Parnaso de além-túmulo

CAPÍTULO 13

Artur Azevedo



Nascido em S. Luís, no Maranhão, a 7 de Julho de 1855 e falecido na cidade do Rio de Janeiro a 22 de Outubro de 1908. Diretor Geral de Contabilidade do Ministério da viação. Poeta, comediógrafo, jornalista e crítico. Membro e fundador da Academia Brasileira, onde ocupou a cadeira de Martins Pena.


MINIATURAS DA SOCIEDADE ELEGANTE

I

Adriano Gonçalves de Macedo,

Homem de cabedais e alma sem siso,

Penetrou no seu quarto com um sorriso

Às dez horas da noite, muito a medo.


Uma carta de amante — era um segredo —

Ia abri-la, e, assim, era preciso

Que a sua esposa, dama de juízo

Não na visse nem mesmo por brinquedo:


Dona Corália Augusta Colavida

Estaria nessa hora recolhida?

Levantou a cortina, devagar…


Mas, que tragédia após esse perigo…

Viu que a esposa beijava um seu amigo,

Sobre o divã da sala de jantar.


II

No belo palacete do Furtado,

Palestrava a galante Mariquita

Com um pelintra afetado, assaz catita,

Bacharel delambido e enamorado.


De sobre a grande cômoda bonita,

Toma o moço um livrinho encadernado,

Revirando-o nas mãos, interessado,

Mas a jovem retoma-o, muito aflita:


— «Esse livro, Antonico, é meu breviário!»

Diz inquieta. E ele, cínico e falsário,

Arrebata-o às frágeis mãos trementes:


Abriu-o. Mais o olhava e mais se ria…

Era um compêndio de pornografia,

Recamado de quadros indecentes.


III

Dom Castilho, notável latinista,

Realizara alentada conferência,

Sobre rígido assunto moralista,

Protegido dos membros da regência.


Foi um sucesso. E a esposa Ana Fulgência,

Nele via uma grande alma de artista,

Louvando-lhe a utilíssima existência

De homem probo e notável publicista.


Que primor de moral! e os companheiros

Escritores, poetas, conselheiros,

Foram levar-lhe um abraço camarada.


Numa corrida louca, esses senhores

Foram achá-lo em seus trajes menores,

No apartamento escuro da criada…


Artur Azevedo