Antologia da Espiritualidade

Capítulo X

Anseio de amor



Quando me vi, depois da morte,

Em sublime transporte,

E reclamei contra a fogueira

Que me havia calcinado a vida inteira

Pela sede de amor…


Quando aleguei que fora, em toda estrada,

Folha ao vento,

Andorinha esmagada

Sob o trator do sofrimento…


Quando exaltei a minha dor,

Mágoa de quem amara sempre em vão,

Farta de incompreensão…


Alguém chegou, junto de mim,

E disse assim:


— Maria Dolores,

Você que vem do mundo,

E se diz

Tão cansada e infeliz,

Que notícias me dá do vale fundo

De provação,

Onde a criatura de tanto padecer

Não consegue saber

Se sofre ou não?


Você que diz trazer o seio morto,

Que me pode falar

Dos meninos sem pão e sem conforto,

Das mulheres sem lar,

Dos enfermos sozinhos,

Que a febre e a fome esmagam nos caminhos,

Sem sequer um lençol ou a bênção de uma prece,

Dando graças a Deus, quando a morte aparece?!…


Você, Maria Dolores,

Que afirma haver amado tanto

E que deve ter visto

O sacrifício e o pranto

De quem clama por Cristo,

Suplicando o carinho que não tem,

Que me pode contar daquelas outras dores,

Daquelas outras aflições

Dos que choram trancados em manicômios e prisões,

Buscando amor, pedindo amor,

Exaustos de tristeza e de amargura,

Como feras na grade,

Morrendo de secura,

De solidão, de angústia e de saudade?!…

…………………………………………………..


Bem-querer!… Bem-querer!…

Ai de mim, que nada pude responder!

Que tortura, meu Deus, a verdade, no Além!…

Calei-me, envergonhada…


Eu apenas quisera ser amada,

Não amara a ninguém…