De todos os fenômenos da vida, os que se apresentam ao raio visual da ciência humana, mantenedores do seu entretenimento, são os da assimilação e desassimilação; todavia, os que afetam mais particularmente a percepção do homem não são os da atividade vital em si mesma, consubstanciados nas sínteses orgânicas assimiladoras, mas justamente os fenômenos da morte. É um axioma fisiológico a extinção das células que constituem o suporte de todas as manifestações e apenas fazeis geralmente uma ideia da vida por intermédio desses movimentos destruidores.
Quando no homem ou nos irracionais, um gesto se opera, a Natureza determina o desaparecimento de certa percentagem de substância da economia vital; quando a sensibilidade se exterioriza e os pensamentos se manifestam, eis que os nervos se consomem, gastando-se o cérebro em suas atividades funcionais.
A vida corporal é bem a expressão da morte, através da qual efetuais as vossas observações e os vossos estudos.
Não dispondes dentro da exiguidade dos vossos sentidos, senão de elementos constatadores da perda de energia, da luta vital, dos conflitos que se estabelecem para que os seres se mantenham no seu próprio “habitat”.
A vida, em suas causalidades profundas escapa aos vossos escalpelos e apenas o embriologista observa no silêncio da penumbra, infinitésima fração do fenômeno assimilatório das criações orgânicas.
Segundo os dados da vossa fisiologia, a célula primitiva é comum a todos os seres vertebrados e espanta ao embriólogo a lei organogênica que estabelece a ideia diretora do desenvolvimento fetal, desde a união do espermatozoário ao óvulo, especificando os elementos amorfos do protoplasma; nos domínios da vida, essa ideia diretriz conserva-se inacessível até hoje aos vossos processos de indagação e de análise, porquanto esse desenho invisível não está subordinado a nenhuma determinação físico-química, porém, unicamente ao corpo espiritual preexistente em cujo molde se realizam todas as ações plásticas da organização, e sob cuja influência se efetuam todos os fenômenos endosmóticos. O organismo fluídico caracterizado por seus elementos imutáveis, é o assimilador das forças protoplásmicas, o mantenedor da aglutinação molecular que organiza as configurações típicas de cada espécie, incorporando-se, átomo por átomo, à matéria do germe e dirigindo-a, segundo a sua natureza particular.
Algumas objeções científicas têm sido apresentadas à teoria irrefutável do corpo espiritual preexistente, destacando-se entre elas, por mais digna de exame, a hereditariedade, a qual somente deve ser ponderável sob o ponto de vista fisiológico. Todos os tipos do reino mineral, vegetal, animal, incluindo-se o hominal, organizam-se segundo as disposições dos seus precedentes ancestrais, dos quais herdam, naturalmente pela lei das afinidades a sua sanidade ou os seus defeitos de origem orgânica, unicamente.
De todos os estudos referentes ao assunto, em vossa época, salienta-se a teoria darwiniana das gêmulas, corpúsculos infinitesimais que se transmitem pela vida seminal aos elementos geradores, contendo na matéria embrionária disposição de todas as moléculas do corpo, as quais se reproduzem dentro de cada espécie. A maioria das moléstias, inclusive a dipsomania, são transmissíveis; porém, isso não implica um fatalismo biológico que engendre o infortúnio dos seres, porque inúmeros Espíritos, em traçando o mapa do seu destino, buscam, com o escolher determinado instrumento, alargar as suas possibilidades de triunfo sobre a matéria, como um fato decorrente das severas leis morais, que, como no ambiente terrestre, prevalecem no mundo espiritual, o que não nos cabe discutir neste estudo.
Não obstante a preponderância dos fatores físicos nas funções procriadoras, é totalmente inaceitável e descabido o atavismo psicológico, hipótese aventada pelos desconhecedores da profunda independência da individualidade espiritual, hipótese que reveste a matéria de poderes que nunca ela possuiu em sua condição de passividade característica.
Reconhecendo-se, pois, a veracidade da argumentação de quantos aceitam a hereditariedade fisiológica nos fenômenos da procriação, representando cada ser o organismo de que provém por filiação afastemos a hipótese da hereditariedade psicológica, porquanto, espiritualmente temos a considerar, apenas, ao lado da influência ambiente, a afinidade sentimental.
De todas as funções gerais que caracterizam os seres viventes somente os fenômenos de nutrição podem ser estudados pela perquirição científica e, mesmo assim imperfeitamente. Além das operações comuns, que se efetuam automaticamente, há uma força inerente aos corpos organizados, que mantém coesas as personalidades celulares, sustentando-se dentro das particularidades de cada órgão, presidindo aos fenômenos partenogenéticos de sua evolução, substituindo, através da segmentação, quantas delas se consomem nas secreções glandulares, no trabalho mantenedor da atividade orgânica.
