Carmen Galves Latorre, nascida em São Paulo no dia 15 de agosto de 1928, era alegre e comunicativa e desde 1957 trabalhava pelo Espiritismo. Após seu desencarne, a 2 de junho de 1979, Carminha enviou, no dia 30 de maio de 1980, uma longa mensagem psicográfica dirigida a seu marido Savério Latorre, fundador e presidente do Grupo Espírita Batuíra, e a seus parentes e companheiros.
“Gostaria de externar toda minha gratidão e reconhecimento ao querido irmão Francisco Cândido Xavier, de quem recebi, através de sua mediunidade, a carta enviada pela minha querida esposa e companheira, Carminha.”
Savério Latorre
Savério, Deus nos abençoe. Este é um grande momento.
Depois de haver conversado através do nosso Spartaco, venho à escrita, tentando agradecer pelas mãos de nosso estimado Chico.
Tudo é tão diferente e tão imprevisto, que não tenho facilidade para começar esta carta. Ainda assim, estou sendo auxiliada e não devo desistir.
Agradeço ao Spartaco e à Zita, ao Douglas e Rosalina, ao Gino e Ana, incluindo a todos de nosso querido Grupo Espírita Batuíra pelo auxílio que me estendem para que me sinta eu mesma.
Quando me aproximei de vocês, não consegui alterar a sensação de alegria que me reservavam com a possibilidade de falar pelo nosso amigo Spartaco.
Hoje, porém, desejo concentrar-me interiormente de modo a fixar com mais firmeza a gratidão que sinto por todo o bem que me fizeram.
Os últimos dias, Savério, foram de grandes dificuldades. Perdoe-me se fui perdendo a resistência. As dores foram crescendo e a calma diminuiu… Por fim, já orava pedindo aos Amigos Espirituais que me trouxessem o descanso. No íntimo, você estava em meu pensamento, na figura da âncora que ainda me prendia à Terra ou à nossa casa.
Numa enfermidade grave, hoje penso que vamos eliminando todos os motivos para o apego ao mundo e apesar dos vínculos que me guardavam o coração na família, você representou, por fim, a razão para que eu lutasse por permanecer.
Desculpe a companheira pelas impaciências e gemidos… Felizmente, quando me coloquei na aceitação total dos desígnios de Deus, adormeci à feição da criança que se refugia no regaço da mãe… E não me enganara. Despertei sob a ternura da mamãe que me conservara entre os braços e me pedia coragem e paciência… A princípio, não compreendi bem se sonhava ou se me achava em alguma ilusão que não conseguia repelir. Minha fraqueza era muito grande. Deixei-me ficar onde estava, sem opor resistência. Bastava-me naquela hora pensar que voltava à infância sob o carinho de minha mãe.
Não dava a situação para que eu fizesse muitas reflexões, no entanto, em certo momento, no recanto em que me achava, escutei a voz forte do Spartaco na prece em que pedia às irmãs Dolores e Daniela me recebessem… Compreendi que a transformação se realizara. A sensação de alívio que eu experimentava me dizia que me achava em outro corpo, mas não dispunha de energia para demonstrar qualquer espanto.
Minha mãe me aconselhou repouso e dormi novamente para acordar em um lar de bênçãos, no qual reencontrei não apenas minha mãe com mais segurança de raciocínio, mas principalmente a querida Maria Mádia,° a sua irmã que sua mãe, nossa irmã Ana, me apresentou, não como filha, mas na condição de mãe dos nossos filhos que ela deixara no mundo. Encontrei a presença de nossa Daniela que a prece do Spartaco mencionara, revi a presença do irmão Ulisses e de outras criaturas amigas que não se pode esquecer.
Tudo estava de novo em paz. Entretanto, veio a saudade trazendo você no centro de tudo, a nossa Ana Mádia e os netos. As palavras do Juninho, do Eduardo e do Fábio voltavam aos meus ouvidos.
O Chico e a Nena, o Pedro e a Anastácia, a Quina e o Luiz, os sobrinhos todos, o Pedro Luiz e o Luiz Alberto, o José Francisco e a Rose, a nossa Ana Mádia e todos os corações que se ligaram aos nossos…
Quem conseguiria evitar as minhas lágrimas? Lembrei-me do Hamilton e de todos os que Deus nos concedeu para companheiros de escola na Terra e minha mãe permitiu que eu chorasse quanto quisesse, porque minhas lágrimas eram de amor e de ausência, sem que nenhuma rebeldia me tirasse os sentimentos. Todos os companheiros do Batuíra, a começar de nosso Spartaco, estavam em minhas lembranças… A saudade de todos me tomava o coração…
Mas uma grande alegria estava guardada para mim. Naquela sala em que me achava, vieram ter alguns dos nossos irmãos da Brasilândia a me oferecerem boas vindas… Então compreendi que não podia parar em meus sentimentos pessoais e sim refazer-me para trabalhar e ser útil. Depois de alguns dias, pude regressar ao nosso Grupo e rever amizades, agora na condição dos amigos que, em outros tempos, eu desejava tanto rever, sem que os olhos físicos me ajudassem.
