Na entrada do asilo, Um homem robusto, jovem e tranquilo, Apresentava o pai, um velho que contava Oitenta e dois janeiros de existência, À funcionária atenta que o ouvia… Após sentá-lo num pequeno banco, Falou à moça em tom seguro e franco: — “O velho já não sabe o que pensa ou o que diz, A gritar e a gemer de exigência à exigência, Formou de minha casa Um recanto infeliz, Cujo clima de luta é fogo que me arrasa. Não quero ver meu filho Crescendo com o avô inconveniente, Quero-lhe a internação De modo permanente. Quanto custa a pensão?” A moça respondeu indiferente: — “A pensão é de quatro mil cruzeiros A serem pagos mensalmente”. O senhor fez o cheque Fazendo o pagamento da quantia E depois de informar que voltaria, Foi-se ao pai fatigado, explicando ao velhinho: — “Meu pai, aqui é a nossa casa de descanso Terás aqui mais sossego e carinho, Ao voltarmos da Europa Virei buscar-te, imediatamente” O pranto deslizou sobre a face enrugada E o velho respondeu em voz tremente: — “O que será, meu Deus? Que medonho empecilho!… Estar aqui a sós, sem te encontrar, meu filho!… E como aguentarei a falta de meu neto? Não queria afastar-me de meu teto!… Peço por Deus!… Não te demores E vem logo buscar-me…” O filho replicou, quase asperamente: — “Sem dúvida, meu pai, que podes esperar-me, Mas não faças alarme… Nada fará de mim um filho diferente, Creio que ao fim do mês que vem, Regressarei como convém…” Mas o moço partiu e nunca mais voltou, E ante a expressão do velho, triste e amarga, Notava-se que o filho ali se despedira Como quem se desliga de uma carga, Agindo alegremente. O velhinho viveu por lá, três anos, De saudade, de dor e desenganos A esperar pelo filho desertor; A fadiga alterara-lhe a memória Não sabia contar a própria história, Declarava-se um rico possuidor De terras e fazendas produtivas, Mas entregara tudo ao filho sem amor Numa procuração, Sem julgá-lo capaz de alguma ingratidão, E embora o filho lhe pagasse o asilo, Sem questionar o preço, Não lhe enviava notas de endereço… Após trinta e seis meses de clausura, O velhinho ralado de amargura, Morreu clamando a falta da família… O cadáver desceu à vala da indigência, Por fim se lhe acabara a penosa existência. Mas o tempo não para em parte alguma… Quarenta anos passados, De coração batido e passos retardados, O homem que internara o esquecido velhinho, Nota que a morte chega a cercar-lhe o caminho, Poderoso senhor, não consegue expressar-se Sob qualquer disfarce, Tomba, inerme, no leito, E ante o infortúnio da separação, Grita por Deus, quer vida e proteção, Mas a morte o reclama… O corpo se lhe esfria… Vê-se desencarnado, em noite atroz, Terrível e sombria… Chora quase sem voz, Quando sente que alguém lhe toma o cérebro cansado, E lhe diz brandamente: — “Filho do coração, não te aflijas, nem temas, Acabaram-se agora os teus problemas; Confia em Deus, não percas a esperança, Acalma-te e descansa…” E beijando-lhe os cabelos, Dedos mostrando carinhosos zelos, Exclamou com ternura: — “Agora, sim, achei minha ventura, Eu sou teu pai!… Meu filho, estou aqui… Amo-te agora, mais do que te amava, E só Deus sabe a dor com que eu chorava Com saudades de ti!…” |