Chico Xavier Inédito

Capítulo XIX

Convicção do Espírito



Romeu de Campos 5ergal (02/5/1903-23/7/1
980) foi um dos espíritas mais atuantes no Estado de São Paulo, tendo sido Deputado Estadual (1935-1
937) e Federal em várias Legislaturas, de 1946 a 1970. Político e espírita intimorato, ingressou bastante jovem no Espiritismo, participando de vários movimentos de propaganda da Doutrina, principalmente como privilegiado orador.

Em data exata que não conseguimos precisar, provavelmente entre 1950 e 1955, Campos 5ergal, acompanhado de outros confrades, esteve em Pedro Leopoldo visitando Chico Xavier e recebeu esta mensagem, certamente ligada a seu trabalho de legislador, no qual deveria estar empenhado em alguma causa favorável à condição das mulheres. A sabedoria contida nas palavras de Emmanuel convida-nos a meditar o assunto.


Meus amigos, muita paz.

Espiritismo, em verdade, não é um sistema de promessas para a beatitude celestial. É realização do Bem, do Céu na Terra, serviço libertador de consciências e corações para hoje, aqui e agora. Congregados na mesma edificação, sentimo-nos felizes identificando-lhes o sadio propósito de concretizar os ideais divinos, no círculo das experiências humanas. Nossa fé, em tempo algum, deve circunscrever-se ao incenso adorativo, porquanto, em substância, é luta digna por um mundo melhor e por criaturas mais felizes, estendendo-se de nossas convicções mais íntimas aos nossos atos mais insignificantes. E por relacionarmos semelhantes imperativos dos princípios redentores que nos irmanam, cabe-nos o prazer de insistir com o nosso irmão Romeu Campos 5ergal, que partilha conosco esta meta de espiritualidade no sentido de preservar em sua expressiva tarefa junto da mente feminina, à luz do Espiritismo santificante.

Permanecemos à frente de um mundo necessitado e o campo de serviço requisita compreensão e atividade sem tréguas em benefício da paz. A política internacional não modificou seus quadros de luta, e o espírito de hegemonia domina, infelizmente, os que governam, quase tanto quanto há dois mil anos, em que a sociedade humana se dividia entre os dominadores possíveis de hoje e as vítimas prováveis de amanhã, nos incessantes espetáculos de ruína e de sangue.

Não obstante os entendimentos diplomáticos e, apesar da mensagem respeitável dos pensadores dignos, a dolorosa realidade não pode ocultar-se aos mais avisados de raciocínio. De armas ensarilhadas, tão somente, legiões compactas organizam-se vagarosamente para novos embates. Como cogitar uma paz duradoura sem as bases da concórdia espiritual? Em que alicerces pavimentar os programas da ordem se a revolta domina, se a insegurança prevalece, se a desesperação campeia em todos os climas? Impossível arregimentar elementos para o edifício da cooperação mundial, embora nosso dever é de respeito a todas as organizações veneráveis que objetivem a união da família humana, sem a construção da paz espiritual, fruto espontâneo do entendimento superior do homem no campo da vida.

Defrontados por tremenda crise de caráter em quase todas as regiões do globo, urge renovarmos o roteiro da fé libertadora e esperança que nos reanime a consciência e fortaleça o coração para consentimentos indispensáveis. Não julguem que os desencarnados, de cuja sorte partilhamos, permaneçam a distância dos enigmas que ensandecem a mentalidade do mundo. A morte não nos exonera da responsabilidade perante a nossa realização, que é o Orbe Terrestre. Dividimos o serviço restaurador e velamos como todos, na marcha de reajustamento compartilhando alegria e dores, expectativas e desenganos. Leis eternas traçam-nos obrigações de reciprocidade nos círculos evolutivos em que nos movimentamos e, ainda que o poder humano nos desintegre a morada material que hoje lhes obriga a experiência corpórea, nem por isso estaríamos libertos do dever que nos irmana uns aos outros, em torno da ordem divina.

Cooperamos, assim, na extensão do Espiritismo salvador, reconstruindo o santuário da crença que os dogmas destruíram. Combatamos, em nós mesmos, à sombra do exclusivismo, para que a universalidade nos enriqueça os sentimentos de mais luz para a vida eterna.

E, nesse sentido, meu amigo, socorrer a mulher, conferindo-lhe os poderes dignos de uma destinação, na qualidade de doadora da vida, é esforço sagrado que as forças divinas abençoarão em sua estrada de missionário consagrado ao supremo Bem.

O pensamento religioso é o curso da introdução à espiritualidade sublime. Em suas classes numerosas, é possível organizar proveitosas portas reveladoras da vida, a filosofia coordenar-nos-á os esforços, sincronizando-os quando é necessário, mas a religião traçar-nos-á os caminhos verticais de acesso aos suprimentos divinos. Lutemos, sim, contra as genuflexões, trabalho digno pelo planeta redimido, mas conduzamos o coração feminino aos mananciais dos recursos celestes, para que nossa compreensão facilite a humanidade.

O mundo sempre esteve repleto de guerreiros dominados pela sede de hegemonia e destruição dos mais fracos; entretanto, semelhantes caracteres, futuros geradores de violência, não surgiriam sem mães belicosas afastadas provisoriamente do ministério que lhes assinala os passos na Terra. Os frutos correspondem à natureza das árvores. As águas trazem resquícios indiscutíveis das fontes em que nasceram. Esclarecer a alma feminil, erguendo-a ao altar do entendimento superior que lhe compete, é renovar a seiva da vida humana. Ajudemos, em vista disso, a mulher, para que a semeadoura de flores do amor não se transforme periodicamente em colheita de lágrimas. As jardineiras da experiência humana agradecer-lhe-ão o serviço nobre, o concurso desinteressado e nobilitante.

E não suponha que as organizações do Mais Alto permaneçam distraídas de seu programa bendito de fraternidade e de luz. Unidos ao seu esforço incansável, abnegados companheiros da Esfera superior lhe acompanham a ação e regozijam-se com a coragem e com a fé viva impressas em seu mandato espiritual.

Prossigamos cooperando na doutrina que console e levante, que conforte e movimente a vida, que abrace o sofredor e lhe indique serviço a fazer, que aponte o Céu, mostrando, em seguida, as necessidades da Terra para solucioná-las com amor e dedicação. Não fomos chamados pelo Supremo Poder para a crença inoperante e exclusivista. À frente de nossos olhos, todos os quadros humanos, ainda mesmo os mais deploráveis, constituem apelos ao serviço santificador. Em todos os caminhos há levitas interessados em convenções e companheiros que choram relegados à dificuldade ou ao abandono como o desventurado da parábola. (Lc 10:29) Os bons samaritanos, porém, são ainda raros e não haverá trabalho verdadeiramente salvacionista sem eles.

Que a sabedoria divina nos conceda a graça de incorporarmo-nos à fileira reduzida, e que nossas mãos não descansem no labor sublime do Bem. E que a sua palavra e a sua ação, o seu ideal e a sua fé permaneçam constantemente, como vem acontecendo a serviço da Terra melhor, é o desejo do amigo e servo humilde.