Diálogo dos Vivos

Capítulo VII

Encontro na prece




A mensagem Vida e Coragem nasceu de uma reunião de amigos a que compareci. Comentávamos os problemas e tribulações com que somos todos desafiados para seguir adiante, na execução de nossos compromissos ante as realizações espirituais.

Tantos companheiros se afastam das atividades a que se consagravam, nos domínios da fé, muito embora continuem convencidos quanto às verdades do espírito! E quantos como que se distanciam da própria vida, permanecendo em desânimo! Referimo-nos a isso, quando alguém lembrou o benefício da prece em conjunto, para buscarmos a inspiração da Vida Superior.

A oração foi pronunciada por um de nossos companheiros. Em seguida abrimos O Livro dos Espíritos, que nos ofereceu a questão 643 () para estudo. Trocamos ideias em torno do assunto suscitado pelas instruções kardecianas. E, ao término do ligeiro encontro espiritual na prece, o nosso amigo André Luiz escreveu, por nosso intermédio, a mensagem sobre coragem e realização que todos nós, presentes ao estudo, concordamos em enviar às suas mãos, na esperança de vê-la em nossas publicações com os seus apontamentos doutrinários, para maior amplitude de esclarecimentos em nosso favor.




Ninguém consegue evoluir e elevar-se sem a coragem de aceitar-se tal qual é para fazer o melhor de si.

Decerto os que nunca erraram e nunca sofreram estarão ainda na estaca zero, em matéria de experiência.

Nenhum avanço se fez e nem se fará sem riscos.

Pessimismo é impedimento de criação voluntária.

Receio de sacrifício, em se tratando de fazer o melhor, é atraso na marcha.

Trabalhar servindo é participar, e participar é viver corajosamente.

Todos aqueles que se preservam demasiado contra obstáculos e provações acabam fugindo às tarefas que lhes compete desenvolver.

O Espírito que colabora na construção da felicidade geral não se agasta com a visita da injúria, qual o semeador que, afim de enriquecer o celeiro, não se irrita contra os detritos do solo a que se dedica.

Na contabilidade do bem de todos, mais vale imperfeição que trabalha em auxílio aos outros, no processo de aperfeiçoamento da alma, que virtude inerte com medo de perder-se.

Todos nós — os Espíritos ainda vinculados à Terra somos, coletivamente considerando, vasto rebanho de criaturas em evolução. Mas aquele que não tenha coragem de pensar, agir e renovar-se sozinho, quando o rebanho estoure ou empaque, estará por muito tempo na roda da repetição, de vez que sem coragem de sermos o que somos, operando e cooperando para cumprir o dever que a vida nos atribui, não encontraremos progresso e nem apresentaremos utilidade para ninguém.




Tudo na vida está por fazer. O que já fizemos é apenas o início da nossa tarefa. Ser e fazer são duas faces da mesma moeda. Quem é, faz. Quem não faz, não é. Podemos lembrar a doutrina de potência e ato em Aristóteles. Somos em nós mesmos a potência de quanto temos que fazer. Mas só fazendo nos atualizamos, nos convertemos na realidade viva do nosso destino, no ato de viver. Os filósofos existenciais consideram hoje que, para o homem, a vida é potência que se realiza no ato de existir. Assim, existir é viver conscientemente, lutando sem cessar na busca da transcendência.

A mensagem de André Luiz toca num ponto essencial da Filosofia Espírita — o seu aspecto existencialista. Ao contrário do que geralmente se pensa, o Existencialismo não é uma corrente superficial do pensamento moderno. E um esforço para a compreensão do Ser através da Existência, uma busca do homem através do seu fazer. No Espiritismo essa busca se amplia e se aprofunda com a doutrina das existências sucessivas. O homem se faz a si mesmo fazendo o que lhe compete em cada existência. Se ele se considerar feito ou incapaz de fazer, não transforma a vida em ato, não existe.

As plantas e os animais vivem. A vida se atualiza nos reinos vegetal e animal através do simples ato de viver. Mas no homem existe a consciência, que supera o simples viver, exigindo o fazer espiritual. O homem não pode vegetar nem viver segundo os instintos animais. A consciência contém os seus próprios instintos que em O Livro dos Espíritos são designados como instintos espirituais. Estes exigem do homem a definição do seu viver no rumo das suas aspirações. Só assim ele se torna um existente, que no Espiritismo se define como interexistente, um ser que existe entre dois mundos.

É por isso que o homem precisa aceitar-se tal qual é, tomando consciência das suas deficiências, dos seus defeitos, para fazer o melhor de si mesmo, para superar-se. As Filosofias da Existência, que caracterizam o pensamento filosófico do nosso tempo, confirmam a Filosofia Espírita e nos fornecem novos elementos para melhor compreendê-la. Se o leitor desejar aprofundar este assunto, deve ler o nosso livro “O Ser e a Serenidade”, da Coleção Filosófica Edicel. Não podemos indicar outro; simplesmente por não existir.