A senhora ofegante agoniza no leito. Ministrara-lhe o filho Para acalmar-lhe a dor medicação suposta… Agora compreendia… Era um crime perfeito E o coma inesperado Atingia-lhe, em cheio, por resposta: Ali estavam ambos. Noite alta. O rapaz não percebe Toda a extensão da própria falta. Na câmara trancada, ela jaz consciente; Não teria suposto o filho amigo e inteligente Que ela criara aos mimos, Entre risos e beijos, Para brilhar nos grandes cimos Do campo social, Capaz de impor-lhe assim Tão doloroso fim Na moldura do mal. Ao derradeiro olhar da vítima que sofre, O rapaz abre o cofre E retira o dinheiro ali depositado, Além da grande soma de contado, Ele, o moço infeliz, Furta os brilhantes e os rubis, Os adereços de ouro, as pedras raras E as coleções mais caras Que falavam tão alto ao coração materno… Vendo que a genitora Nele fixa o olhar piedoso e terno Ao entregar-se a morte, Ele, calmo, efetua o lúgubre transporte Do tesouro que passa a usufruir Para local Que ninguém, mas ninguém da moradia enorme Poderá descobrir. Logo depois, enquanto a casa dorme, Ante a mãe morta, agora enrijecida, Ele prepara a cena pela qual Ela será interpretada Na condição de pobre dementada E doente suicida. Por detalhe final Coloca junto dela Uma taça de estranho corrosivo, Um veneno letal Tisnando o guaraná inofensivo. Em seguida, abre a porta, Conclama servidores, Grita clamando a dor que o desconforta, Diz que a mãe se fizera Lamentável suicida, Por sofrer grande tédio em toda a vida… Roga estejam presentes Autoridades competentes, E, após o barulhento funeral, Ei-lo rico, afinal, Na sede de fazer no mundo o que quiser, Sem recordar sequer, Que acima das criaturas e das cousas Outra vida palpita além das lousas. Mas, no Além, oh! segredo soberano, Aquela mãe liberta, Sente falta do filho desumano, Reconhece que o ama e nota que o perdoa, Imensamente terna e imensamente boa… Mostrando o coração por brilhante luzeiro Ante as Mansões da Paz, encontra um mensageiro Que lhe oferece os Céus por recompensa… Ela pode habitar numa estrela suspensa, Em sublimes tarefas de eleição, Nas quais encontre paz, felicidade, Alegria e mais luz ao coração… Ela, porém, humilde, Disse não esperar Poder subir, sozinha, aos sóis do Eterno Lar; E porque o mensageiro lhe indagasse Sobre o que mais desejaria, A explicar-lhe Que o mérito alcançado Não lhe impunha incerteza ou qualquer empecilho. A pobre replicou, timidamente: — Creio eu que o Senhor Coloca o nosso céu onde está nosso amor!… Anjo bom, se Jesus terno e clemente, Pode ainda me ouvir, por imensa piedade, Quero dizer que não desejo Outra felicidade, Outro céu e outro brilho, Nem qualquer redenção, Além da permissão De voltar para a Terra e proteger meu filho!… |