Evangelho por Emmanuel, O – Comentários ao Evangelho Segundo Marcos

Agradecimentos



Grandes e pequenas contribuições se somaram neste que é o resultado de muitas mãos e corações. Por isso queremos deixar grafados aqui nossos agradecimentos.

Em primeiro lugar, queremos registrar nossa gratidão à Federação. Espírita Brasileira, particularmente à Diretoria da Instituição pelo apoio e incentivo com que nos acolheram; às pessoas responsáveis pela biblioteca e arquivos, que literalmente abriram todas as portas para que tivéssemos acesso aos originais de livros, revistas e materiais de pesquisa e à equipe de editoração pelo carinho, zelo e competência demonstrados durante o projeto.

Aos nossos companheiros e companheiras da Federação Espírita do Distrito Federal, que nos ofereceram o ambiente propício ao desenvolvimento do estudo e reflexão sobre o Novo Testamento à luz da Doutrina Espírita. Muito do que consta nas introduções aos livros e identificação dos comentários tiveram origem nas reuniões de estudo ali realizadas.

Aos nossos familiares, que souberam compreender-nos as ausências constantes, em especial ao João 5itor, 9 anos, e Ana Clara, 11 anos, que por mais de uma vez tiveram que acompanhar intermináveis reuniões de pesquisa, compilação e conferência de textos. Muito do nosso esforço teve origem no desejo sincero de que os ensinos aqui compilados representem uma oportunidade para que nos mantenhamos cada vez mais unidos em torno do Evangelho.

A Francisco Cândido Xavier, pela vida de abnegação e doação que serviu de estrada luminosa por meio da qual foram vertidas do alto milhares de páginas de esclarecimento e conforto que permanecerão como luzes eternas a apontar-nos o caminho da redenção.

A Emmanuel, cujas palavras e ensinos representam o contributo de uma alma profundamente comprometida com a essência do Evangelho.

A Jesus que, na qualidade de Mestre e Irmão maior, soube ajustar-se a nós, trazendo-nos o seu sublime exemplo de vida e fazendo reverberar em nosso íntimo a sinfonia imortal do amor. Que a semente plantada por esse excelso Semeador cresça e se converta na árvore frondosa da fraternidade, sob cujos galhos possa toda a humanidade se reunir um dia.

A Deus, Inteligência suprema, causa primeira de todas as coisas e Pai misericordioso e bom de todos nós.




Fac-símile do comentário mais antigo a integrar a coleção, referente a Jo 10:30, publicado em novembro de 1940 na revista Reformador.





N. E.: Essa mensagem no 4° volume da coleção O Evangelho por Emmanuel, mas, considerando seu conteúdo e significação, optamos por incluí-la também no início de cada volume.




Apresentação



O constitui uma resposta sublime de Deus aos apelos aflitos das criaturas humanas.

Constituído por 27 livros, que são: os 4 , 1 , 1 carta do apóstolo Paulo , 2 , 1 , 1 , 1 , 1 , 2 , 2 , 1 , 1 , 1 , 1 , 2 , 3 , 1 e o .

A obra, inspirada pelo Senhor Jesus, que vem atravessando os dois primeiros milênios sob acirradas lutas históricas e teológicas, pode ser considerada como um escrínio de gemas preciosas que rutilam sempre quando observadas.

Negada a sua autenticidade por uns pesquisadores e confirmada por outros, certamente que muitas apresentam-se com lapidação muito especial defluente da época e das circunstâncias em que foram grafadas em definitivo, consideradas algumas como de natureza canônica e outras deuterocanônicas, são definidas como alguns dos mais lindos e profundos livros que jamais foram escritos. Entre esses, o , portador de beleza incomum, sem qualquer demérito para os demais.

Por diversas décadas, o nobre Espírito Emmanuel, através do mediumato do abnegado discípulo de Jesus, Francisco Cândido Xavier, analisou incontáveis e preciosos versículos que constituem o Novo Testamento, dando-lhe a dimensão merecida e o seu significado na atualidade para o comportamento correto de todos aqueles que amam o Mestre ou o não conhecem, sensibilizando os leitores que se permitiram penetrar pelas luminosas considerações.

Sucederam-se centenas de estudos, de pesquisas preciosas e profundas, culminando em livros que foram sendo publicados à medida que eram concluídos.

