“Acima das coisas transitórias do mundo, há uma Sabedoria Integral e uma Ordem Inviolável” — responde Emmanuel, aconselhando os vivos a que guardem o patrimônio de suas crenças
PEDRO LEOPOLDO, 9 (Especial para O GLOBO, por Clementino de Alencar) — Enviamos hoje mais três das respostas colhidas por Chico Xavier, dos seus protetores do Além, e relativas a indagações enviadas por carta ao médium.
A primeira das duas perguntas abaixo respondidas é esta:
— Poderá a Ciência substituir a Religião?
A segunda indagação refere-se ao hábito da cremação de cadáveres, adotado por muitos povos do Oriente, e diz:
— Sentem os desencarnados os efeitos da cremação de seus despojos mortais?
E a terceira é esta:
— Qual a impressão do homem no instante da morte?
Eis como Emmanuel, com aquele admirável poder de síntese que caracteriza suas mensagens, respondeu à primeira das indagações acima:
— Creio que, no futuro, viverá a humanidade fora desse ambiente de animosidade entre a ciência e a religião; julgo, contudo, que em nenhuma civilização pôde a primeira substituir a segunda. As suas antinomias serão eliminadas dentro do estudo, da análise, do raciocínio.
Nos tempos modernos, mentalidades existem que pugnam pelo desaparecimento das noções religiosas do coração dos homens. Pede-se uma educação sem Deus, o aniquilamento da fé, o afastamento das esperanças de uma outra vida, a morte da crença nos poderes de uma providência estranha aos homens. Essa tarefa é inútil. Os que se abalançam a sugerir semelhantes empresas podem ser dignos de respeito e admiração pelos seus méritos científicos, mas assemelham-se a alguém que tivesse a fortuna de obter um oásis entre imensos desertos. Confortado e satisfeito dentro da sua felicidade ocasional, não vê as caravanas sem número de infelizes, transitando sobre as areias ardentes, cheias de sede e de fome.
O sentimento religioso é a base de todas as civilizações. Preconiza-se uma educação pela inteligência, concedendo-se liberdade aos impulsos naturais do homem. A experiência fracassaria. No dia em que a evolução dispensar o concurso religioso, a Humanidade estará unida a Deus pela ciência e pela fé então irmanadas.
A ciência e suas contradições: atestado da falibilidade humana
Em cada século o progresso científico renova sua concepção acerca dos mais importantes problemas da vida.
Raramente os verdadeiros sábios são compreendidos por seus contemporâneos. Se as contradições dos estudiosos são o sinal de que a ciência progride sempre, elas atestam igualmente a falibilidade humana e a fraqueza e inconsistência dos seus conhecimentos.
Diz-se que o pensamento religioso é uma ilusão. Tal afirmativa carece de fundamento. Nenhuma teoria científica, nenhum sistema político, nenhum programa de reeducação podem roubar do mundo a ideia de Deus e da imortalidade do ser, inata no coração do homem.
As ideologias novas não conseguirão eliminá-la também.
A religião viverá entre as criaturas, instruindo e consolando, como um sublime legado.
O que se faz preciso, em vossa época, é estabelecerdes a diferença entre religião e religiões.
A religião é o sentimento divino que prende o homem ao Criador. As religiões são as organizações dos homens, falíveis, imperfeitas como eles próprios; dignas de todo o acatamento pelo sopro da inspiração superior que as fez surgir, são como gotas do orvalho celeste misturadas com os elementos da terra em que caíram. Muitas delas, porém, estão desviadas do bom caminho pelo interesse criminoso e pela ambição lamentável dos seus expositores; mas a verdade um dia brilhará para todos, sem necessitar da cooperação de nenhum homem.
Cabe-nos, pois, exclamar para os que creem e esperam:
— Ó irmãos nossos que confiais na Providência dentro da escuridão do mundo!… Do portal de claridades do Além-Túmulo, nós vos estendemos as mãos fraternas!… Nossa palavra corre sobre o mundo como um poderoso sopro de verdades! Dentro do Universo mil laços nos unem. Sobre as ruínas, sobre os escombros das civilizações mortas e dos templos desmoronados, nós viveremos eternamente. Uma justiça soberana, íntegra e misericordiosa preside aos nossos destinos. Na Terra ou no espaço, unamos os nossos esforços pelo bem coletivo.
Guardai convosco o sagrado patrimônio das crenças, porque, acima das coisas transitórias do mundo, há uma Sabedoria Integral, uma Ordem Inviolável. Lutemos, pois, com destemor e coragem, porque Deus é justo e a alma é imortal.
À segunda das perguntas acima, a relativa à cremação de cadáveres, o “guia” assim respondeu:
— Geralmente, nas primeiras horas do “post mortem”, ainda se sente o Espírito ligado aos elementos cadavéricos.
Laços fluídicos, imperceptíveis ao vosso poder visual, ainda se conservam unindo a alma recém-liberta ao corpo exausto; esses elos impedem a decomposição imediata da matéria. E, por esta razão, na maioria dos casos o Espírito pode experimentar os sofrimentos horríveis oriundos da cremação, a qual, nunca deverá ser levada a efeito antes do prazo de cinquenta horas após o desenlace. A cremação imediata ao chamado instante da morte é, portanto, nociva e desumana.
Às vezes, segundo a natureza das moléstias que precedem a desencarnação, existem ainda no cadáver inúmeros elementos de vida; daí nasce a possibilidade de, usando de recursos vários e reagentes, a ciência fazer um “morto” voltar à vida.
Vê-se, pois, que o Espírito desencarnado, nas primeiras horas do Além-Túmulo, pode sentir, dentro do quadro de suas impressões físicas, todas as ações a que seu corpo abandonado seja submetido.
A terceira pergunta, sobre a “impressão do homem no momento da morte” foi respondida nestes termos:
— A impressão da alma no momento da morte varia com os estados de consciência dos indivíduos.
Para todas as criaturas, porém, manifesta-se nesses instantes a bondade divina. Os moribundos têm invariavelmente a assistência dos seus protetores e amigos invisíveis que os auxiliam a se libertar das cadeias que os prendem à vida material. Entre os homens não existe a necessidade de alguém que auxilie os recém-nascidos a se desvencilharem do cordão umbilical?
As sensações penosas do colpo são mais ou menos acordes com a moléstia manifestada. Elas, porém, passam e nos primeiros tempos, no plano espiritual, vai a alma colher os frutos de suas boas ou más obras na superfície do mundo.
O adágio popular “Tal vida, tal morte” vai aí receber então a sua sanção plena.
Essa reportagem foi publicada primeiramente em 1935 pela LAKE e é a 4ª da 3ª Parte do livro “”