Evangelho por Emmanuel, O – Comentários ao Evangelho Segundo Mateus

Capítulo CCCXXVI

III. — Amor.



— Há uma gradação do amor, no seio das manifestações da natureza visível e invisível?

— Sem dúvida, essa gradação existiu em todos os tempos, como gradativa é a posição de todos os seres na escala infinita do progresso.

O amor é a lei própria da vida e, sob o seu domínio sagrado, todas as criaturas e todas as coisas se reúnem ao Criador, dentro do Plano grandioso da unidade universal.

Desde as manifestações mais humildes dos reinos inferiores da Natureza, observamos a exteriorização do amor em sua feição divina. Na poeira cósmica, síntese da vida, temos as atrações magnéticas profundas; nos corpos simples, vemos as chamadas “precipitações” da química; nos reinos mineral e vegetal verificamos o problema das combinações indispensáveis. Nas expressões da vida animal observamos o amor em tudo, em gradações infinitas, da violência à ternura, nas manifestações do irracional.

No caminho dos homens é ainda o amor que preside a todas as atividades da existência em família e em sociedade.

Reconhecida a sua luz divina em todos os ambientes, observaremos a união dos seres como um ponto sagrado de referência dessa lei única que dirige o Universo.

Das expressões de sexualidade, o amor caminha para o supersexualismo, marchando sempre para as sublimadas emoções da espiritualidade pura, pela renúncia e pelo trabalho santificantes, até alcançar o amor divino, atributo dos seres angélicos, que se edificaram para a união com Deus, na execução de seus sagrados desígnios no Universo.


— Será uma verdade a teoria das almas gêmeas?

— No sagrado mistério da vida, cada coração possui no Infinito a alma gêmea da sua, companheira divina para a viagem à gloriosa imortalidade.

Criadas umas para as outras, as almas gêmeas se buscam, sempre que separadas. A união perene é-lhes a aspiração suprema e indefinível. Milhares de seres, se transviados no crime ou na inconsciência, experimentam a separação das almas que os sustentam, como a provação mais ríspida e dolorosa, e, no drama das existências mais obscuras, vemos sempre a atração eterna das almas que se amam mais intimamente, evolvendo umas para as outras, num turbilhão de ansiedades angustiosas, atração que é superior a todas as expressões convencionais da vida terrestre. Quando se encontram, no acervo dos trabalhos humanos, sentem-se de posse da felicidade real para os seus corações — a da ventura de sua união, pela qual não trocariam todos os impérios do mundo, e a única amargura que lhes empana a alegria é a perspectiva de uma nova separação pela morte, perspectiva essa que a luz da Nova Revelação veio dissipar, descerrando para todos os Espíritos, amantes do bem e da verdade, os horizontes eternos da vida. [.]


— Existe nos textos sagrados algum elemento de comprovação para a teoria das almas gêmeas?

— Somos dos primeiros a reconhecer que em todos os textos necessitamos separar o espírito da letra; contudo, é justo lembrar que nas primeiras páginas do Antigo Testamento, base da Revelação Divina, está registrado: “e Deus considerou que o homem não devia ficar só”.


— A atração das almas gêmeas é traço característico de todos os Planos de luta na Terra?

— O Universo é o Plano infinito que o pensamento divino povoou de ilimitadas e intraduzíveis belezas.

Para todos nós, o primeiro instante da criação do ser está mergulhado num suave mistério, assim como também a atração profunda e inexplicável que arrasta uma alma para outra, no instituto dos trabalhos, das experiências e das provas, no caminho infinito do Tempo.

A ligação das almas gêmeas repousa, para o nosso conhecimento relativo, nos desígnios divinos, insondáveis na sua sagrada origem, constituindo a fonte vital do interesse das criaturas para as edificações da vida.

Separadas ou unidas, nas experiências do mundo, as almas irmãs caminham, ansiosas, pela união e pela harmonia supremas, até que se integrem, no Plano espiritual, onde se reúnem para sempre na mais sublime expressão de amor divino, finalidade profunda de todas as cogitações do ser, no dédalo do destino.


— A união das almas gêmeas pode constituir restrição ao amor universal?

— O amor das almas gêmeas não pode efetuar semelhante restrição, porquanto, atingida a culminância evolutiva, todas as expressões afetivas se irmanam na conquista do amor divino. O amor das almas gêmeas, em suma, é aquele que o Espírito, um dia, sentirá pela Humanidade inteira.