Nos desdobramentos dos conteúdos de cada frase analisada, são oferecidos lições psicológicas modernas e psicoterapias extraordinárias, diretrizes de segurança para o comportamento feliz, exames e soluções para as questões sociológicas, econômicas, étnicas, referente aos homens e às mulheres, aos grupos humanos e às Nações, ao desenvolvimento tecnológico e científico, às conquistas gloriosas do conhecimento, tendo como foco essencial e transcendente o amor conforme Jesus ensinara e vivera.

Cada página reflete a claridade solar na escuridão do entendimento humano, contribuindo para que o indivíduo não mais retorne à caverna em sombras de onde veio.

Na condição de hermeneuta sábio, o nobre Mentor soube retirar a ganga que envolve o diamante estelar da revelação divina, apresentando-o em todo o seu esplendor e atualidade, porque os ensinamentos de Jesus estão dirigidos a todas as épocas da humanidade.

Inegavelmente, é o mais precioso conjunto de estudos do evangelho de que se tem conhecimento através dos tempos, atualizado pelas sublimes informações dos Guias da sociedade, conforme a Revelação Espírita.

Dispondo dos originais que se encontram na Espiritualidade superior, Emmanuel legou à posteridade este inimaginável contributo de luz e de sabedoria.

Agora enfeixados em novos livros, para uma síntese final, sob a denominação O Evangelho por Emmanuel, podem ser apresentados como o melhor roteiro de segurança para os viandantes terrestres que buscam a autoiluminação e a conquista do reino dos Céus a expandir-se do próprio coração.

Que as claridades miríficas destas páginas que se encontram ao alcance de todos que as desejem ler, possam incendiar os sentimentos com as chamas do amor e da caridade, iluminando o pensamento para agir com discernimento e alegria na conquista da plenitude!


Salvador (BA), 15 de agosto de 2013.




N. E.: Página psicografada pelo médium Divaldo Pereira Franco, na Mansão do Caminho, em Salvador, Bahia.




Prefácio



O é a base de uma das maiores religiões de nosso tempo. Ele traz a vida e os ensinos de Jesus da forma como foram registrados por aqueles que, direta ou indiretamente, tiveram contato com o Mestre de Nazaré e sua mensagem de amor que reverbera pelos corredores da história.

Ao longo dos séculos, esses textos são estudados por indivíduos e comunidades, com o propósito de melhor compreender o seu conteúdo. Religiosos, cientistas, linguistas e devotos, de variados credos, lançaram e lançam mão de suas páginas, ressaltando aspectos diversos, que vão desde a história e confiabilidade das informações nelas contidas, até padrões desejáveis de conduta e crença.

Muitas foram as contribuições, que ao longo de quase dois mil anos, surgiram para o entendimento do Novo Testamento. Essa, que agora temos a alegria de entregar ao leitor amigo, é mais uma delas, que merece especial consideração. Isso porque representa o trabalho amoroso de dois benfeitores, que, durante mais de sessenta anos, se dedicaram ao trabalho iluminativo da senda da criatura humana. Emmanuel e Francisco Cândido Xavier foram responsáveis por uma monumental obra de inestimável valor para nossos dias, particularmente no que se refere ao estudo e interpretação da mensagem de Jesus.

Os comentários de Emmanuel sobre o Evangelho encontram-se espalhados em 138 livros e 441 artigos publicados ao longo de trinta e nove anos nos periódicos Reformador e Brasil Espírita. Por essa razão, talvez poucos tenham a exata noção da amplitude desse trabalho, que totaliza 1.616 mensagens sobre mais de mil versículos. Todo esse material foi agora compilado e organizado em uma coleção, cujo primeiro volume é o que ora apresentamos ao público.

