Querida mamãe, peço a sua bênção, agradecendo a Deus estes minutos.
Venho pedir sua paz para que eu fique tranquilo. Sei que a sua vinda até aqui é uma viagem de saudade e de aflição.
Compreendo, mãezinha. Estamos como num rio grande e revolto. Nadando ansiosamente para chegar a um porto calmo. Digo isso porque os seus sofrimentos mudos são iguais aos meus. Sei que meu pai também chora e as lágrimas dele que não aparecem no rosto caem sobre mim de modo indescritível. E estou entre os dois, lutando igualmente. Com a senhora, porém, eu não sei explicar. A ligação é mais absorvente, mais constante. A sua memória, desde aquela tarde de adeus está procurando, procurando… procurando por mim e eu, embora espacialmente distante, obedeço e obedeço. Seu amor é um ímã que me segura os pensamentos na Terra. Entretanto, mãezinha, a senhora pode me libertar se puder chorar sem revolta. Quem não se queixa no mundo, mãezinha? Quem atravessará a vida, sem nuvens? Acalme-se e aceitemos a Vontade de Deus que é a Lei de Deus. Não pense que sofro outra espécie de angústia senão essa que me vem de sua ternura torturada e de nossa família amorosa e inesquecível.
Se me lembrarem tranquilo, estarei seguro de mim. Se me recordarem conformados, a resignação estará comigo.
Não julgue que vim para cá fora de tempo. Hoje, sei que o meu tempo terrestre era curto. O coração falhou na hora certa. Sem dúvida que seu filho não esperava a grande separação. A Bondade de Deus não nos permite no mundo saber disso.
Na terça-feira, primeiro de junho, estava aflito por saber minhas notas. Lembra-se de que cheguei em casa, na quarta, anunciando ao seu carinho que a minha nota era dez? Entrei para o banho ansioso de novo por saber como ia no Curso Técnico, na quarta-feira que passamos sem qualquer novidade… Mas, em certo momento, senti que meu coração bateu no peito como se fosse uma pedra pesada querendo sair de mim. Gritei chamando a senhora, porque tive medo, mas isso foi um momento só… Depois daquela martelada por dentro, a cabeça não soube senão pensar que um sono pesado vinha!… E que sono! Tudo, depois, aos poucos, me pareceu pesadelo… Sonhava que me achava junto de mim querendo, em vão, levantar-me. Sentia frio e desejava acordar, mas não conseguia. Mesmo no pesadelo, lembrei-me da prece. Orei, mamãe, e pedi a Deus me fizesse entender o que havia. Muito depois, penso eu, despertei sonolento em casa, com a senhora a gemer e a gritar por mim. Nossa boa Salette buscava confortá-la, os amigos pronunciavam palavras de consolo e de fé… Sinceramente, eu nada compreendia. Queria conversar, mas sentia-me fraco e atribuía tudo a um desmaio que eu tivesse sofrido no banheiro… Tudo em meu cérebro era uma névoa densa e embora acordado, parecia-me ainda ligado ao pesadelo de tantas horas de que não conseguira sair… Comecei a ter medo porque a palavra não me vinha e chorei… Ninguém me via e pensei num médico, em algum médico que me amparasse. Só então vi, ao meu lado, a vovó Sylvia a estender-me os braços aconchegantes… Nem pensei fosse ela morta, embora hoje saiba que a morte é ilusão. Falou-me com carinho e bondade. Informou-me que realmente desmaiara e que precisava agora de um socorro reparador. Abraçou-me, com bondade a que não ofereci resistência, e ajudou-me a deitar meu corpo no leito que era tão meu. Orou comigo e passando as mãos em meu rosto, inspirando-me confiança e enxugando-me as lágrimas, me fez finalmente dormir. Quando acordei, estava internado no hospital-escola, onde estou até hoje.
Pouco a pouco, entendi tudo e venho agora pedir a sua paciência e conformação.
À noite, mãezinha, não chore mais com desespero e desânimo. Deus existe e, um dia, estaremos mais juntos.
Pode contemplar meu retrato, visitar-me nas lembranças do túmulo, mas auxilie-me transformando a sua imensa dor em preces de esperança.
Ajude papai a compreender tudo isso. Ele é forte, mas sofre sem demonstrar.
Salette, ajude-me ainda mais. Você hoje é também mãe. Solange e Marcinho são flores de sua vida. Ampare nossa mãezinha para que ela possa aceitar o que peço.
