Novamente em Casa

Capítulo VI

Geraldo Arantes de Souza



Geraldo faleceu em seu sítio, localizado em Bela Vista de Goiás, por morte violenta, aos 50 anos de idade.

Casado com Olívia Rodrigues de Souza, pai de cinco filhos: Silcio, Silma, João Cícero, Geraldo e Kênia.

Sobre sua partida e a mensagem que enviou pelo Chico, assim se expressou a esposa:




DEPOIMENTO DA ESPOSA


Em minha primeira visita ao Chico Xavier, em maio de 1980, obtive apenas uma afirmação que em breve receberia uma comunicação do meu Geraldo.

Já em agosto recebi notícias de que ele estava reconstituindo as próprias forças espirituais, junto de abnegados Benfeitores da Vida Maior.

Nesta ocasião, elevei meu pensamento a Jesus e pedi com muita fé que, se fosse possível, queria ir até lá onde estava o Geraldo. Graças a Deus fui levada até o Plano Espiritual e encontrei-me com meu esposo. Dialogamos com muita felicidade e paz, sem, contudo, posteriormente, recordar as palavras que trocamos.

Em janeiro de 1981, recebi a mensagem que nos trouxe, a mim e aos nossos filhos, parentes e amigos, um enorme conforto, inclusive eliminando dos nossos corações a dor da separação brusca e inesperada e levando-nos a compreender a Vida Espiritual, retirando dos nossos corações a revolta e a ideia de vingança.





Querida Olívia, peço a Deus nos abençoe.

Estamos nós dois como quem rema contra a maré, no entanto, acima de nós reina o amor infinito de Deus. E Deus não permitirá que os nossos filhos recebam uma herança de ódio que não acumulamos nos corações.

Ainda não pude efetivamente usufruir o repouso a que aspiro, depois da erradicação de meu pobre Espírito do corpo amigo que me servia por tenda de trabalho e tenda de fé.

Em verdade, querida esposa, eu queria ter continuado a viver. Não supunha que os braços de amigos que estimamos tanto se erguessem contra mim, a ponto de furtar-me a existência.

Nos primeiros instantes, a dor do inesperado me dominou a vida íntima; você e os nossos filhinhos me povoavam os últimos pensamentos.

Chorei à maneira da criança que inutilmente roga pelo regaço materno, mas uma doce sensação de calma me envolveu de todo… E dormi, conquanto me esforçasse por sustentar-me vigilante e atento, quanto se me fizesse possível.

Ansiava reagir contra aquele torpor que me paralisara os movimentos, no entanto, creio que a perda de minhas forças acentuava o desmaio em que me vi arrasado, de um instante para outro…

Quis rezar, pensar em Deus, suplicar proteção em nosso benefício, contudo, os meus pensamentos me pareciam pássaros a fugir da gaiola de minha própria cabeça…

O sono foi profundo…

Depois, sem que me fosse permitido perceber quanto tempo gastara em semelhante inconsciência, despertei num quarto de hospital.

Minha angústia, em não enxergando a presença de vocês, foi natural… Gritei por você, por minha mãe.

Quando tudo me parecia silêncio e indiferença nas figuras vestidas de branco que me amparavam, ao modo de enfermeiras prudentes, surgiu o meu pai Joaquim e a minha avó Placidina, solicitando-me calma. O resto pode você adivinhar…

Ouvi seus pedidos de esposa e mãe, nas preces do quarto, encharcadas de lágrimas, implorando a Jesus por meu repouso, no entanto, ao mesmo tempo, escutei as vozes da ira de quantos convidavam seu coração a vingança…

Não sei o que mais me doeu nas fibras mais íntimas, se o seu sofrimento de quem se via a sós para solução de tantos problemas ou a tristeza de verificar a revolta reinante em tantos dos nossos corações mais queridos.

Agora que me expliquei quanto pude, rogo ao seu devotamento de esposa e filha, suplicar da mamãe Lázara para que se compadeça de nossos irmãos que não conseguiram compreender a extensão de nossa confiança e de nossa estima.

Amargo seria para nós todos se fosse eu quem houvesse perdido a bússola da razão, convertendo-me no adversário gratuito de pessoas dignas de nosso apreço.

Peço a meus filhos esquecerem os fatos em si. Não desejo que o Silcio cresça armazenando ideias de ressentimento ou de impulsos outros que fariam dele um coração incompatível com a formação que nós ambos procuramos plasmar para o bem com sinceridade e carinho.

Querida Olívia, rogue aos seus irmãos olvido e desculpas, mas desculpas e olvido que lhes nasçam do peito, diante dos nossos companheiros infelizes.

Não creio que me tivessem atacado em sã consciência. O delito é uma forma de delírio que precisamos compreender e perdoar, entendendo que o nosso cérebro é igualmente capaz de cair em sombras e alienar-se à frente da realidade.

Continue a pensar com grandeza de coração em nossos imaginários ofensores. Eles são dignos da bênção de Deus, tanto quanto nós.

E prossiga doando ao Silcio, à Silma, ao Geraldo, ao João Cícero e a nossa Kênia, os sentimentos de amor com os quais precisarão viver com a bênção de Jesus.

Rogo a você dizer à querida mãezinha Lázara para que me lembre em seu colo quando menino. A mamãe me colocava, então, de joelhos e me fazia repetir as palavras santas do “Pai Nosso”. (Mt 6:9) Recordo-a afirmando: “e perdoa, Senhor, às nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores”.

Agora, querida Olívia, sou eu e o papai Joaquim, os companheiros que tentamos avivar-lhe a memória a fim de perdoar e esquecer tudo aquilo que possa surgir na estrada da vida, sob o nome do mal.

A vovó Placidina e a vovó Emerenciana me fazem companhia para escrever a você esta carta que devo terminar.

Mais uma vez rogo a você recusar todas as propostas de acusação e vingança contra os nossos irmãos sofredores e desorientados. Basta viver para que uma criatura se redima aos próprios olhos com relação a quaisquer culpas.

E se passei pelo resgate, naturalmente devia… Por enquanto, não tenho memória suficiente para minudenciar o meu passado de Espírito consciente, mas graças a Deus, reconheço que estamos regidos por leis inalienáveis.

A todos os nossos, especialmente à mãezinha Lázara e aos queridos filhos, as minhas lembranças e você receba neste papel que me reflete o pranto de agradecimento a Jesus pela possibilidade de falar com você, todo o coração do seu esposo e companheiro sempre seu,


23/1/1981



Joaquim Elói de Souza, genitor de Geraldo, falecido em 1975. Placidina Maria de Jesus, bisavó de D. Olívia, desencarnada há um século.


Lázara Marques Arantes, genitora do Geraldo.


Maria Emerenciana Arantes, avó, desencarnada há meio século.