Essa coletânea proporciona uma visão ampliada e nova do que representa a contribuição de Emmanuel, para o entendimento e resgate do Novo Testamento. Em primeiro lugar, porque possibilita uma abordagem diferente da que encontramos nos livros e artigos, que trazem, em sua maioria, um versículo e um comentário em cada capítulo. Neste trabalho, os comentários foram agrupados pelos versículos a que se referem, possibilitando o estudo e a reflexão sobre os diferentes aspectos abordados pelo autor. Encontraremos, por exemplo, 21 comentários sobre Mt 5:44-11 comentários sobre Jo 8:32-8 sobre Lc 17:21. Ao todo, 305 versículos receberam do autor mais de um comentário. Relembrando antigo ditado judaico, “a Torá tem setenta faces”, Emmanuel nos mostra que o Evangelho tem muitas faces, que se aplicam às diversas situações da vida, restando-nos a tarefa de exercitar a nossa capacidade de apreensão e vivência das lições nele contidas. Em segundo lugar, porque a ordem dos comentários obedece a sequência dos 27 textos que compõem o Novo Testamento. Isso possibilitará ao leitor localizar mais facilmente os comentários sobre um determinado versículo. O projeto gráfico foi idealizado também com este fim. A coleção é composta de sete volumes:

Volume 1 - Comentários ao Evangelho segundo Mateus.

Volume 2 - Comentários ao Evangelho segundo Marcos.

Volume 3 - Comentários ao Evangelho segundo Lucas.

Volume 4 - Comentários ao Evangelho segundo João.

Volume 5 - Comentários ao At.

Volume 6 - Comentários às cartas de Paulo.

Volume 7- Comentários às cartas universais e ao Apocalipse.

Em cada volume foram incluídas introduções específicas, com o objetivo de familiarizar o leitor com a natureza e características dos escritos do Novo Testamento, acrescentando, sempre que possível, a perspectiva espírita.

A quantidade de comentários contida nesse segundo volume é significativamente menor do que a do primeiro e merece alguns esclarecimentos. Em primeiro lugar, o Evangelho segundo Marcos é de fato o menor dos evangelhos. Em segundo, muitos versículos deste evangelho também estão inseridos nos outros dois sinóticos e, conforme explicado na metodologia, todas as vezes em que não há a indicação explícita de a qual versículo o comentário se refere, havendo a possibilidade de vinculá-la a Marcos e Mateus, optou-se pela vinculação a Mateus. Em função disso, a tabela de correspondência de versículos é particularmente útil neste volume.


Metodologia

O conjunto das fontes pesquisadas envolveu toda a obra em livros de Francisco Cândido Xavier, publicada durante a sua vida; todos os fascículos de Reformador, de 1927 até 2002, e todas as edições da revista Brasil Espírita. Dos 412 livros de Chico Xavier, foram identificados 138 com comentários de Emmanuel sobre o Novo Testamento.

A equipe organizadora optou por atualizar os versículos comentados de acordo com as traduções mais recentes. Isso se justifica porque, a partir da década de 60, os progressos, na área da crítica textual, possibilitaram um avanço significativo no estabelecimento de um texto grego do Novo Testamento, que estivesse o mais próximo possível do original. Esses avanços deram origem a novas traduções, como a Bíblia de Jerusalém, bem como correções e atualizações de outras já existentes, como a João Ferreira de Almeida. Todo esse esforço tem por objetivo resgatar o sentido original dos textos bíblicos. Os comentários de Emmanuel apontam na mesma direção, razão pela qual essa atualização foi considerada adequada. Nas poucas ocorrências em que essa opção pode suscitar questões mais complexas, as notas auxiliarão o entendimento. A tradução utilizada para os Evangelhos e Atos foi a de Haroldo Dutra Dias.

Foram incluídos todos os comentários que indicavam os versículos de maneira destacada ou que faziam referência a eles no título ou no corpo da mensagem.

Nos casos em que o mesmo versículo aparece em mais de uma parte do Novo Testamento e que o comentário não deixa explícito a qual delas ele se refere, optou-se por uma, evitando a repetição desnecessária do comentário em mais de uma parte do trabalho. A Tabela de correspondência de versículos traz a relação desses comentários, indicando a escolha feita pela equipe e as outras possíveis.

Os textos transcritos tiveram como fonte primária os livros e artigos publicados pela FEB. Nos casos em que um mesmo texto foi publicado em outros livros, a referência desses está indicada em nota.


A história do projeto O Evangelho por Emmanuel

Esse trabalho teve duas fases distintas. A primeira iniciou em 2010, quando surgiu a ideia de estudarmos o Novo Testamento nas reuniões do culto no lar. Com o propósito de facilitar a localização dos comentários de Emmanuel, foi elaborada uma primeira relação ainda parcial. Ao longo do tempo, essa relação foi ampliada e compartilhada com amigos e trabalhadores do movimento espírita.

