Por mais afeito esteja o aprendiz da Revelação Nova aos enunciados da fé que o reconforta e educa para a grande transição, a morte é sempre um caminho surpreendente.
Sabemos que a reencarnação nos enforma na carne e que, antes de qualquer operação biológica no renascimento, já vivemos na pátria espiritual, quase sempre no mesmo ponto em que se verifica o nosso reingresso; entretanto, quem não experimentaria o deslumbramento do novo despertar?
O pássaro encarcerado na gaiola, em escuro porão, por muitos e muitos anos, em se vendo inesperadamente libertado, contempla os quadros da natureza livre, estuante de imenso júbilo, como se o vento e o sol, o rio e o arvoredo lhe fossem preciosas descobertas. Em verdade, sentir-se-ia enfraquecido e incapaz de sem auxílio sustentar-se na floresta enorme, viciado, como se encontra, com o alpiste e o bebedouro diariamente colocados no artificial domicílio de arame. É o nosso caso.
Por muito que nos disponhamos a encarar, face a face, as realidades da morte, atravessamos os pórticos da vida nova, de coração aos pulos e a passos vacilantes.
A paisagem dos mundos felizes e a residência dos eleitos ficam ainda muito distantes…
A visão pormenorizada de toda a existência humana, no estado de liberdade de nosso corpo espiritual, quadro que mereceu de Bozzano apontamentos valiosos e especiais, começa por reintegrar-nos na posse de nós mesmos.
Enquanto a caridade dos irmãos mais velhos nos auxilia a libertação da grade orgânica do mundo, a memória como que retira da câmara cerebral, às pressas, o conjunto das imagens que gravou em si mesma, durante a permanência na carne, a fim de incorporá-las, definitivamente, aos seus arquivos eternos.
Sem capacidade para definir o fenômeno introspectivo, devo apenas registrar a impressão de que a vida efetua um movimento de recuo, dentro de nós mesmos.
Em pensamento, voltamos da hora derradeira do envoltório somático ao berço que nos viu ressurgir na Terra e aí somos geralmente surpreendidos por extensa barragem de sombra, estabelecida pelo choque de retorno da alma às correntes da vida física, que raros espíritos desencarnados conseguem transpor de imediato. Para mim, igualmente, o obstáculo foi dificílimo.
De peito e braços hirtos, embora os afeiçoados me certificassem do desprendimento, aflito, mas imóvel, assisti ao desenrolar de minha existência última, com todo o séquito de meus atos, palavras e pensamentos, como se a minha vida fosse uma película cinematográfica projetada, ao inverso, na tela de minha consciência.
Tudo claro, eficiente e rápido. Atingido, porém, o instante exato em que reapareciam as horas da meninice, intraduzível turvação mental me absorveu o raciocínio…
Debati-me, inquieto, buscando clarear as minhas reminiscências e precisar-lhes os contornos; no entanto, incoercível vacuidade me assaltou o pensamento expectante e caí num repouso inconsciente e profundo, qual trabalhador fatigado, após longo dia de estafante labor.
Quando acordei, convenci-me de haver reconquistado o equilíbrio total. O leito alvo, em amplo e bem arejado aposento, obrigou-me a refletir na hospitalização.
Quis movimentar-me, mas não pude. Meu corpo me parecia chumbado ao lençol farto e macio.
Tentei erguer as mãos, no gesto instintivo do enfermo que, ávido, procura a campainha de chamada; contudo, meus braços desobedeceram, como se fossem de bronze.
Examinei a sala, assombrado. Enquanto as paredes se achavam revestidas de uma substância acetinada, de tom róseo, o teto arqueado exibia um painel de repousante beleza, do qual sobressaía um campo de lírios prateados e abertos, proporcionando a real sensação de vitalidade e perfume.
A contemplação do quadro, que se desdobrava no alto, pareceu reanimar-me. Leve sopro de renovação fortaleceu-me o íntimo.
Poderia falar? — pensei.
Que espécie de enfermidade me deprimia? Não sentia dores físicas, e, entretanto, extremo abatimento me anulava todas as forças.
