, em visita ao médium Xavier, nos primeiros dias de agosto deste ano— Profª Hilda Mussa Tavares, Profª Ruth Monteiro, estudante Margarida Maria M. Tavares, D. Dinan Polônio Tavares e Profª Gilda Duncan.