No dia 2 de março de 2013, iniciou-se a segunda e mais importante fase. Terezinha de Jesus, que já conhecia a relação por meio de palestras e estudos que desenvolvemos no Grupo Espírita Operários da Espiritualidade em Brasília, comentou com o então e atual vice-presidente da FEB, Geraldo Campetti Sobrinho, que havia um trabalho sobre os comentários de Emmanuel que merecia ser conhecido. Geraldo nos procurou e marcamos uma reunião para o dia seguinte, na sede da FEB, às nove horas da manhã. Nessa reunião, o que era apenas uma relação de 29 páginas tornou-se um projeto de resgate, compilação e organização do que é um dos maiores acervos de comentários sobre o Evangelho. A realização dessa empreitada seria impensável para uma só pessoa, por isso uma equipe foi reunida e um intenso cronograma de atividades foi elaborado. As reuniões para acompanhamento, definições de padrões, escolhas de metodologias e análise de situações ocorreram praticamente todas as semanas desde o início do projeto até a sua conclusão.

O que surgiu inicialmente em uma reunião familiar composta por algumas pessoas em torno do Evangelho, hoje está colocado à disposição do grande público, com o desejo sincero de que a imensa família humana se congregue cada vez mais em torno desse que é e será o farol imortal a iluminar o caminho de nossas vidas. Relembrando o Mestre inesquecível em sua confortadora promessa:

Pois onde dois ou três estão reunidos em meu nome, aí estou no meio deles. (Mt 17:20)


Brasília, 15 de agosto de 2013.


Coordenador



N. E.: Nesta publicação, foram adotadas as seguintes siglas: MT - Mateus; LC - Lucas; MC - Marcos; JO - João.


Ver “” a seguir para maiores detalhes.




Introdução



O é o segundo texto que compõe o conjunto de 27 escritos que formam o . A sua antiguidade e características distintivas fazem deste um dos mais interessantes escritos da Boa-Nova, cuja compreensão passa, necessariamente, por um entendimento das circunstâncias que cercaram o seu surgimento, seu autor e destinatários.

Quase todos os estudiosos da atualidade consideram que a compilação deste Evangelho é a mais antiga. Aqui, contudo, vale lembrar que compilação e redação são processos distintos. Mesmo sendo considerado o mais antigo, ele é certamente herdeiro de fontes orais e ou escritas, que foram integradas no texto que chegou aos nossos dias.

Em termos de extensão, ele é o menor dos evangelhos, contendo 678 versículos e a quase totalidade de passagens deste Evangelho está também contida nos dois outros sinóticos (Mateus e Lucas). Isso é utilizado para justificar a tese de que ele seria o Evangelho mais antigo, e que os redatores de Mateus e Lucas teriam utilizado esse texto para compor suas próprias narrativas. Apesar disso, a forma, o propósito e a história atribuem a esse texto um caráter singular.


O autor

O autor não pode ser identificado pelo próprio texto, ao contrário de outros escritos do Novo Testamento. Em momento algum encontramos um autor que se autoidentifica, e já no primeiro versículo a afirmação de que este é o “Princípio do Evangelho de Jesus Cristo” denota a intenção de quem o redigiu em manter-se oculto. O Evangelho é de Jesus e é a sua ação e ensino que devem ser lembrados. A autoria atribuída a Marcos é estabelecida pelos títulos de manuscritos antigos, onde se encontra KATA MAPKON (kata Marcon - literalmente segundo ou de acordo com Marcos) e EYAITEΛION KATA MAPKON [Κατὰ Μᾶρκον Εὐαγγέλιον] (euangélion kata Marcon - evangelho segundo ou de acordo com Marcos). Sabemos, contudo, que esses títulos foram atribuídos pelos copistas, baseando-se mais em tradições do que em evidências internas do próprio texto.

