Há cerca de dois anos, alguns repórteres de renomada revista brasileira, hoje ausente de circulação, vieram a Uberaba exclusivamente para ouvir os médiuns Chico Xavier e Waldo Vieira. Ambos, mediante a apresentação de perguntas por escrito, forneceram as respectivas respostas. Alguns meses depois, uma reportagem saía sobre o médium de “Parnaso de Além Túmulo”, porém, inteiramente alterada, veiculando notícias e abordando fatos aos quais os médiuns absolutamente não se referiram.
Na ocasião, o diretor da Exposição Espírita Permanente solicitou cópias das aludidas entrevistas e, graças a isso, os leitores poderão tomar conhecimento do conteúdo das mesmas.
Eis, na íntegra, essa documentação que se reveste de profundo interesse para nós, os espíritas do Brasil:
— Qual a situação do Espiritismo no momento, no Brasil e no mundo?
— O Espiritismo no Brasil é o Cristianismo Redivivo. Religião é ação de Nosso Senhor Jesus Cristo, através das explicações de Allan Kardec, junto do povo e com o povo, ensinando-nos com os princípios da evolução e da reencarnação, da fraternidade e da justiça, que todos somos responsáveis pelos próprios atos e que as leis divinas funcionam na Terra ou em outros mundos, nos mecanismos da consciência de cada um. Os benfeitores desencarnados esperam que essa noção fundamental do Espiritismo no Brasil alcance as múltiplas escolas do Espiritismo, existentes em outros países.
— Relacione nomes dos médiuns que considera como os que mais trabalham.
— Admiramos profundamente todos os companheiros da mediunidade que respeitam as funções em que foram situados pelas exigências da construção espírita-cristã.
— Qual a sua missão pessoal?
— Sinto-me na maravilhosa máquina do serviço espírita, à feição de insignificante peça de emergência, precisando repelões e consertos constantes pelas imperfeições que traz.
— Qual a sua obrigação para com a sociedade?
— O dever comum de servir na medida de nossas possibilidades.
— E para com o Espiritismo?
— Corrigir meus defeitos e fazer aos outros o que desejo para mim mesmo.
— Acredita na regeneração?
— Sim.
— E no arrependimento?
— Também.
— A velhice o preocupa?
— Não.
— Seu ritmo de trabalho diminuiu ou aumentou em relação aos anos anteriores?
— Nem mais, nem menos.
— Considera-se cansado?
— Não.
— O tempo o modificou?
— Cremos que, em matéria de compreensão e experiência, todos nos assemelhamos aos frutos que o tempo vai amadurecendo a pouco e pouco.
— Acha-se mais lúcido?
— Quanto mais os bons espíritos escrevem por meu intermédio, fazendo luz, mais reconheço a extensão de minha ignorância pessoal.
— Está mais triste ou desiludido?
— Depois de meio século em minha atual reencarnação, sinto-me mais alegre e otimista.
— Ama a vida?
— Como não? A vida é a Presença Divina em toda a parte.
— Como encara a morte?
— Mudança completa de casa, sem mudança essencial da pessoa.
— Seus últimos trabalhos de psicografia sào mais importantes do que os anteriores?
— Os livros produzidos mediunicamente por meu intermédio pertencem aos autores desencarnados e o julgamento em torno deles, a meu ver, é função do público e não minha.
— Defina, por favor, o que é um médium, o que é psicografia, e como explica a existência de Deus.
— Acreditamos que para melhores esclarecimentos sobre médiuns e mediunidade, as obras de Allan Kardec devem ser consultadas e estudadas. Com todo o nosso respeito aos entrevistadores, devemos dizer que solicitar de nós uma explicação sobre Deus é o mesmo que pedir a um verme para que se pronuncie quanto à glória e à natureza do sol, embora o verme, se pudesse falar, diria com toda certeza da veneração e do amor que consagra ao sol que lhe garante a vida.
— A cultura é essencial para uma pessoa ser médium?
— A mediunidade pode manifestar-se através da pessoa absolutamente inculta, mas os bons espíritos são de parecer que todos os médiuns são chamados a estudar, a fim de servirem com mais segurança.
— Pretende atingir novos objetivos? Quais seriam eles?
— Grande misericórdia me fará a Providência Divina permitindo-me a possibilidade de continuar trabalhando e aprendendo.
— Por que mudou-se de Pedro Leopoldo?
— Motivo de saúde.
— Por que escolheu Uberaba para residir?
— Os benfeitores espirituais me auxiliaram a escolher o clima e o ambiente de Uberaba, como sendo, até agora, os mais adequados à minha saúde física e trabalho espiritual.