Essa força é o que denominais princípio vital, essência fundamental que regula a existência das células vivas, e no qual elas se banham constantemente, encontrando assim a sua necessária nutrição, força que se encontra esparsa por todos os escaninhos do universo orgânico, combinada às substâncias minerais, azotadas e ternárias, operando os atos nutritivos de todas as moléculas. O princípio vital é o agente entre o corpo espiritual, fonte da energia e da vontade, e a matéria passiva, inerente às faculdades superiores do Espírito, que o adapta segundo as forças cósmicas que constituem as leis físicas de cada plano de existência, proporcionando essa adaptação às suas necessidades intrínsecas.
Essa força ativa e regeneradora, de cujo enfraquecimento decorre a ausência de tônus vital, precursor da destruição orgânica, é simplesmente a ação criadora e plasmadora do corpo espiritual sobre os elementos físicos.
O corpo espiritual não retém somente a prerrogativa de constituir a fonte da misteriosa força plástica da vida, a qual opera a oxidação orgânica; é também ele a sede das faculdades, dos sentimentos, da inteligência e, sobretudo, o santuário da memória, em que o ser encontra os elementos comprobatórios da sua identidade, através de todas as mutações e transformações da matéria.
Todas as células orgânicas renovam-se incessantemente; e como poderia a criatura conhecer-se entre essas continuadas transubstanciações? Para que se manifeste o pensamento — que desconhece as glândulas que o segregam, porquanto constitui a vibração do corpo espiritual dentro de sua profunda consciência — quantas células se consomem e se queimam?
O cérebro assemelha-se a complicado laboratório onde o Espírito, prodigioso alquimista, efetua inimagináveis associações atômicas e moleculares, necessárias às exteriorizações inteligentes.
É ainda, pois, ao corpo espiritual que se deve a maravilha da memória, misteriosa chapa fotográfica, onde tudo se grava, sem que os menores coloridos das imagens se confundam entre si.
Tem-se procurado explicar, pela prática dos neurologistas, toda a classe de fenômenos intelectuais, através das ações combinadas do sistema nervoso; e, de fato, a Ciência atingiu certezas irrefutáveis, como por exemplo a de que uma lesão orgânica faz cessar a manifestação que lhe corresponde e que a desunião de uma rede nervosa faz desaparecer uma faculdade.
Semelhante asserto, porém, não afasta a verdade da influência de ordem espiritual e invisível, porque se faz mister compreender, não a alma insulada do corpo, mas ligada a esse corpo, o qual representa a sua forma objetivada, com um aglomerado de matérias imprescindíveis à sua condição de tangibilidade, animadas pela sua vontade e por seus atributos imortais.
Algumas escolas filosóficas fizeram da alma uma abstração, mas a psicologia moderna restabeleceu a verdade, unindo os elementos psíquicos aos materiais, reconhecendo no corpo a representação da alma, representação material necessária, segundo as leis físicas imperantes na Terra, as quais colocaram no sensório o limite das percepções humanas, que são exíguas em relação ao número ilimitado das vibrações da vida, que para elas se conservam inapreensíveis.
É, pois, o corpo espiritual a alma fisiológica assimilando a matéria ao seu molde, à sua estrutura, a fim de materializar-se no mundo palpável. Sem ele, a fecundação constaria de uma composição amorfa e todas as manifestações inteligentes e sábias da Natureza, que para todos nós devem significar a expressão da vontade divina, constituiriam uma série de fatos irregulares e incompreensíveis, sem objetivo determinado.
E como se tem operado a evolução do corpo espiritual?
Remontai aos caos telúrico do vosso Globo nas épocas primárias.
Cessadas as perturbações geológicas, estabelecido o repouso em algumas grandes extensões de matéria resfriada, eis que, entre as forças cósmicas associadas, aparece o primeiro rudimento de vida organizada — o protoplasma. Eis que os séculos se escoam… eis as amebas, os zoófitos, os seres monstruosos das profundidades submarinas… Recapitulemos os milênios passados e acharemos a nossa própria história; a individualidade, o nosso “ego” constitui o nosso maior triunfo. E, chegados ao raciocínio e ao sentimento da humanidade, através de vidas inumeráveis, teremos atingido o zênite da nossa evolução anímica? Não. Se nos achamos acima dos nossos semelhantes inferiores — os irracionais —, acima de nós se encontram os seres superiores da Espiritualidade, que se hierarquizam ao infinito e cuja perfeição nos compete alcançar.