As mais antigas tradições das primeiras comunidades cristãs apontam Marcos como sendo um companheiro de Pedro. Papias identifica Marcos como intérprete ou tradutor de Pedro e acrescenta que, estando em Roma, Marcos teria escrito o que tinha ouvido e aprendido de Pedro, a pedido daqueles que ouviram as preleções do pescador de Cafarnaum na capital do império. Esse estreito relacionamento pressuposto, entre o ensino de Pedro e o conteúdo do segundo Evangelho, como às vezes é chamado o Evangelho segundo Marcos, fez com que alguns no passado, como , tratassem esse texto também como o Evangelho de Pedro.

Considerando-se as tradições como verdadeiras, resta a questão de saber quem teria sido Marcos. O nome Marcos ou João Marcos aparece em várias partes do Novo Testamento, como: At 12:12; At 13:13 e At 15:36; Cl 4:10, onde é identificado como sobrinho ou primo de Barnabé; Fm 1:24, onde somos informados de que ele está junto de Paulo na prisão em Roma; 2tm 4:11 registra que Paulo pede para que Marcos seja trazido a Roma para cooperar com ele no trabalho de divulgação da Boa-Nova; e Pedro o chama de “meu filho” em 1Pe 5:13.

Marcos não fez parte dos doze apóstolos e, portanto, teria que necessariamente colher as informações em fontes que não a sua própria convivência com Jesus. Alguns, como F. Barth, sugerem que Marcos possa ser o jovem que “fugiu nu” (Mc 14:51 e seguintes), quando da prisão de Jesus. Os argumentos nesse sentido, contudo, são hipotéticos e derivam mais da tentativa de explicar um relato tão peculiar como esse do que por evidências que sustentam essa hipótese.


Destinatários

O Evangelho segundo Marcos não foi composto para um público familiarizado com a cultura judaica, sendo quase certo que seus destinatários eram principalmente gentios recém-convertidos ao Cristianismo. Em apoio a essa tese evidencia-se a necessidade de se explicar alguns costumes judaicos, como o hábito de lavar-se antes das refeições, em Mc 7:1. Se fosse escrito para leitores que conhecessem esses costumes, essa menção teria sido suprimida, como ocorre na passagem paralela em Mt 15:2.


Data e local de composição

As dificuldades de datação do Evangelho segundo Marcos repousam, primeiramente, na quase total ausência de informações no próprio texto, que possibilitem uma conexão com eventos históricos conhecidos. Por essa razão, as principais fontes utilizadas são testemunhos externos, como os de Irineu e Clemente, citado por Eusébio. Segundo Irineu, a transmissão do Evangelho segundo Marcos se deu quando Pedro deixou Roma. O problema aqui reside no termo “deixou”, que é a tradução de έξοδος (êxodos), o qual pode tanto significar que Pedro deixou Roma para ir à outra localidade, ou que ele havia já desencarnado. Pelo que nos trás Eusébio, citando Clemente, Pedro ainda estava em Roma quando esse Evangelho foi redigido.

Acredita-se que Pedro tenha sido martirizado na capital do império sob o reinado de Nero, que terminou em 68 d.C. Dessa forma, considerando-se que o Evangelho segundo Marcos tenha sido escrito enquanto o apóstolo ainda estava vivo, a data deve ser localizada antes de 68 d.C.

A favor de uma datação mais tardia, é geralmente citado o argumento de que os eventos narrados em Mc 13:14 pressupõem um conhecimento da queda do Templo de Jerusalém, ocorrida em 70 d.C. Isso, contudo, além de negar uma capacidade profética de Jesus, considera uma referência que é, no mínimo, nebulosa à destruição do segundo templo.

Enquanto há poucas dúvidas quanto ao local de redação ter sido Roma, a data aceita entre a maioria dos estudiosos varia entre os anos de 64 a 68 d.C.


Características distintivas

O elemento que já, desde o início, chama a atenção neste Evangelho é que ele nada diz sobre a infância de Jesus. O texto inicia a partir do batismo de João e prossegue em um ritmo quase frenético, relatando viagens, curas, milagres até o episódio da crucificação. Curiosamente, é também muito sucinto no que diz respeito ao relato da ressurreição e das ações do Jesus ressuscitado. A totalidade das ações de Jesus, após a ressurreição, estão no chamado “final longo” deste Evangelho (Mc 16:9). Há quem acredite que estes versículos finais teriam sido anexados ao texto posteriormente, para suprir a ausência de narrativas pós-ressurreição, visto que um Evangelho, que nada dissesse sobre o que Jesus teria feito depois de ressuscitado, seria um tanto quanto inesperado. Alguns manuscritos importantes, apesar de não serem os mais antigos, de fato trazem um texto que termina em Mc 16:8.