— Acha que o povo de Uberaba o recebe bem?
— Tenho recebido da generosidade uberabense demonstrações de estima e apreço que nunca mereci.
— Pretende mudar-se outra vez?
— Subordino o futuro aos desígnios da Vida Superior.
— Quanto ganha atualmente? Tem um emprego? Onde? Teve promoções neste emprego? O que acha de seus colegas de trabalho? Quais são suas funções exatas neste trabalho?
— Aposentei-me no Serviço Público Federal, na condição de escriturário, nível 8, em janeiro de 1961, por incapacidade física, depois de haver completado a quota de trinta anos de serviço.
— Tem carro?
— Não.
— Quantos empregados?
— Nunca os tive.
— Como está seu estado de saúde?
— Sempre relativamente bem, de acordo com a bênção de Deus, exceção natural dos olhos, que os tenho enfermos há muito tempo.
— Sente-se forte?
— Às vezes.
— Com o mesmo entusiasmo de sempre?
— Sim.
— Com quem faz tratamento dos olhos?
— Médicos distintos e humanitários, tanto quanto benfeitores espirituais incansáveis, há mais de vinte anos, auxiliam-me a conservar o resto da visão física que possuo.
— Já esteve em hospitais?
— Não para tratamento dos olhos.
— Fez operações dos olhos?
— Não.
— Sente dores?
— Comumente.
— Enxerga com dificuldade?
— Sim.
— Espera curar-se?
— Do ponto-de-vista orgânico, recebo minha antiga enfermidade do corpo como sendo débito de outras encarnações, que devo pagar com paciência.
— O tratamento é rigoroso?
— Rigoroso e constante.
— Quais os remédios que toma?
— Diversos para o sustento dos olhos.
— A cegueira seria uma tragédia?
— Seria uma provação, sem ser uma tragédia.
— Diga um exemplo de algo que o faça sofrer.
— Ofender ou prejudicar alguém.
— Chora habitualmente?
— Não sei de alguém na Terra que não tenha chorado alguma vez.
— Prefere a solidão?
— A solidão é boa somente para refletir, porque, sem dúvida, fomos criados para viver uns com os outros.
- Gosta de animais?
— Sim.
- Como cidadão, o que acha da atual situação social do Brasil?
— Creio profundamente na segurança e na felicidade do nosso país.
- Diga o nome dos políticos em quem confia.
— Estou convencido de que todos os políticos, sejam eles quais forem, merecem o nosso respeito e a nossa cooperação para serem, para nós, aquilo que nós esperamos deles.
- Dos candidatos à Presidência da República que se apresentaram qual o que prefere?
— Roguemos a Jesus nos conceda governantes sempre progressistas e leais ao bem de todos.
- É preciso acabar com a pobreza?
— Sim, pela riqueza do trabalho honesto que devemos cultivar indistintamente.
- As reformas devem ser urgentes?
— Em matéria de reformas, os benfeitores espirituais me ensinam que não devo esquecer primeiramente as que se referem à melhoria de mim mesmo.
- A revolução pode ser evitada?
— A revolução em que acredito é aquela ensinada por Nosso Senhor Jesus Cristo, que começa pela corrigenda de cada um, na base do “façamos aos outros aquilo que desejamos que os outros nos façam”. (Lc
- Condena o racismo?
— Todos somos irmãos perante Deus, guardadas as posições que o merecimento real em serviço e cultura conferem a cada um.
- O socialismo traz benefícios?
— Creio nos benefícios da fraternidade sentida, admitida e praticada que Jesus nos ensinou e exemplificou.
- É a favor da promoção da classe operária?
— Todos somos operários da vida e creio que a bondade de Deus faz diariamente a promoção do trabalho para quem o procura, coroando de bênção o esforço honesto de toda pessoa, sem distinção de credos ou de atribuições, que busque realmente servir.
- Qual a contribuição do marxismo para a civilização?
— Faltam-me quaisquer estudos sobre o marxismo.
- Onde passa as férias?
— Dizem que os aposentados estão em férias permanentes, mas prossigo trabalhando nas tarefas espíritas com o entusiasmo de sempre.
- Gosta de fazendas?
— Sim.
- E de praias?
— Sim.
- Viaja de quê?
— Preferentemente de ônibus.
- Sozinho?
— Sim, quando não tenho a felicidade de viajar com os amigos.
- Quando tem férias?
— De raro em raro, consigo uns dias de relativo repouso físico para refazimento.
- Durante quanto tempo?