Tentei gemer e consegui. O meu “ai” arfante cortou o ar em dolorido apelo.
Aproximou-se alguém, e, então, pude ver a meu lado graciosa mensageira de ternura fraterna. Indubitavelmente, seria uma colaboradora da enfermagem.
Intrigou-me sua veste, estranha para mim, mas depressa não mais liguei a essa particularidade, inebriado pelo carinho espontâneo e pela bondade sem afetação com que passou a confortar-me.
Acariciando-me a cabeça quase imóvel, chamou-me irmão e pronunciou palavras de estímulo que me aliviaram todo o ser. O contato daquela mão de enfermeira, tocada de boa vontade, parecia inocular-me fluidos revigorantes.
Noutra ocasião, talvez eu não tivesse notado, mas, agora, surpreendia em mim, sem dúvida em razão de meu pronunciado enfraquecimento, certa receptividade magnética que, em outras circunstâncias, me passaria despercebida.
Reconheci essa minha virtude, reparando que a jovem assistente projetava sobre mim, intencionalmente ou não, copiosa chuva de forças reconfortantes que eu, num impulso firme da vontade, procurava acumular na região da voz, tentando a fala. A intimidade com a literatura espiritualista me favorecia as operações naturais do pensamento.
Doente e enfraquecido qual me achava, não seria justo aproveitar as energias que me repassavam o campo orgânico? Sendo a vontade o elemento determinador nos fenômenos magnéticos, não poderia, de minha parte, valer-me dela na aquisição de recursos com que me fosse possível rearticular a palavra?
Desejei, então, instintivamente, transformar a garganta num aspirador vigoroso para fixar as energias flutuantes em minhas cordas vocais.
Iniciei o exercício silencioso e recebi a impressão nítida de que os fluidos emitidos pela enfermeira se condensaram no ponto indicado por minha mente e, findos alguns instantes de expectação, meus lábios se moveram e as palavras surgiram entrecortadas.
— Minha irmã — indaguei, com dificuldade —, onde estou? que aconteceu?
A interpelada, muito gentil, declarou que eu me achava abatido e aconselhou-me serenidade.
Perguntei pelos meus familiares, pelos amigos, pelo médico da casa e pelas drogas que deveria tomar, melhorando o timbre de voz à proporção que me adiantava na experiência nova.
A jovem sorriu e informou:
— Chamarei o amigo que o aguarda na ante-sala. É companheiro que lhe espera o despertar.
Retirou-se, lépida, e percebi que minha resistência decresceu. Agora, sozinho, experimentei monologar, mas não fui além de algumas frases que para outros seriam ininteligíveis. O abatimento quase completo voltou a imperar sobre mim.
Decorridos alguns minutos, regressava a jovem, fazendo-se acompanhada de alguém. Era um cavalheiro maduro, alto, de rosto pletórico, corpo bem fornido e passo firme.
Abeirou-se de mim com simpatia, e, quando aplicou a destra sobre a minha fronte, renovei o processo mental de absorção da força que ele me trazia, e o meu revigoramento não se fez esperar.
Pousei nele os olhos, agora mais seguros, e reconheci-o. Confrangeu-se-me o coração no peito. Era Lameira de Andrade.
Até ali me sentira tão naturalmente instalado naquela casa como se estivesse num hospital terrestre comum, julgando-me reintegrado no aparelho físico; mas… e a presença de Lameira que eu sabia desencarnado desde muito?!…
Refleti na possibilidade de estar sendo agraciado por dons mediúnicos e dirigi-me a ele, tentando tranquilizar-me:
— Obrigado, meu irmão, obrigado!… Não contava com uma clarividência assim, tão avançada…
Despendi na observação toda a minha força mental. O visitante ouviu-me as frases “impronunciadas”, sorriu, franco, e acentuou:
— Você já dormiu bastante e deve sabê-lo. Acha-se num hospital de emergência. Você, Romeu, está desencarnado.
