Você nos roga notícias, Meu caro Arnaldo Gotuzzo, Sobre arte além da morte, Depois de tombar no abuso. Arte, em verdade, é missão, Que espírito e vida encerra Construção de inteligência Das mais nobres que há na Terra. Os artistas, caro amigo, Nos caminhos onde estão, São companheiros chamados À obra de elevação. Cada um deles no mundo Deve em tudo andar atento, Para guardar a limpeza Na força do pensamento. Entretanto — quantos deles!… Escondem os dons divinos, Nos antigos espinheiros, De trevas e desatinos. No esquecimento corpóreo, Muitos que a Terra não conta, Se a vaidade os domina Vão seguindo, de alma tonta. Mas na morte, eis que observam Os fracassos de alto preço E chovem as petições Dos cursos de recomeço. Ruth dançando em aplausos Enlouqueceu muita gente… Hoje, ela quer renascer Carregando um pé doente. Abusou, de baile em baile, Nosso amigo Estanislau… Renasceu de pernas duras, Lembrando pernas de pau. Nina arrasou alma e corpo, Pintando murais e telas, Agora quer vida nova Para servir em panelas. Mentia usando voz linda Nosso Nicola Maleta… Encontrei-o reencarnado Cantando na picareta. Armênio esculpia pedras, E endoidava corações Hoje remove calhaus Na Fazenda Solimões. Antonino enfeitiçava Muita moça em bandolim, Hoje ele toca cabritos No morro do Gergelim. Manequim fez muito abuso, Maricota dos Castilhos… Morreu mas pede outro berço Quer ser mãe de quinze filhos. Morreu bordando calúnias Nosso amigo Gil da Glória, Hoje, ele quer escrever, Mas quase não tem memória. Arte é recurso sublime, Que se deve respeitar, Quanto mais dela se abusa Mais débitos a pagar. Arte limpa, caro amigo, Nos lares ou nos museus, É sempre luz apontando Para a grandeza de Deus. |