Parnaso de além-túmulo

Capítulo VII

Pedro de Alcântara



O último imperador deixou alguns sonetos, que, bem o sabemos, há quem diga não serem da sua lavra. Ignoramos porque D. Pedro II, alma boníssima, vibrátil, e espírito culto, não pudesse fazer o que fizeram e fazem tantos outros patrícios nossos, a ponto de ser correntio o conceito de que todo brasileiro é poeta aos 20 anos. De qualquer forma, entretanto, o que se não poderá negar é a estreita afinidade destes sonetos com os que, de D. Pedro, conhecemos.


MEU BRASIL

Longe do meu Brasil, triste e saudoso,

Bastas vezes sentia, mal desperto,

Com o coração pulsando estar já perto

Do pátrio lar risonho e bonançoso.


E deplorava o rumo escuro e incerto,

Do meu desterro amargo e desditoso,

Desalentado e fraco, sem repouso,

O coração em úlceras aberto.


Enviava, a chorar, na aura fagueira

Minhas recordações em terna prece

Ao torrão que adorara a vida inteira;


Até que a acerba dor, enfim, pudesse

Arrebatar-me à vida verdadeira,

Onde a luz da verdade resplandece.


NO EXÍLIO

Pode o céu do desterro ser tão belo,

Quanto o céu do país em que nascemos;

Nada faz com que o nosso desprezemos,

Acalentando o sonho de revê-lo.


Todo o nosso ideal pomos no anelo

De regressar, e voando sobre extremos,

Com o pensamento ansioso percorremos

Nosso amado rincão, lindo ou singelo.


Jaz no desterro a plaga da amargura,

De acerba pena ao pobre penitente,

De amaro pranto da alma torturada;


A alegria no exílio é desventura,

É a saudade na ânsia mais pungente

De retornar à pátria idolatrada.


ROGATIVA

Magnânimo Senhor que os orbes cria,

Povoando o Universo ilimitado,

Que dá pão ao faminto e ao desgraçado,

E ao sofredor os raios da alegria,


Se, de novo, no mundo, desterrado,

Necessitar viver inda algum dia.

Que regresse ditoso ao solo amado

Da generosa pátria que eu queria;


Se é mister retornar a um novo exílio.

Seja o Brasil, lá onde eu desejara

Ter vertido o meu pranto derradeiro.


Que, novamente viva sob o brilho,

Da mesma luz gloriosa que eu amara,

Na alcandorada terra do Cruzeiro.


SONETO

No exílio é que a alma vive da lembrança,

Numa doce saudade enternecida,

Tendo chorosa a vista que se cansa

De procurar a pátria estremecida;


Com dolorosas lágrimas avança,

Do sonho que teceu e amou na vida,

Para a morte, onde tem sua esperança,

Na celeste ventura prometida.


E Deus, que os orbes cria, generoso,

Na vastidão dos céus iluminados,

Concede a paz ao triste e ao desditoso


Na clara luz dos mundos elevados,

Onde, do amor, reserva o eterno gozo

Para as almas dos pobres desterrados.


PÁGINA DE GRATIDÃO

Tangendo as cordas da harpa da saudade,

Venho ao Brasil buscar a essência pura

Do amor da pátria minha, da doçura

Da flor cheia do aroma da amizade.


Prende-me o coração a suavidade

Desse arroubo de afeto e de ternura

Dalma do povo meu, que de ventura

E de alegria o espírito me invade.


Do misterioso aquém da morte, eu vejo,

Sentindo, essa onda intensa e luminosa

Da afeição, que idealiza o meu desejo:


E tendo a gratidão por companheira.

Volvo ao pátrio torrão de alma saudosa.

Amando mais a Terra Brasileira.


ORAÇÃO DO CRUZEIRO

(No cinquentenário da Abolição)


Luminosas estrelas do Cruzeiro,

Iluminai a terra da Esperança,

Na doce proteção de um povo inteiro

Onde a mão de Jesus desce e descansa.


Símbolo sacrossanto de aliança

De paz e amor do Eterno Pegureiro,

Guardai as claridades da Bonança

Na vastidão do solo brasileiro.


Constelação da Cruz, cheia de graças,

Transfundi numa só todas as raças,

No país da esperança e da bondade.


Que o Brasil, sob a luz da tua glória,

Possa escrever, no mundo, a grande história

Das epopeias da Fraternidade.


BANDEIRA DO BRASIL

Bandeira do Brasil, símbolo da bonança,

Enquanto a guerra estruge indômita e sombria,

Sê nos planos de luta o sinal de harmonia,

Espalhando no mundo as bênçãos da Esperança.


Assinalas, na Terra, o país da Alegria,

Onde toda a existência é um hino de abastança,

Guardas contigo a luz da bem-aventurança,

És o florão da paz, marcando um novo dia.


Nasceste sob a luz de um bem, alto e fecundo,

Nunca te conspurcaste aos embates do mundo,

Buscando iluminar as lutas, ao vivê-las…


É por isso que Deus, que te ampara e equilibra,

Deu-te um corpo auri-verde onde a paz canta e vibra,

E um coração azul, esmaltado de estrelas.


BRASIL DO BEM

Eis que o campo de sombra se esfacela

No doloroso e amargo cativeiro

Da guerra que ameaça o mundo inteiro

Qual furacão no auge da procela.


Mas na amplidão do solo brasileiro

Outra expressão de vida se revela

Nalma cariciosa, heroica e bela,

Que se engrandece ao brilho do Cruzeiro.


Grande Brasil do Bem e da Abastança,

Deus te guarde os tesouros da esperança,

Desde as luzes dos céus à luz dos ninhos!


Segue à frente do mundo aflito e errante

E alça o pendão pacífico e triunfante.

Como a doce promessa nos caminhos!..


BRASIL

Sopra o vento do ódio e da vingança,

Aniquilando a Paz do mundo inteiro,

Embora o Amor Divino do Cordeiro

Seja a fonte da Bem-aventurança.


Mas a terra ditosa da Esperança

Vive nas claridades do Cruzeiro,

Onde o Evangelho é o Doce Mensageiro

Das bênçãos da Verdade e da Bonança.


Meu Brasil, guarda a luz dessa vitória,

Que é o mais belo florão de tua glória

Nos caminhos da espiritualidade.


Ama a Deus. Faze o bem. Todo o problema

Está na compreensão clara e suprema

Do Trabalho, do Amor e da Verdade.