A inopinada revelação me golpeou profundamente. O coração, como se fora lanhado por invisível chicote, bateu precípite no tórax. Aturdi-me. Apalpei o leito, as vestes, a mim mesmo: tudo tangível, adensado, concreto.
Intraduzível sensação de asfixia começou a entontecer-me, experimentando eu o mal-estar da criatura encarnada ao sentir o sangue afluir-lhe à cabeça.
Aflitivas perguntas vagavam em meu ser. Como teria sido aquilo? e meus interesses na Terra? meus serviços inacabados?
A sumária declaração do companheiro perturbara-me. Recordei a desenvoltura com que nos habituamos a doutrinar os irmãos desencarnados na experiência comum, e somente aí senti brotar em meu íntimo a verdadeira piedade por todos os que são arrebatados à realidade da morte, na ignorância do Além.
Lameira percebeu-me o constrangimento e informou, prestativo:
— Meu caro, com a transição pelo túmulo nada se acaba, mas tudo se modifica, se nos achamos efetivamente empenhados no verdadeiro aperfeiçoamento. Agora, as oportunidades são outras; as do mundo foram interrompidas. O que você fez está feito.
Talvez porque meus olhos se nublassem de pranto, aditou em voz firme:
— Não cultive qualquer estado mental deprimente. Onde a matéria é mais leve, a vibração espiritual é mais importante.
Lembrei-me de antigos estudos e esforcei-me. Logrei concentrar, de novo, as minhas energias e, mais confortado, perguntei por meus familiares de outro tempo, estranhando não me houvessem recebido ali, no recomeço da vida nova.
Com a mesma calma, o prestimoso companheiro explicou, delicadamente:
— Nem todos podem retornar, com o êxito desejável, à comunhão com o círculo doméstico. Há emoções violentas que nos prejudicam, sem que apercebamos isso. A planta frágil exige proteção. Adaptação e crescimento são imperativos artigos da Lei. Espere.
E contou que inúmeros irmãos desprevenidos, quando se rebelam contra o socorro assistencial de que me via rodeado, são naturalmente atraídos para velhos círculos de luta, escravizando-se a sensações que não mais se justificam, e passando a viver em longo processo de vampirismo natural.
A palestra do amigo, reportando-se a paisagens sombrias e a almas atormentadas, quando me afligiam os meus próprios cuidados, acabou por levar-me a indefinível abatimento.
Assaltou-me a dispneia dos asmáticos. Lameira compreendeu tudo, silenciou como quem ora sem palavras e começou a aplicar-me passes na região do baço. Vi-lhe as mãos, despedindo brilhantes raios róseos, arrancando, ao contato de minha epiderme, fios tênues de uma substância azul-violácea.
Pouco a pouco, reparei que forças novas me invadiam, como se eu fora emperrada máquina repentinamente lubrificada e restituída, com êxito, às suas funções normais.
Terminada a intervenção magnética e surpreendido ante o milagroso efeito, pude sentar-me, amparando-me nos braços do amigo que se acomodou ao meu lado, com o sorriso do colaborador vitorioso e feliz.
— Aqui — esclareceu, bondoso —, o passe é uma transfusão de energias, com resultados imediatos, quase milagrosos.
E porque eu indagasse sobre o tempo em que me cabia esperar a restauração plena, ponderou:
— Romeu, em nossas atividades comuns na Terra, clareamos a vida, mas somente por fora; com a lâmpada sublime dos conhecimentos espiritualistas e, da existência tiramos todos os proveitos, assim como o pomicultor avarento ou ignorante colhe os frutos da árvore sem lhe auscultar as necessidades e sem sequer uma nota de reconhecimento aos serviços que ela lhe presta, supondo-se o credor absoluto de suas vantagens preciosas. É assim, meu amigo, que desencarnamos… Tão plenos de confiança no Céu, quanto vivíamos alvoroçados com as revelações na Terra, mas vazios de espiritualidade santificante.
