Dádivas de Amor

Capítulo VI

A subida



Disse-nos o Senhor:

— “Quem quiser encontrar-me

Tome a sua cruz e siga-me onde eu for…” (Mt 16:24)


E um homem que o seguiu, sem queixa e sem alarme,

Observou que o lenho o constrangia…

Caminhou, mas não mais na antiga estrada.

A cruz era pesada

Na marcha, dia a dia…


Perdeu de vista a risonha paisagem,

Na qual usufruíra o amor de sua gente…

Precisava escalar rude montanha na viagem

E se reconhecia, a sós, agarrando-se à frente.


Embora a cruz lhe desse chagas e cicatrizes,

Conseguia falar, fraternalmente,

Reconfortando os tristes e infelizes..

Levantava os caídos,

Doava nova força aos fracos e aos doentes.

Consolava os leprosos esquecidos,

Regenerava os delinquentes…

Em muitos trechos da subida,

Tratavam-no por louco e davam-lhe pedradas…

Deprimiam-lhe a vida…

Quanto insulto e suplício nas estradas!…


No entanto, ele subia…

Trazia o Cristo em luz na própria mente.

Não tinha acessos de melancolia

E sim uma alegria diferente…

Mas chorava, por vezes, de cansaço,

A sentir, sob os pés, o vigor dos espinhos.

Refazia-se, vendo o Azul do Imenso Espaço

E ouvindo a voz do Céu na voz dos passarinhos…

Alcançando, porém, o cimo da montanha

Notava-se-lhe os pés rasgados e sangrentos,

E o corpo lacerado

De atrozes sofrimentos…


Mesmo assim, agradeceu ao Cristo Amado

A viagem temível…

Para atingir o topo de alto nível…


Chegando ali, porém, vê, com assombro e atenção

Que a Terra já não tem com ele ou sobre ele

O poder de atração…

Sentia-se envolvido em súbita leveza,

Respirando, feliz, a paz da natureza…

Reconhece que o tronco vertical do grande lenho,

Transformara-se em delicado engenho

E que os braços da cruz

Eram asas de luz…


Tentou andar mas, sem querer,

Na alegria sublime que o invade,

O homem que seguira os passos do Senhor,

Planou além, no Além, buscando a Imensidade

Inflamado de amor.