— Nunca mais de uns vinte dias por ano.
- Pratica algum esporte?
— Sim, exercício a pé.
- Como recebe os ataques que lhe são feitos?
— Como avisos preciosos contra as imperfeições que carrego.
- Acredita que tenha inimigos?
— Acredito que tenho amigos que ficaram diferentes quando reconheceram que não sou a pessoa ideal que eles julgavam que eu fosse.
- Gosta de literatura?
— Sim.
- Quais seus escritores preferidos?
— Admiro todos os escritores bastante corajosos para esquecerem as conveniências pessoais, procurando escrever em auxílio real dos seus leitores.
- Gosta de pintura?
— Sim.
- Quais seus pintores preferidos?
— Minha deficiência ocular nunca me permitiu qualquer estudo especial acerca de pintura, embora tenha o prazer de respeitar os bons quadros e admirá-los.
- Gosta de cinema?
— Sim.
- Qual o gênero de filmes?
— Filmes que nos façam sentir melhores.
- Acha que o cinema tem o direito de alterar a realidade?
— Sim, quando se trata da educação do sentimento popular, pois não acredito que Deus nos conduza a conhecer a realidade para rebaixar-nos.
- Cite artistas de que goste.
— Respeito todos os artistas que auxiliam o povo a pensar e a agir para o bem comum.
- O cinema orienta a juventude ou é prejudicial a ela?
— O cinema é instrumento da educação, dependendo das diretrizes daqueles que o manejam.
- Ouve música?
— Tanto quanto possível.
- Quais os compositores que prefere?
— Dos antigos, admiro profundamente Beethoven e Mendelssohn, sem esquecer o amor que consagramos aos compositores nossos, como sejam 5illa-Lobos e, na música popular, o nosso inesquecível Noel Rosa.
- E jornais?
— Procuro os jornais que me ajudem a equilibrar o espírito e melhorar o sentimento.
- Lê as colunas políticas?
— Somente para efeito de informação.
- Descreva, por favor, como passa o dia.
— Meu dia é demasiadamente vulgar para ser descrito.
- A que horas levanta?
— Sete.
- O que faz de manhã?
— Trabalho com os amigos espirituais, seja psicografando ou revendo com eles as páginas de autoria deles mesmos, sempre com a assistência de Emmanuel, o instrutor espiritual que me orienta as faculdades mediúnicas, desde 1931.
- A que horas almoça?
— Meio-dia.
- O que come habitualmente?
— Refeição comum do interior brasileiro.
- Quais os seus pratos preferidos?
— Não tenho predileções.
- O que bebe?
— Água.
- Dorme depois do almoço?
— Não.
- Gosta de doces?
— Sim.
- E de café?
— Sim.
- Fuma?
— Não.
- O que faz à tarde?
— Nas horas da tarde, além do tratamento ocular, atualmente ocupo-me de correspondência usual, de datilografia das páginas escritas pelos benfeitores espirituais por meu intermédio, sob a orientação deles, à exceção dos domingos que dedico ao trabalho de correspondência mais íntima.
- Toma lanche?
— Raramente.
- A que horas é o seu jantar?
— Depois dos quarenta, deixei o hábito de jantar.
- Faz algum regime?
— Os amigos espirituais ensinam que devemos comer só para viver, entretanto, estou aprendendo a lição vagarosamente.
- Com quem faz refeições?
— Com as pessoas amigas, de cuja companhia possa dispor.
- O que faz à noite?
— Nas noites de segundas, sextas-feiras e sábados, estou em contato com o público, nas reuniões da Comunhão Espírita Cristã, em Uberaba, habitualmente das dezenove horas até a madrugada. Nas noites de quartas-feiras, coopero nas reuniões íntimas de desobsessão na mesma organização espírita a que me referi. Nas noites de terças e quintas-feiras, trabalho com Emmanuel e outros orientadores espirituais na formação de livros mediúnicos, e nas noites de domingo faço uma pausa, para estudar os assuntos gerais da semana ou descansar os olhos da atividade intensiva.
- A que horas se deita?
— Nunca me deito antes das duas da madrugada.
- Dorme tranquilo?
— Sim.
- Tem sonhos?
— Graças a Deus que todos temos neste mundo a felicidade de sonhar. Creio que Deus, em sua infinita bondade nos reservou o sonho como sendo um direito de toda criatura, no qual nenhuma outra criatura consegue interferir.
(Uberaba, 15 de fevereiro de 1964. Fonte. “O Espírita Mineiro”, número 123, janeiro/fevereiro de 1967.)