Fez breve pausa, como se quisesse dar algum repouso à minha atenção, e prosseguiu:
— E por mostrarmos aqui o que realmente somos, bastas vezes não passamos de mendigos ou de cegos, com o poder de pronunciar lindas palavras, mas sem irradiar ondas de simpatia ou de edificação aos outros seres. Na Esfera que deixamos para trás, usávamos o corpo denso quase sempre sem lhe analisar a grandeza; o coração, o cérebro, os pulmões, o fígado, o baço, os rins, sustentados por glândulas de recursos sutis, não vivem à mostra, no veículo que baldeamos no túmulo, como trapo velho; e, no entanto, desempenham funções básicas em nossa comunhão com os ensinamentos preciosos do Plano carnal. Valemo-nos desses órgãos quase sem nenhuma consideração para com os reais benefícios que nos prestam; e, se algum dia nos recordamos deles, é, com frequência, quando destrambelham, irritados ou enfermos, geralmente por nossa própria culpa. Em muitas ocasiões, antes dos quarenta anos de idade, no corpo físico, desequilibramos o aparelho circulatório, impondo-lhe comoções violentas da nossa cólera destrutiva, viciamos as células cerebrais com o provocar e manter pensamentos perturbadores, ulceramos o estômago, ingurgitamos o fígado ou obstruímos os rins com alimentação imprópria ou com tóxicos vários, despendendo anos e anos em reparos do carro físico, os quais nem sempre se levam a termo por nos surpreender a morte antes do integral reajustamento.
As elucidações pareciam impregnadas de virtudes calmantes para as minhas chagas mentais, porque, enquanto eu lhes dedicava a minha atenção, doce alívio me penetrava…
Lameira interrompeu-se, fitou-me longamente e, como se quisesse imprimir maior significação às palavras, modificou o tom de voz, prosseguindo, delicado:
— Imagine semelhante situação aplicada à nossa alma. Nosso corpo espiritual encerra também potentes núcleos de energia, que, entretanto, não vivem expostos à visão externa, qual acontece ao veículo de carne. São , destinados à absorção e à transmissão de poderes divinos, quando conseguimos harmonizá-los com as grandes leis da vida. Localizam-se nas regiões do cérebro, do coração, da laringe, do baço e do baixo-ventre. Não importa que a ciência do mundo os desconheça por enquanto. O conhecimento humano avança por longos e pedregosos trilhos. A circulação do sangue e a nutrição das células só agora vão recebendo alguma claridade nas observações cotidianas, e os processos da geração constituem ainda quase um enigma para os investigadores da vida renascente. Não é de estranhar, portanto, que a inteligência mediana da Terra ainda ignore o profundo e complexo mecanismo da alma.
Percebeu Lameira a imensa atenção com que lhe seguia as palavras e, provavelmente condoído de minha prostração, acentuou:
— Aliás, quero esclarecer-lhe que, com esta minha minuciosa explicação, desejo apenas salientar que raramente desencarnamos em condições satisfatórias. À proporção que nos desenvolvemos em conhecimento, cresce nossa capacidade de pensar, e quem pensa gera determinadas forças e as irradia. Para estilo mais conciso, recorramos à simbologia, sempre valiosa em qualquer lição. Imaginemos o fruto verde e o fruto maduro. O primeiro demorar-se-á em longo estádio preparatório, elaborando a polpa, ainda sem expressão de utilidade; o segundo já se oferece pronto a quantos queiram aproveitar-lhe a carne e renovar-lhe as virtudes na sementeira, ou em benefício de seres inferiores que vivem na terra. A imagem é pálida e insuficiente, mas serve para confronto rudimentar. Enquanto a mente da criatura transita nas zonas selvagens, sob os fluidos condensados da carne, ou sem eles, não possui recursos de autoprojeção, em face do círculo restrito em que vibra; mas, se nossa razão amadurece, o campo do pensamento se alarga, projetando a distância nossa influência individual. É natural que a força emitida nos alcance em primeiro lugar. Se o benfeitor é o primeiro a envolver-se nas irradiações do bem que produz, o homem incauto, que despede as negras correntes do mal, é também o primeiro a sofrer-lhes o efeito. Assim é que, muito especialmente depois da morte, temos nossa organização espiritual ligada às nossas próprias criações. Quase sempre, acordamos com os centros de força viciados pelos quadros mentais a que por muitos e muitos anos demos origem e sustento. As possibilidades de imaginar e de desejar aumentam-nos a responsabilidade. Somos, na Terra, dentro da esfera da razão, frutos amadurecidos que, sem proveito integral para os demais, em vista de nossa constante fuga ao trabalho, nos intoxicamos, dando pasto a elementos viciosos que deveríamos reconhecer incompatíveis com a nossa atual posição. Dispondo de tantos recursos de serviço, sem a devida aplicação, assemelhamo-nos também, de algum modo, ao poço de águas estagnadas, que desenvolve microorganismos prejudiciais, ao invés de semear benefícios, e somos habitualmente surpreendidos pela morte nessa inconveniente situação. Os grandes ensinamentos das religiões são fórmulas que, aplicadas nas experiências de cada dia, operam a higiene e a iluminação de nossa alma, rumo aos degraus superiores. Todavia, enquanto permanecemos no corpo, infinita é a nossa distração. Invariavelmente dispostos a ensinar o bom caminho aos outros, dele nos afastamos, sempre que a virtude nos peça algo contra os nossos desejos.