Algumas passagens são exclusivas deste Evangelho, como: o temor dos familiares de que Jesus esteja fora de si (Mc 3:20); a parábola da semente que cresce por si mesma (Mc 4:26); a cura de um surdo mudo na Decápolis (Mc 7:31); a cura gradual do cego em Betsaida (Mc 8:22); a exortação à vigilância dos servos (Mc 13:33); o já mencionado relato do jovem que fugiu nu (Mc 14:51); e os controversos sinais da fé (Mc 16:17).

O grego de Marcos é as vezes rude e primário, destituído da beleza poética encontrada em Lucas e longe dos longos discursos presentes em João. Isso faz com que o Jesus, que emerge da leitura desse Evangelho, esteja revestido desses elementos.


Perspectiva espírita

Emmanuel informa, no livro Paulo e Estêvão, que o autor do segundo Evangelho foi de fato João Marcos. Acrescenta ainda que ele era residente em Jerusalém, filho de Maria Marcos, uma mulher que detinha recursos financeiros significativos e que era irmã de Barnabé, o companheiro de Paulo de Tarso. Marcos era jovem e não deve ter conhecido Jesus em condições de fazer parte do grupo de seus seguidores, se é que o conheceu pessoalmente. Apresenta, ainda, um conjunto de eventos que resumiremos a seguir.

Estando Barnabé e Paulo de retorno à Jerusalém, ali encontram uma situação inesperada, onde o avanço do judaísmo sobre a Casa do Caminho produzira mudanças significativas. O clima original de fraternidade e fidelidade ao Evangelho já não era a tônica vigente, ao ponto de Tiago, que estava substituindo Pedro na liderança, enquanto este estava em viagem para Jope, não acolher os dois missionários. Por isso, eles são forçados a buscar abrigo na casa de Maria Marcos irmã de Barnabé. É lá que a irmã do ex-levita de Chipre, como Emmanuel às vezes se refere a Barnabé, expressa o seu desejo de que seu filho, João Marcos, siga os labores do Evangelho, acompanhando Paulo e Barnabé na viagem para Antioquia. Há, nesse momento, um interessante diálogo, em que Paulo, observando que o entusiasmo da mãe excedia o interesse legítimo do jovem, expõem os sacrifícios necessários aos discípulos do Mestre, procurando dissolver as ilusões de facilidades que jamais cruzariam seus caminhos. Diante desses alertas, o jovem se mostra convicto em suas disposições de prosseguir na empreitada.

No caminho entre Jerusalém e Antioquia, Paulo, refletindo sobre a perigosa situação em que se encontrava a comuni-dade de Jerusalém, elabora e expõe, a Barnabé, o seu projeto de divulgar, de maneira mais decisiva, a Boa-Nova aos gentios. O ex-levita acolhe a ideia com entusiasmo. Os dois comunicam, então, o projeto a João Marcos, que o acata, não sem algum receio quanto aos encargos que a tarefa poderia exigir. Chegando os três a Antioquia, Paulo expõe novamente o projeto de seguir em busca dos gentios aos anciãos daquela comunidade, e dali partem em viagem para a ilha de Chipre. Lá chegando, iniciam em NeaPafos o projeto de divulgação da Boa-Nova aos gentios, e um evento providencial leva Barnabé e Paulo à presença do procônsul Sérgio Paulo, a fim de socorrê-lo face uma doença que o acometia. Agradecido pela cooperação dos dois missionários, Sérgio Paulo oferece os recursos para a edificação do edifício que abrigaria a comunidade dos seguidores de Jesus na cidade. Essa seria a terceira edificação (sendo Jerusalém e Antioquia as duas primeiras) destinada a esse fim e a primeira a ser erguida como fruto do trabalho de Paulo. É em reconhecimento a esse evento e em gratidão ao pro cônsul romano que o então Saulo adota a grafia romana do seu nome, passando a se chamar Paulo. João Marcos acompanha esse primeiro movimento na ilha de Chipre, não sem sentir um assombro pelo extremado interesse em relação aos gentios e um afastamento dos preceitos mais rígidos relacionados à antiga Lei.

