Mãezinha Babi, estou aqui. É verdade.
Saí de seu carinho pelas mãos de meu pai, embalado na prece da avezinha inesquecível. Era uma sexta-feira? Penso que sim.
A princípio, assustei-me. O coração parara como ave na gaiola inexplicavelmente espancada, a fim de libertar-me.
Mas depois acordei, e a manhã era linda! A floresta sonhada surgira ante os meus olhos! Céus muito azuis cobriam a terra verde, matizada de flores.
Fontes cantavam quase naquele tom em que a sua ternura cantava para mim cantigas de ninar! Brisas passavam sussurrando segredos, como se me falassem de assuntos misteriosos entre a Terra e o Céu.
Pássaros nas ramadas pareceram-me luzes que a música do amor inflamasse de paz.
E vi crianças, mãezinha, iguais àquelas outras do mundo que o seu carinho me ensinou a buscar, para serem — por fim —, os meus irmãos com os meus outros irmãos na alegria do lar.
Ah! com que ânsia indizível rememorei seu colo para beijar de novo a sua alma querida e dizer-lhe as mil cousas que me vinham à mente; entretanto, mãezinha Babi, a voz não tem palavras para manifestar-se.
Não sei contar ainda tudo quanto quisera, mas venho até seu passo, a fim de repetir-lhe: Mamãe, fique tranquila. Seu filho vai bem.
Só saudade ele sente. A saudade sem fim de que lhe nasce a prece, para que eu tenha agora o amor e a paz da vida, da vida imperecível, em que já me encontro.
Para dizer-lhe, enfim, que o meu amor, mãezinha, meu amor por você é a minha doce luz e a minha doce bênção, para que, enfim, me eleve aos cumes de altos montes, a esperá-la feliz, sob as bênçãos de Deus.
Muito carinho e, em tudo, a gratidão de sempre do filho que prossegue a reviver feliz na eterna confiança do seu eterno amor.
(Uberaba, 31 de julho de 1972)
Para que possamos compreender o poema em prosa, de Cleon Marcius de Camargo Marsiglio, que nasceu em Pirassununga, Estado de São Paulo, no dia 10 de maio de 1953, e aí desencarnou a 30 de junho de 1972, quando cursava o segundo ano de Engenharia na cidade de Lins (SP), nada melhor que transcrevermos, na íntegra, dois poemas de Cleon Marcius, o segundo deles, um haicai, impressos e distribuídos por sua família, por ocasião de seu decesso.
O primeiro poema se intitula “Floresta Encantada”.
Como teremos oportunidade de verificar, a mensagem recebida pelo médium Francisco Cândido Xavier é a resposta às indagações contidas na peça poética deixada no mundo. E o médium desconhecia completamente não só o rapaz, como também a circunstância de que fosse poeta.
Antes de mais nada, leiamos o poema:
Eu vou pra grande floresta Em busca de paz Em busca de amor, Atrás da verdade Em busca de mim. Se lá eu me encontrar, Prometo que vou Voltar, pra contar A quem quiser Ouvir e saber. Se lá na grande floresta Eu me encontrar Prometo que vou Voltar pra contar O que aprender. Só não acho que seja certo Guardar tudo para mim, Como muita gente faz, Escondendo a beleza que tem pra dar… Se lá na grande floresta Eu encontrar o velho anãozinho da sabedoria Vou lhe perguntar: Onde está o amor? Será que esconderam Na sombra do sol? Será que o perderam No vento a soprar? E se ele me responder Aos quatro cantos vou gritar O que ele me ensinar; E então todo mundo vai Poder amar! |
Pertencente a família católica, Cleon, no seu poema terrestre, qual ocorre a todo bom poeta, deixou extravasar o que lhe aflorava do inconsciente.
Ele sabia que a desencarnação estava próxima. E que deveria partir. E que deveria voltar. Para quê?
Todos sabemos porquê. Ele mesmo conseguiu, no seu haicai, mostrar, numa síntese admirável, que a vida prossegue além do túmulo, exaltando a condição efêmera do homem que enverga a libré do corpo físico:
Quem conseguir olhar o céu
e não ver apenas o azul
terá conseguido a paz.
Nota: Devemos o poema “Floresta Encantada”, constante destas notas, às gentileza da senhora mãezinha do comunicante, D. Bárbara Marsiglio, que no-lo enviou da cidade de Pirassununga, Estado de São Paulo, onde reside, depois de haver recebido a mensagem do filho, em Uberaba, Minas.