O mundo estava repleto de lugares solitários.
A multidão de massa informe, volumosa, que atropela, aturde, esmaga. Em um momento fazse tranquila para, logo depois, agitar-se, crescer e arrebentar-se contra tudo quanto está à frente.
Ameaçadora, é difícil de ser controlada, em razão dos impulsos que nascem nas suas paixões devastadoras.
Jesus sempre a enfrentava tomando a compaixão pela sua loucura, sua ansiedade, sua irreflexão.
Não raro, por isso mesmo, Ele procurava um lugar solitário para orar e reabastecer-se em Deus.
As criaturas ávidas, que formavam a multidão, sempre tomam, sem dar, querem mais, até a exaustão, sem retribuir; renovam-se, incessantemente, sem consideração pelo agente do seu conforto. . .
Rebelam-se com facilidade e os lábios que sorriem se crispam de ira, as mãos que aplaudem, esbofeteiam, o entusiasmo se converte em ódio.
Há lugares solitários, geograficamente, nos quais se ouvem a música do silêncio e a voz de Deus. Ali é possivel reencontrar-se, revitalizar-se, pensar. . . para depois enfrentar-se a multidão.
Quem não os busca, exaure-se com facilidade, atormenta-se, perde o contato com Deus e consigo mesmo.
Arrastado para toda parte e lugar nenhum, o incauto se desconserta e se estiola, vencido pela ingrata, incansável multidão.
Também existem pessoas que são lugares solitários, porque se fazem áridas, amargas, abandonando-se à auto compaixão, à descrença.
Esvaziadas de ideias, nada as preenche.
Mortificam-se e acusam, sem dar-se oportunidade de renovação e plenitude.
São lugares-abismos perigosos porque, no seu pessimismo, contagiam os inexperientes e torpedeiam os belos programas de enobrecimento.
É necessário cuidar-se para não se envolver com elas, nem se intoxicar com o bafio pestífero que exalam.
Nos lugares solitários da Natureza há um clima para reflexão, busca interior, paz. O silêncio não é constrangedor, porque ali se escuta o pulsar do coração vivo da Criação e mil sons que compõem a música da harmonia universal.
Nas criaturas lugares-solitários nos montes, há uma aridez de morte e um silêncio de constrangimento, em reações mal controladas contra a vida.
Jesus preferia os lugares solitários nos montes, longe-perto das multidões.
Ele viera para conduzir as pessoas ao aprisco, considerando-as ovelhas, algumas dóceis, outras rebeldes, várias enfermas. . .
Era-lhe necessário conviver, participar dos seus cuidados e aspirações, dos seus choques e paixões, a fim de atendê-las, não naquilo que queriam, porém no que realmente, necessitavam.
Não é de estranhar, que os amigos, ainda ignorando o programa de trabalho, ao encontrá-lo, reclamassem: - Todos Te procuram.
Essa ânsia e busca de soluções fáceis permanecem nos seres humanos, que ainda preferem desfrutar do alheio esforço, ao invés de empreenderem-se eles próprios, caracterizando nossos dias de alienação.
Como Jesus e Sua mensagem não se submetiam aos paradoxos humanos, que de cedo Ele definiu, a Sua resposta foi peremptória a Pedro e àquele que o buscavam: - Vamos para outra parte, para as aldeias vizinhas, a fim de pregar ali, pois foi para isso que saí.
As doenças e os problemas são fomentados pelo próprio indivíduo, que se liberta de uns e elabora outros, pela ignorância na qual se demoram, pela rebeldia que agasalham, pelo egoísmo a que se entregam. . .
Imperioso é o iluminar da consciência, a fim de compreender o objetivo da existência, pautando os atos de conformidade com as metas morais abraçadas. Enquanto isso não se dá, a pessoa transfere-se uma dificuldade para outra permanecendo sempre aflita.
A Sua pregação possuía o caráter de libertação.
O homem imediatista não se dá conta da sua impermanência existencial, porque vive momentos que sucedem outros, sem excogitar do programa real, mediato, que é a vida em si mesma.
Vagueando pelas paisagens da sensação, é fisiológico, brutalizado, gozador, descomprometido com o trabalho e a ordem, que o desagradam.
Quando se alcança o nível espiritual da existência humana, as aspirações se elevam aos graus da emoção superior e alterações no comportamento erguem às cumeadas da alegria, da ventura.
A humanidade natural nele floresce e o desinteresse pelas ilusões e seus famanazes é espontâneo, ficando rico de jubilo, sem sinais de apego ou rumores de lamentações.
Jesus veio a fim de despertar os seres humanos para o encontro de sim mesmos, a conquista das ilimitadas paisagens do belo, do Espírito, da imortalidade.
Aqueles, porém, como ainda se encontra, dormindo sob as couraças da indiferença, dos desejos infrenes, do personalismo, da violência.
Era necessário golpear-lhes o envoltório até retirá-los, para que pudessem considerar a realidade e compreender o que ainda não descobriram.
Ele então curava as suas malezas, atendia as suas necessidades, crescia aos seus olhos e passava a ser considerado, porém enquanto lhe interessava, pois que, na Sua aflição, testemunho e doação, Ele foi deixado a sós, até pelos o amavam. . .
Assim, naquela oportunidade, após pregar, ministrando a terapia preventiva, ele curou por toda Galileia e expulsou os Espíritos perturbadores que atenazavam os seus companheiros afins.
O deslumbramento das multidões seguia-O em pós e cada vez maior número daqueles que recorriam à Sua ajuda.
Sempre haverá dores e mazelas nas multidões, enquanto perdurarem as paixões desencadeadoras.
Somente a transformação íntima do ser constituir-lhe-á recursos de impeditivo para a instalação das matrizes do sofrimento no corpo sutil do Espírito. Esse esforço desafiador lentamente nasce e se desenvolve à medida que a própria dor lapida o egoísmo e dilacera as paixões dissolventes em dominação arbitrária.
Enquanto luz a esperança e a multidão estruge qual mar violento nas praias, é necessário recorrer a lugares solitários para falar a Deus, ouvi-lo e adquirir forças para falar e escutá-las às criaturas humanas.