Dali, partem para Panfília, sob queixas do jovem filho de Maria Marcos, ante as exigências do labor. O auge do seu descontentamento começa quando se vê forçado a se dedicar às atividades de preparação dos alimentos e, quando recebe a notícia de que de Perge partiriam para Antioquia da Psídia, ele desiste da tarefa e volta à Jerusalém. João Marcos fracassara em sua primeira tentativa de seguir o Evangelho. Em sua despedida, ouviu de Paulo uma advertência quanto à necessidade de o discípulo do Evangelho manter-se em constante atividade, visto que muitos fracassaram quando cederam espaço ao descanso indevido e à invigilância.

Mais tarde, esse exemplo de fraqueza do jovem foi o motivo pelo qual Paulo rejeitou a proposta de Barnabé de novamente trazê-lo para junto deles em nova missão. Isso acabou por resultar na separação de Paulo e Barnabé, tendo este seguido novamente para Chipre, em companhia de João Marcos, enquanto o apóstolo da gentilidade prosseguiu em outra direção.

Ao final da vida de Paulo, contudo, as dificuldade e labores já haviam produzido o necessário amadurecimento do jovem Marcos e ele já gozava de reconhecimento e respeito perante o convertido de Damasco. Em sua segunda carta a Timóteo, Paulo pede que Marcos seja enviado à Roma para auxiliá-lo nos trabalhos da Boa-Nova. O tempo e o esforço haviam moldado o caráter desse jovem, que jamais esqueceria a importância da atividade constante no serviço do bem.

Esse alongado resumo das informações constantes, principalmente do , nos auxilia a compreender as experiências que marcaram esse evangelista, cujos ecos se verificam no texto de um Evangelho que enfoca sobremaneira o exemplo das ações constantes de Jesus.


Um evangelho de ação

Mais do que em qualquer outro texto, o Jesus que Marcos revela é alguém que age no mundo, que o transforma através de ações sobre indivíduos, grupos e coletividades, sabendo, de antemão que essas ações o conduzirão para o sacrifício supremo. Ele está presente no socorro às dores e problemas, curando e solucionando-os. Essas curas e milagres, contudo, não devem ser vistas somente como materiais, pois ao mesmo tempo em que ele trata o corpo, seu objetivo é a alma. O Jesus que salva é o que cura e, portanto, espera um despertar para as realidades espirituais que cercam a criatura humana.

Como vimos, para um público que não conheceu Jesus, era importante demonstrar que ele agiu e continuará agindo, cabendo a cada um de nós prosseguir no seu exemplo, trabalhando e servindo, amparando e socorrendo, lembrando que na tarefa de edificação de si mesmo, o discípulo será convidado a reconhecer que não há transformação sem esforço, nem edificação no bem sem perseverança. Talvez, essa seja uma das mais expressivas mensagens desse Evangelho, redigido por alguém que, como poucos, sofreu as angústias de ter fraquejado quando era necessário prosseguir servindo, mas que soube levantar-se de suas próprias limitações e encontrar o Mestre no campo do trabalho.




Citado por Eusébio em História Eclesiástica Livro III.


Citado por Eusébio em História Eclesiástica Livro VI.


É importante ressaltar que não existe nenhuma correlação entre o Evangelho segundo Marcos e o apócrifo Evangelho de Pedro que possui origem notadamente gnóstica.


Obviamente, aqui uma tratativa carinhosa sem que se evidencie consanguinidade já que a palavra “uióç” (uios) pode ser traduzida por seguidor, descendente ou filho em sentido figurado.


Veja a “; no primeiro volume dessa série, O Evangelho por Emmanuel: comentários ao Evangelho segundo Mateus.


Contra as Heresias, 3.1; 38-41.


História eclesiástica, 6.14.6-7.


Humberto de Campos, na crônica , publicado em Antologia mediúnica do Natal, 6. ed. FEB, atesta essa tradição.


Códex Sinaíticus (א) e Vaticanus (B)


Vide At 13:36




Segue-me! E ele o seguiu…



“E passando, viu Levi, filho de Alfeu e disse-lhe: — Segue-me. E, levantando-se, o seguiu.” — (Mc 2:14)


É interessante notar que, por todos os recantos onde Jesus deixou o sinal de sua passagem, houve sempre grande movimentação no que se refere ao ato de levantar e seguir.

