Nas Pegadas do Mestre

CAPÍTULO 111

O sangue do Cristo



"Eu sou o pão da vida, sou o pão vivo que desci do céu; se alguém comer deste pão, viverá eternamente; e o pão que eu darei pela vida do mundo é a minha carne. Em verdade, em verdade, vos digo: Se não comerdes a carne do Filho do homem e não beberdes o seu sangue, não tereis vida em vós. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue, tem a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue, permanece em mim e eu nele. Assim como eu vivo pelo Pai que me enviou, da mesma sorte aquele que de mim se alimenta viverá de mim. "


(Evangelho.)

Jesus é o pão que desceu do Céu para alimentar o espírito do homem. O pão do Céu é para o espírito o que o pão da Terra é para o corpo. Alma e corpo dependem de pão para manter a vida.

Para que, porém, o pão alimente e conserve a vida é preciso que se transforme em sangue. O milagre dessa transubstanciação opera-se à revelia da vontade humana: é obra maravilhosa da natureza.

A doutrina de Jesus é o pão do espírito. Conhecê-la, no entanto, apenas em sua letra, em sua forma, em sua estrutura, representa para o espírito precisamente aquilo que para o corpo representa a ingestão de alimento. O principal ainda está por fazer: digestão, transmutação, assimilação.

Assim como o pão, mercê do aparelho digestivo, se transforma em sangue, elemento este que é a base da vida animal, assim também é mister que a doutrina de Jesus, penetrando o nosso espírito, se transmude em verdade, em luz, elementos estes que, a seu turno, representam a base da vida psíquica, como o sangue o é da vida corpórea.

Precisamos, pois, em boa metáfora, comer a carne e beber o sangue de JesusCristo, isto é, realizar em nós o mistério da transubstanciação para que tenhamos vida nele como ele tem vida no Pai que o enviou. Esse prodígio opera-se também no recesso de nosso "eu": é obra divina, é manifestação do poder de Deus. Daí o dizer do Mestre: Ninguém vem a mim se não for trazido pelo Pai.

A doutrina de Jesus é pão que se transforma em sangue — isto falando em linguagem carnal. A doutrina de Jesus é revelação do Céu que se transforma em conhecimento adquirido, em saber, em luz — isto usando linguagem espiritual.

O sangue é vida, a verdade é vida também: aquela, do corpo, portanto temporária;

esta, do espírito, por conseguinte eterna.

O sangue é a imagem da vida: está em atividade continua. Circulando por todo o corpo, vai entretendo a vida dos ossos, dos músculos, dos nervos, dos tecidos todos. Os mesmos órgãos denominados vitais estão sob sua dependência. O sangue faz ainda mais: arrasta no seu movimento circulatório os elementos mórbidos, os resíduos desassimilados para os órgãos incumbidos de os eliminar. Nutre e purifica.

Tais maravilhas executa em nosso espírito o sangue do Cristo, a suma essência de sua inigualável moral: consolida o caráter, ilumina a mente, purifica os sentimentos escoimando-os de todas as impurezas.

Repetimos: cumpre comer a carne e beber o sangue do Imaculado Cordeiro de Deus. Esse sangue, que é a vida do Cristianismo, não está na letra: ele corre vivido e palpitante por entre a imensa falange dos seres angélicos denominada Espírito Santo.

Em tal consiste a verdadeira Igreja Cristã. Seus membros, esparsos no Céu e na Terra, nutrem-se desse sangue que através deles circula incessantemente; e assim o cristão vive do Cristo, como o Cristo vive do Pai, fonte eterna da vida.