Valendo-me da pausa natural de sua palavra carinhosa e fluente, arrisquei:
— Quer dizer então que…
Lameira não me deixou terminar.
Tornando à frase convincente, esclareceu:
— Quer dizer que para cá voltamos à semelhança de máquinas desarranjadas à oficina. Vícios do pensamento, inclinações nocivas não combatidas, desequilíbrios nervosos não extintos, sentimentos de culpa imanifestos, hábitos deprimentes, impulsos não educados, excessivo apego a objetos, situações e paisagens materiais ainda arraigadas, acidentes íntimos de mágoa ou de revolta, paixões ocultas, e verdadeira mole de outros fenômenos corruptores do sentimento — nos obrigam a lamentável demora na viagem, constrangendo-nos à perda de muito tempo que poderia ser utilizado em nossa própria ascensão.
Notando-me a expressão de amargura no olhar inquiridor, prosseguiu, comovido:
— Não acredite seja você o único a experimentar as dificuldades do ressurgimento. Lutei muito, por minha vez, e ainda me encontro em reajuste, satisfazendo certos compromissos que, desprevenido, assumi. Somos extensa fileira de trabalhadores em transição. Nem na extrema vanguarda, nem de todo para trás. Muitíssimos anos exige a obra da restauração, e nem poderia ser de outro modo. Ainda assim, meu amigo, cabe-nos render graças a Deus, porque milhões de pessoas, embora já sem o veículo de carne, permanecem aferradas à matéria, com o risco de maiores desilusões para a necessária libertação.
Tais instruções calaram-me fundamente no espírito. Recordei a leitura das mensagens e dos apontamentos de André Luiz e concluí, pela experiência direta, que enfrentava, por minha vez, os duros tempos do conserto próprio.
Desdobraram-se os dias entre a aflição e a saudade, amenizadas, de alguma sorte, pelas novas amizades que me floriram a estrada de alegrias surpreendentes.
Lameira foi para mim um cicerone bondoso e um amigo vigilante. Pouco a pouco, reconheci que recebemos no Além o que realmente criamos para nós mesmos, em contacto com as criaturas.
Tudo o que é nosso em nós demora. O amor encontra, depois da morte, aqueles a quem se consagra ou aquilo a que se devotou. O ódio convive com as imagens horrendas que para si mesmo gerou e das quais se alimenta.
É assim que me restauro; e, guardando intacto o velho ideal de aprender e servir, no trabalho de engrandecimento da vida imperecível, eis-me de retorno aos companheiros de luta, oferecendo-lhes o relatório de minhas surpresas iniciais na Espiritualidade. Saibam, destarte, que o corpo de sangue e ossos é simplesmente uma sombra da nossa entidade real e que todas as nossas virtudes ou vícios a nós se atrelam além da Terra; pelo que, de cada qual depende o caminho aberto ou o desfiladeiro sombrio na sublime romagem para a Luz.