Florações Evangélicas

CAPÍTULO 57

CULTOS AOS MORTOS



Resultante da ignorância, o culto dos mortos entre os povos primitivos se espalhou pelas múltiplas Civilizações da antiguidade, gerando, em consequência, lamentáveis processos de desregramento religioso, que derrapavam, quase sempre, em dolorosos conúbios obsessivos. Entidades primárias e viciosas, utilizando-se das paixões vigentes, exigiam, selvagens, sacrifícios de vidas humanas, que o tempo se encarregou de suprimir. . . Os holocaustos desta e daquela natureza foram sofrendo variações por impositivos do progresso até assumirem conceituação metafísica, transmudando a mecânica da forma para a essência do espírito sacrificial. Concomitantemente, estabeleceu-se o intercâmbio entre os dois mundos: o dos encarnados e o dos desencarnados, que retornavam com as mesmas características da personalidade desenvolvida antes do túmulo, exteriorizando as emoções e as sensações compatíveis ao estado de evolução de cada um. Nos santuários dos Templos, nas Escolas de iniciação, nos “Mistérios", os mortos sempre assumiram papel preponderante, traduzindo os desejos dos “deuses", — “deuses" que se fariam crer, — conduzindo, não raro, e em consequência, o pensamento humano às nascentes da vida, e elucidando os enigmas do ser, as diretrizes dos destinos e os impositivos da dor. . . Filósofos e heróis, conquistadores e reis, magos e sacerdotes do passado mantiveram, dessa forma, longo comércio com o Mundo Espiritual em inolvidáveis diálogos, dos quais ressumavam a essência da vida verdadeira, a imortalidade, a comunicabilidade e a reencarnação do espírito. . .
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Com Jesus, no entanto, os chamados mortos receberam o necessário respeito, ocupando o devido lugar. Seus encontros com os libertos da carne, mencionados no Evangelho, são memoráveis, inconfundíveis. E a ética decorrente desse convívio, vazada na elevação moral e na renúncia, no amor e na caridade constitui, ainda hoje, a linha de equilíbrio e base de segurança para a vida. Depois d’Ele, Allan Kardec, o Missionário francês, de Lion, foi investido pelo Alto com a inapreciável condição de desvelar a vida além da sepultura, facultando o renascimento do Cristianismo nos espíritos e nos corações, e abrindo nobres ensanchas para o intercâmbio com as Esferas Espirituais. Os próprios 1mortais aquiesceram em elucidar os enigmas humanos com a divina permissão, ampliando enormemente os horizontes do entendimento sobre a vida imperecível, após o decesso orgânico. Porque a Terra necessitasse de inadiável despertamento para as realidades do espírito, os Embaixadores dos Céus mergulharam no corpo e renasceram nos diversos campos do pensamento e da investigação, colaborando com tirocínios lúcidos e comprovações indubitáveis da continuidade da vida após a morte. Luminares do Reino mantiveram comunhão com os homens, através da mediunidade dignificada, repetindo a mensagem do Cordeiro de Deus aos corações amargurados e contribuindo com farta cópia de revelações novas. Não mais a morte. Em toda a parte exulta a vida. Ninguém se aniquila na morte. Muda-se de estado vibratório sem que se opere mudança intrínseca naquele que é considerado morto. Morrer é, também, reviver. Mortos estão, em realidade, aqueles que têm fechados os olhos para a vida e jazem anestesiados na ilusão, deambulando, em hipnose inditosa, entre viciações e engodos. Cada ser é além do corpo o que cultivou na indumentária carnal. Nem melhor nem pior do que era. As construções mentais, longamente atendidas, não se apagam dos painéis espirituais ao toque mágico da desencarnação, nem tampouco o culto da personalidade, os hábitos infelizes se rompem, de imediato, graças ao bisturi miraculoso da morte. Morrer e viver nas vibrações materiais são contingências que dizem respeito a cada um.
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Por essa razão, em memória dos teus mortos queridos, que vivem, não lhes açules as paixões subalternas com oferendas de ordem material, Já não necessitam dos mimos enganadores nem das demonstrações exteriores do mundo da forma. Têm agora outro conceito, compreendem melhor o que foram, como poderiam e deveriam ter sido, e lamentam, se não souberam conduzir a experiência pelas nobres linhas da elevação moral. Respeita-lhes a memória, mas desvincula-os das coisas transitórias. Ama-os, e liberta-os das evocações dolorosas do vaso carnal. Ajuda, através da tua valiosa dádiva de amor, os que se demoram ao teu lado experimentando aflições e desesperos. Transforma as flores débeis que logo fenecem em pães de esperança, que sustentarão vidas em quase extinção. Apaga os círios de parca luminescência e acende a luz da caridade, pensando neles, para que as lâmpadas de misericórdia que coloques em outras vidas possam transformar-se em claridade sublime nas consciências deles. Mitiga a sede, diminui a fome, alfabetiza, enseja o medicamento, fomenta a concórdia, distribui a esperança, divulga a paz, recordando aqueles a quem amas e que partiram para o mais além, e chuvas de bênçãos cairão sobre eles, abençoando-te também. Não os pranteies em desesperos, não os exaltes em qualidades que não possuem. Recorda-os na saudade e mantém-nos na lembrança do carinho, sabendo por antecipação que um dia virá em que jornadear, também, na direção desse Mundo em que eles se encontram, voltando a estar ao lado deles, sendo feliz outra vez. E como dispões ainda de tempo para preparar a sua viagem de retorno à Pátria Espiritual, organizais emocionalmente, entregando tua vida à Providência Divina e vivendo de tal forma no corpo que, em chegando o momento da desencarnação, não te detenhas atado às mazelas nem às constrições do vasilhame carnal.


“Se alguém guardar a minha palavra, nunca, jamais, provará a morte".

(João 8:52)


“O respeito que aos mortos se consagra não é a matéria que o inspira, é, pela lembrança, o Espírito ausente quem o infunde".

(O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO, Capítulo 23º — Item 8, parágrafo 2)