Agradeço a todos os irmãos que oraram em meu favor e a todos da família, sem me esquecer de nossas irmãs Vitória, Maria, Ana, Lucrécia e todos que eram para nós os portadores da paz e da felicidade.
Não quero esquecer a Ana Maris, de nossa Quina e nosso Luiz, conquanto a lista esteja crescendo. Desejo, porém, esclarecer que não estou desmemoriada e que preciso ser reconhecida.
Savério, diga à nossa filha que a paciência de mãe, é uma luz em casa e, por isso, rogo a Deus para que ela esteja sempre compreensiva e calma. Em todos os lares do mundo existem problemas e unicamente através dos problemas é que conseguiremos aprender o que se deve fazer e como fazer. Jesus abençoará a nossa Ana Mádia e o Hamilton com os nossos netos queridos, para que a paz e a alegria estejam sempre conosco.
Sei que você não conseguiu se habituar com o apartamento dentro da nova situação, permanecendo com a nossa filha, mas se posso pedir a você alguma coisa, rogo a você conservá-lo. Compreendo que as esposas na 5ida Espiritual, quando se entregam à fé em Jesus, se transformam em mães dos esposos que ficam. Desse modo, peço em minhas orações para que você encontre uma readaptação que nos permita utilizar o nosso ambiente com o carinho de sempre.
Envio a todos os irmãos e a todos os companheiros do nosso Batuíra, muitas lembranças. Para fazer algum sorriso em Ana, Rosalina e Neide quero dizer a elas que o chocolate em Brasilândia, nos dias muito frios, era mesmo o recurso para garantir o trabalho. Ninguém julgue, porém, que houvesse, de minha parte, esquecido os meus regimes. De chocolate só me servia mesmo era o aroma, porque os pratos frios eram rigorosamente meus e eu sabia disso. Tudo está bem e se voltei naquele princípio de junho, é que o meu tempo era realmente chegado.
Continuar a conversa seria o melhor para mim, mas preciso terminar. Repito, sem escrever todos os nomes queridos de nossa família e do nosso Grupo, o meu abraço de muita saudade e reconhecimento.
Ainda um trecho que não posso esquecer. Parabéns à Rose e ao Manoel pelo casamento que assisti, pedindo a Jesus os abençoe sempre.
E para você meu caro Savério, esposo e amigo, o coração reconhecido de sua
Carmen Galves Latorre
30 de maio de 1980.
1 — Spartaco e Zita Ghilardi; Douglas e Rosalina M. Belini; Gino e Ana Segundo — companheiros do Grupo Espírita Batuíra.
2 — Dolores Sanches Galves — falecida em 19 de setembro de 1942.
3 — Daniela Blasques Moreno — falecida em 1978.
4 — Maria Mádia Latorre — cunhada falecida em janeiro de 1926.
5 — Ana Manquize Latorre — mãe de Savério, desencarnada em 2 de agosto de 1962.
6 — Ulisses José Martins — diretor do Grupo Espírita Batuíra, desencarnado em 1978.
7 — Ana Mádia Latorre Barreiros — sua filha.
8 — Júnior, Eduardo e Fábio Barreiros — seus netos.
9 — Francisco e Encarnação Galves — irmão e cunhada.
10 — Pedro e Anastácia Galves — irmão e cunhada.
11 — Joaquina e Luiz Latorre — irmã e cunhado.
12 — Pedro Luiz e Luiz Alberto Galves — sobrinhos, filhos do irmão Pedro Galves.
13 — José Francisco Galves e Roseli Galves Marques de Oliveira — sobrinhos, filhos do irmão Francisco Galves.
14 — Hamilton Barreiros — genro.
15 — Brasilândia — local de trabalho em assistência social.
16 — Vitória De Lucia Latorre, Maria Juliane Latorre, Ana Danieli Latorre, Lucrécia Taranha Latorre — cunhadas.
17 — Ana Maris Latorre — sobrinha, filha da irmã Quina.
18 — Neide Gandolfo Oliva — companheira do Grupo Espírita Batuíra.
19 — Manoel Antônio Marques de Oliveira — casado com sua sobrinha Roseli.
Beatriz L. P. Galves