Mãezinha, no bem aos outros teremos o nosso melhor encontro. A senhora que é tão abnegada e tão santa, de agora em diante, pense em mim ao seu lado auxiliando aos filhos necessitados de outras mães que lutam muito mais do que nós.
Não posso continuar. É preciso encerrar esta escrita, que muito agradeço a Deus. Vovó Sylvia está comigo e me ajuda.
Abraços com muito carinho a meu pai e ao nosso Aparício. A eles e aos outros, todos os nossos que amamos.
E pedindo para que o seu amor me abençoe, querida mãezinha, na certeza de que continuarei aqui meus estudos para ser útil à Humanidade e para corresponder à sua confiança e à sua ternura, a contar com o seu apoio e com a sua bênção carinhosa e incessante, beija o seu coração adorado o filho reconhecido que do seu coração querido nunca se afastará.
(Uberaba, 15 de janeiro de 1972)
Ricardo Tadeu Richetti nasceu em São Paulo, Capital, a 23 de julho de 1951, e aí desencarnou, a 2 de junho de 1971.
Cursava o segundo Técnico de Contabilidade no Liceu Acadêmico de São Paulo.
Seu título de eleitor nº 386454 — 79 zona — Brás — 79 secção — com data de 28 de julho de 1969, ostenta a assinatura idêntica à da mensagem.
Ricardo Tadeu, segundo a sua genitora, D. Iracy de Oliveira Richetti, e seu pai, Sr. Américo Richetti, entrou para o banheiro, às 17,55 horas de 2 de junho de 1971. A mãezinha chamou-o, alarmada, às 19 horas.
Nenhuma resposta. Em seguida, encontrado inerte, foi levado ao Pronto Socorro. Feita a autópsia. Uma dia e meio de espera. Tudo indicou, ante a observação geral, que a morte de Ricardo Tadeu foi ocasionada por “provável intoxicação por monóxido de carbono”.
Sr. Américo, D. Iracy e D. Salette (irmã única de Ricardo), juntamente com as crianças citadas na mensagem, sobrinhas do comunicante, presentes à reunião, segundo eles próprios, não ofereceram quaisquer pormenores dos motivos que os levavam à Comunhão Espírita Cristã, na noite de 14 de janeiro de 1972.
Aparício, a quem Ricardo se refere, era grande amigo dele e empregado (gerente) do pai.
Na página de Ricardo Tadeu, há um fato que precisa ser destacado, a fim de que possamos compreender a responsabilidade das criaturas que se propõem a servir no campo mediúnico.
Estávamos no Departamento Editorial da Comunhão Espírita Cristã, acabando de datilografar a extensa mensagem, e, entrevistando os familiares presentes à reunião, quando fomos chamados pelo médium Francisco Cândido Xavier.
Interrompemos as nossas atividades, e nos dirigimos à sede da Comunhão Espírita Cristã.
Chico entregou-nos uma lauda de papel, e nos disse:
— Depois que vocês saíram para datilografar a mensagem, e eu já estava autografando livros aqui, voltou o Espírito da avó de nosso Ricardo Tadeu, D. Sylvia, e me pediu entrasse na sala próxima, que ela queria transmitir ao genro, Sr. Américo, um bilhete. Acedi ao seu convite, e eis aí o bilhete. Se puder, faça-me o favor de juntá-lo à mensagem, datilografando-o também. Ela, D. Sylvia, voltou muito alegre para perto de nosso Tadeu, na Espiritualidade, tão logo transmitiu o recado.
Enquanto datilografava a mensagem e já pensando no livro que seria posteriormente organizado, participamos não somente aos pais de Ricardo, mas à sua irmã, D. Salette Maria Richetti Parisi, que colocaríamos, também, um título na mensagem de D. Sylvia César de Oliveira.
Rogamos, pois, a atenção do leitor amigo, para o bilhete a que resolvemos dar o título de
Américo, meu filho. Deus nos abençoe.
Nosso Ricardo está bem, recuperando-se em paz. Não tem a menor ideia de que houvesse qualquer escapamento de gás. Ao sentir-se no colapso que o trouxe, debateu-se, caindo inconsciente até que despertou. Mas estivemos com ele até que pudéssemos retirá-lo para o tratamento preciso.
Receba com nossa Iracy todo o amor e toda a gratidão de mãe.