Assevera você que o médium, a serviço do livro no Espiritismo, deve ser analfabeto, para que o fenômeno da comunicação se mantenha insofismável.
Isso, porém, meu caro, não toa com os imperativos da lógica. Exigir um atestado de ignorância aos medianeiros incumbidos de veicular a palavra dos instrutores desencarnados, é o mesmo que reclamar obra-prima de imprensa a quem não possua o mais leve conhecimento do caixotim tipográfico.
É claro que criaturas admiráveis podem realizar prodígios de beneficência, sem o concurso das letras.
Sublimes tarefas da Natureza são executadas sem necessidade de informação cultural.
A semente de que se faz o pão e a maternidade em que o lar se baseia prescindem de instrução da inteligência, contudo, os serviços que lhes são consequentes, reclamam técnica e condução. Sem a agronomia que aperfeiçoa, a gleba estaria enquistada na insipiência, e sem a escola que honorifica o templo doméstico, a dignidade feminina acomodar-se-ia ao nível dos brutos.
Não podemos prescrever princípios eternos como sejam afinidade e sequência nos processos da vida.
Quem aprende a manejar o buril, por vontade própria, com um estatuário, naturalmente acabará escultor, tanto quanto quem se afeiçoa ao ladrão, admirando-lhe as aventuras, decerto, com mais segurança, se fará competente no arte do furto. Problema de inclinação e de companhia.
Se determinado médium dedica bastante amor aos misteres psicográficos, oferecendo-lhe tempo e carinho, indubitavelmente merecerá a atenção dos amigos desencarnados que se valem do lápis no auxílio aos semelhantes, qual o aluno aplicado à frente de professores conscientes e justos.
E, estabelecida a comunhão, o serviço progredirá na medida em que se desdobre a consagração do intermediário ao propósito de aprender e servir.
Isso é mais que natural. O trato de terra que suporte a presença do adubo e que se faça dócil à passagem do agente úmido é sempre aquele que mais produz, conquistando as mãos e os olhos do lavrador.
Médium que se mostre constante na disciplina a que se revele submisso aos ditames construtivos da Espiritualidade obterá, inegavelmente, o amparo dos companheiros desencarnados que buscam na caridade e na cultura o caminho da própria renovação.
Há médicos notáveis, desenleiados do carro físico, aproveitando operários humildes da fraternidade humana para o socorro aos doentes e cientistas ilustres que, ausentes do corpo carnal, não desdenham o concurso de apagados servidores da fé para a difusão do conhecimento nobre, no intuito de sublimarem, eles mesmos, o próprio coração.
E quanto mais se devotam os medianeiros à bondade e à instrução, mais se lhes eleva o grau evolutivo no campo da alma.
Indiscutivelmente, na falta de pessoas alfabetizadas, os Benfeitores da Vida Superior não menosprezam os amigos privados da escola e, através deles, transmitem recados e ensinamentos que exprimem esperança e consolo.
Aliás, em circunstâncias propícias, utilizam-se até de animais para as tarefas que lhes digam respeito.
Na Bíblia, temos o caso da jumenta de Balaão, (Nm
Ainda assim, os muares a que nos referimos não conseguiram obra mediúnica de maior vulto. Faltava-lhes, pelo menos, um curso primário de letras humanas para o avanço preciso.
Enfim, meu amigo, estude a questão em seu próprio gabinete. Lembre-se de que a carta primorosa foi naturalmente ditada por sua boca à datilógrafa que lhe grafou os conceitos.
Se ela não fosse quem é — colaboradora exímia do seu trabalho de homem consagrado ao pensamento — você com certeza não conseguiria expandir-se, no plano das relações e das ideias. Você precisa dela, tão instruída e atenciosa, para instrumento de suas realizações, como nós outros, os Espíritos desencarnados, não prescindimos de bons medianeiros para o serviço que nos compete.
Como vê, nossos irmãos ainda analfabetos poderão, muitas vezes, efetuar glorioso ministério de amor e humildade, do qual nos achamos todos distantes em nossa deficitária posição na virtude, mas, em matéria de psicografia, por enquanto, não podemos dispensar os médiuns que saibam ler e escrever.