André e Tiago deixam as redes para acompanhar o Salvador. (Mt 4:20)

Mateus levanta-se para segui-lo. (Mt 9:9) Os paralíticos que retomam a saúde se erguem e andam. (Mt 4:24) Lázaro atende-lhe ao chamamento e levanta-se do sepulcro. (Jo 11:43) Em dolorosas peregrinações e profundos esforços da vontade, Paulo de Tarso procura seguir o Mestre Divino, entre açoites e sofrimentos, depois de se haver levantado, às portas de Damasco. (At 9:1) Numerosos discípulos do Evangelho, nos tempos apostólicos, acordaram de sua noite de ilusões terrestres, ergueram-se para o serviço da redenção e demandaram os testemunhos santificados no trabalho e no sacrifício.

Isso constitui um acervo de lições muito claras ao espírita religioso dos últimos tempos.

A maioria dos cristãos vai adotando, em quase todos os seus trabalhos, a lei do menor esforço. Muitos esperam pela visita pessoal de Jesus no conforto das poltronas acolhedoras; outros fazem preces por intermédio dos discos. Há os que desejam comprar a tranquilidade celeste com as espórtulas generosas, como também os que, sem nenhum trabalho em si próprios, aguardam intervenções sobrenaturais dos mensageiros do Cristo pelo bem-estar de sua vida.

Pergunta a ti mesmo se estás seguindo a Jesus ou apenas às normas do culto externo do teu modo de filiação ao Evangelho. Isso é muito importante, porque levantar e renovar-se ainda é o nosso lema.




(Reformador, janeiro de 1942, p. 1)




O próximo



O próximo, em cada minuto, é aquele coração que se acha mais próximo do nosso, por divina sugestão de amor no caminho da vida.

No lar, é a esposa e o esposo, os pais e os filhos, os parentes e os hóspedes.

No templo do trabalho comum, é o chefe e o subordinado, o cooperador e o companheiro.

Na via pública, é o irmão ou o amigo anônimo que partilham conosco a mesma estrada e o mesmo clima.

Na esfera social, é a criança e o doente, o desesperado e o triste, as afeições e os laços da solidariedade comum.

Na luta contundente do esforço humano, é o adversário e o colaborador, o inimigo declarado ou oculto ou, ainda, o associado de ideais que se expressam por nossos instrutores.

Em toda parte, encontrarás o próximo, buscando-te a capacidade de entender e de ajudar. Auxilia-o com aquilo que possuas de melhor.

Os santos e os heróis ainda não residem na Terra. Somos Espíritos humanos, mistos de luz e sombra, amor e egoísmo, inteligência e ignorância.

Cada homem, na fase evolutiva em que nos encontramos, traz uma auréola de rei e uma espada de tirano.

Se chamas o fidalgo, encontrarás um servidor…

Se procuras o guerreiro, terás um inimigo feroz pela frente…

Por isso mesmo, reafirmou Jesus o velho ensinamento da Lei — “ama o próximo, como a ti mesmo…” (Mt 22:39)

É que o espírito, quando ama verdadeiramente, encontra mil meios de auxiliar, a cada instante, e o próximo, na essência, é o degrau que nos aparece diante do coração, por abençoado caminho de acesso à Glória celestial.




(Reformador, abril de 1954, página 86)

(Brasil Espírita, julho de 1961, página 3)




Harmonia dos quatro Evangelhos




HARMONIA DOS QUATRO EVANGELHOS.


FIM DA HARMONIA.



Os versos indicam onde principiam os trechos.


E. C.: A era cristã inicia-se quatro anos depois do nascimento de Jesus Cristo.




Índice dos CAPÍTULOS do Testamento Xavieriano



( ) () () () () () () () () () () () () () () () () () () ( )

As lições psicografadas em parceria com Francisco Cândido Xavier pelos médiuns , e devem ser procuradas em suas respectivas biografias. Coletânea de mensagens do .



Estudos Sistematizado e Aprofundado da Doutrina Espírita.



Estudos Sistematizado e da Doutrina Espírita.

— APÊNDICE:


FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA