A Gênese
CAPÍTULO XV
Os Milagres do Evangelho
Tentação de Jesus
• Item 53 •
“Jesus não foi arrebatado. Ele apenas quis fazer que os homens compreendessem que a Humanidade se acha sujeita a falir e que deve manter-se sempre vigilante contra as más inspirações a que, pela sua natureza fraca, é impelida a ceder. A tentação de Jesus é, pois, uma figura e fora preciso ser cego para tomá-la ao pé da letra. Como pretenderíeis que o Messias, o Verbo de Deus encarnado, tenha estado submetido, por algum tempo, por mais curto que fosse, às sugestões do demônio e que, como diz o Evangelho de Lucas, o demônio o houvesse deixado por algum tempo, o que levaria a supor que o Cristo continuou submetido ao poder daquela entidade maléfica? Não; compreendei melhor os ensinos que vos foram dados. O Espírito do mal não teria nenhum poder sobre a essência do bem. Ninguém diz ter visto Jesus no cume da montanha, nem no pináculo do Templo. Sem dúvida, tal fato se teria espalhado por todos os povos. A tentação, portanto, não constituiu um ato material e físico. Quanto ao ato moral, admitiríeis que o Espírito das trevas pudesse dizer àquele que conhecia sua própria origem e o seu poder: ‘Adorame, que te darei todos os reinos da Terra?’. Então o demônio desconheceria aquele a quem fazia tais oferecimentos? Não é provável. Ora, se o conhecia, suas propostas eram uma insensatez, pois ele sabia perfeitamente que seria repelido por aquele que viera destruir o seu império sobre os homens.
.Compreendei, portanto, o sentido dessa parábola, pois se trata apenas de uma parábola, do mesmo modo que nos casos do Filho Pródigo e do Bom Samaritano. Aquela mostra os perigos que correm os homens, se não resistem à voz íntima que lhes clama sem cessar: ‘Podes ser mais do que és; podes possuir mais do que possuis; podes engrandecer-te, adquirir muito; cede à voz da ambição e todos os teus desejos serão satisfeitos’. Ela vos mostra o perigo e o meio de o evitardes, dizendo às más inspirações: Retira-te, Satanás ou, por outras palavras: Vai-te, tentação.
!As duas outras parábolas que lembrei mostram o que ainda pode esperar aquele que, por muito fraco para expulsar o demônio, lhe sucumbiu às tentações. Mostram a misericórdia do pai de família, pousando a mão sobre a fronte do filho arrependido e concedendo-lhe, com amor, o perdão implorado. Mostram o culpado, o cismático, o homem repelido por seus irmãos, valendo mais, aos olhos do Juiz Supremo, do que os que o desprezam, por praticar Ele as virtudes ensinadas pela lei de amor.
.Pesai bem os ensinamentos que os Evangelhos contêm; sabei distinguir o que ali está em sentido próprio, ou em sentido figurado, e os erros que vos têm cegado durante tantos séculos se apagarão pouco a pouco, cedendo lugar à brilhante luz da verdade”. – João Evangelista (Bordeaux, 1862.)