Nascer e Renascer

Capítulo V

Expiação



O problema da expiação não é privativo dos irmãos encarcerados nas enxovias do mundo.

A justiça humana, em verdade, apenas corrige o companheiro infeliz que caiu, desprevenido, nas malhas do delito espetacular.

Entretanto, nas reentrâncias de cada instituto doméstico, a crueldade oculta ergue trincheiras de ódio e separação, tanto quanto desabotoa tormentas de sangue e lágrimas, gerando as garras da enfermidade, tantas vezes mensageiras da morte.

Aqui é a ingratidão para com os entes mais caros; ali, é a calúnia retalhando a esperança alheia.

Além, é a deserção do dever, fazendo com que os ombros do próximo sangrem, feridos, ao peso de cargas acumuladas; mais além, é a atitude agressiva, sustentada com dureza e paixão, exterminando a sementeira de paz naqueles que às vezes nos pedem unicamente um sorriso de bondade ou um gesto de perdão para que se renovem perante Deus.

É aí, nesses redutos silenciosos da batalha de cada dia, que, muitas vezes enganamos e traímos, indiferentes à dor que implantamos naqueles que nos partilham a marcha, amealhando fel e inquietação, de mistura com as bênçãos de amor e trabalho que procuramos entesourar.

No entanto, a justiça Divina sabe joeirar nossos atos. E, nós mesmos, embora o carinho dos benfeitores abnegados que nos acolhem, no Mais Além, sem recursos para desculpar-nos, na intimidade da consciência, suplicamos o recomeço, renascendo na Terra, junto daqueles que se nos fazem credores nas trilhas da vida.

Sejam quais forem as nossas dificuldades no campo íntimo, saibamos aceitá-las de ânimo firme, incinerando no crematório da renúncia os nossos próprios desejos para que a felicidade dos outros nos assegure a própria felicidade, porquanto, conduzidos pela morte, ao império da Grande Luz, reconhecemo-nos, tais quais somos, aplicando a nós mesmos a lei do equilíbrio que determina a quem deve o reajuste preciso na base reta do ceitil por ceitil. (Mt 5:26)