Tocando o Barco

Capítulo XXIV

Ante a parábola do rico



Não suponhas que o rico da parábola (Lc 16:19) seja a única espécie de mordomo infeliz na vida espiritual.

Ainda hoje há quem se banqueteia no festim da saúde física, menosprezando os enfermos que lhe batem à porta.

Por toda parte, verificamos a luzida assembleia dos que se fartam à mesa da inteligência, olvidando os irmãos de caminho que lhes pedem socorro, mergulhados nas correntes da ignorância.

Em todos os lugares, é possível observar a caravana dos que passam, hipertrofiados de conforto, fugindo aos filhos da angústia que lhes imploram uma réstia de alegria.

Nas variadas sendas do mundo, somos defrontados pelos que se mostram supernutridos de fé, a menoscabar aqueles que lhes suplicam leve migalha de esperança.

Todos somos surpreendidos pelos lázaros da necessidade e da aflição em provas mais ríspidas que as nossas.

Todos identificamos, junto do próprio coração, bafejado de conhecimento superior, companheiros infortunados que se enriqueceriam com mínimos gestos nossos, no setor da bondade e do estímulo, do entendimento e do perdão.

Não te detenhas, tão somente, na contemplação do quadro evangélico, em que um pobre sovina encontrou, ao fim da estrada, apenas o azinhavre a que se lhe reduziu o perecível tesouro.

Recordemos nossas oportunidades de semear o bem, reconhecendo no próximo o degrau vivo que nos conferirá o desejado acesso à comunhão com a Providência Divina.

Abracemos os penitentes da necessidade e do desânimo, da expiação e do sofrimento, que nos anotam os passos, em todos os ângulos da estrada evolutiva e, oferecendo-lhes o próprio coração, em forma de serviço fraterno, estejamos convencidos de que marcharemos com eles na direção da vida imperecível, para a incorporação definitiva de nossa herança espiritual.