— Se todos os seres possuem a sua alma gêmea, qual a alma gêmea de Jesus-Cristo?

— Não julgamos acertado trazer a figura do Cristo para condicioná-la aos meios humanos, num paralelismo injustificável, porquanto em Jesus temos de observar a finalidade sagrada dos gloriosos destinos do Espírito.

N’Ele cessaram os processos, sendo indispensável reconhecer na sua luz as realizações que nos compete atingir.

Representando para nós outros a síntese do amor divino, somos compelidos a considerar que de sua culminância espiritual enlaçou no seu coração magnânimo, com a mesma dedicação, a Humanidade inteira, depois de realizar o amor supremo.


— Perante a teoria das almas gêmeas, como esclarecer a situação dos viúvos que procuram novas uniões matrimoniais, alegando a felicidade encontrada no lar primitivo?

— Não devemos esquecer que a Terra ainda é uma escola de lutas regeneradoras ou expiatórias, onde o homem pode consorciar-se várias vezes, sem que a sua união matrimonial se efetue com a alma gêmea da sua, muitas vezes distante da Esfera material.

A criatura transviada, até que se espiritualize para a compreensão desses laços sublimes, está submetida, no mapa de suas provações, a tais experiências, por vezes pesadas e dolorosas.

A situação de inquietude e subversão de valores na alma humana justifica essa provação terrestre, caracterizada pela distância dos Espíritos amados, que se encontram num plano de compreensão superior, os quais longe de desdenharem as boas experiências dos companheiros de seus afetos, buscam facultar-lhas com a máxima dedicação, de modo a facilitar o seu avanço direto às mais elevadas conquistas espirituais.


— Os Espíritos evolutidos, pelo fato de deixarem algum ser amado na Terra, ficam ligados ao planeta pelos laços da saudade?

— Os Espíritos superiores não ficam propriamente ligados ao orbe terreno, mas não perdem o interesse afetivo pelos seres amados que deixaram no mundo, pela quais trabalham com ardor, impulsionando-os na estrada das lutas redentoras, em busca das culminâncias da perfeição.

A saudade, nessas almas santificadas e puras, muito mais sublime e mais forte, por nascer de uma sensibilidade superior, salientando-se que, convertida num interesse divino, opera as grandes abnegações do Céu, que seguem os passos vacilantes do Espírito encarnado, através de sua peregrinação expiatória ou redentora na face da Terra.


— Somente pela prece a alma encarnada pode auxiliar um Espírito bem-amado que a antecedeu na jornada do túmulo?

— A oração coopera eficazmente em favor do que partiu, muitas vezes com o espírito emaranhado na rede das ilusões da existência material. Todavia, o coração amigo que ficou aí no mundo, pela vibração silenciosa e pelo desejo perseverante de ser útil ao companheiro que o precedeu na sepultura, para os movimentos da vida, nos momentos de repouso do corpo, em que a alma evolvida pode gozar de relativa liberdade, pode encontrar o Espírito sofredor ou errante do amigo desencarnado, despertar-lhe a vontade no cumprimento do dever, como orientá-lo sobre a sua realidade nova, sem que sua memória corporal registre o acontecimento na vigília comum.

Daí nasce a afirmativa de que somente o amor pode atravessar o abismo da morte.


— Como devemos interpretar a sentença: — “Há eunucos que se castraram a si mesmos, por causa do reino dos Céus”? (Mt 19:12)

— Almas existem que, para obterem as sagradas realizações de Deus em si próprias, entregam-se a labores de renúncia, em existência de santificada abnegação.

Nesse mister, é comum abdicarem transitoriamente as ligações humanas, de modo a acrisolarem os seus afetos e sentimentos em vidas de ascetismo e de longas disciplinas materiais.

Quase sempre, os que na Terra se fazem eunucos para os reinos do Céu, agem de acordo com os dispositivos sagrados de missões redentoras, nas quais, pelo sacrifício e pela dedicação, se redimem entes amados ou a alma gêmea da sua, exilados nos caminhos expiatórios. Numerosos Espíritos recebem de Jesus permissão para esse gênero de esforços santificantes, porquanto, nessa tarefa, os que se fazem eunucos, pelos reinos do Céu, precipitam os processos de redenção do ser ou dos seres amados, submersos nas provas e, simultaneamente, pela sua condição de evolvidos, podem ser mais facilmente transformados, na Terra, em instrumentos da verdade e do bem, redundando o seu trabalho em benefícios inestimáveis para os entes queridos, para a coletividade e para si próprios.