Evangelho por Emmanuel, O – Comentários aos Atos dos Apóstolos

Capítulo CXIV

A viagem para Jerusalém



1 E sucedeu que, separando-nos deles, depois de zarpar e seguir em rota direta, chegamos a Kós e, no [dia] seguinte, a Rodes, e dali a Pátara. 2 Encontrando um navio que atravessava a Fenícia, embarcamos [nele] e zarpamos. 3 Quando avistamos Chipre, deixando-a a esquerda, navegamos para a Síria e aportamos em Tiro, pois o navio costumava descarregar lá a [sua] carga. 4 E, encontrando os discípulos, permanecemos lá por sete dias; eles, através do espírito, diziam a Paulo para não embarcar para Jerusalém. 5 Quando se completou para nós os dias, saindo, caminhávamos; e todos nos acompanhavam com suas mulheres e filhos, até fora da cidade. Depois de nos colocar de joelhos sobre a praia e orar, 6 nos despedimos uns dos outros e subimos para o barco; e eles retornaram para suas próprias [coisas]. 7 E nós, terminando a navegação de Tiro, chegamos a Ptolemaida e, saudando os irmãos, permanecemos um dia com eles. 8 No dia seguinte, saímos e fomos para Cesareia; e, entrando na casa de Filipe, o evangelista, que era um dos sete, permanecemos com ele. 9 Ele tinha quatro filhas virgens, que profetizavam. 10 Permanecendo [ali] mais dias, desceu da Judeia um profeta, de nome Ágabo. 11 Vindo até nós, tomou o cinto de Paulo, amarrou seus próprios pés e mãos a ele, e disse: o Espírito Santo diz: “Assim os judeus amarrarão em Jerusalém o varão de quem é este cinto e o entregarão nas mãos dos gentios”. 12 Assim que ouvimos essas [coisas], tanto nós quanto os [habitantes] do lugar imploramos para ele não subir a Jerusalém. 13 Então Paulo respondeu: que fazeis chorando e triturando o meu coração? Pois eu estou preparado não somente para ser amarrado, mas também para morrer em Jerusalém pelo nome do Senhor Jesus. 14 Não sendo persuadido, silenciamos e dissemos: seja feita a vontade do Senhor. 15 Depois desses dias, feitos os preparativos, subimos para Jerusalém. — (At 21:1)


A viagem continuou com as mesmas características. Rodes, Pátara, Tiro, Ptolemaida e, finalmente, Cesareia. Nesta cidade, hospedaram-se em casa de , que ali fixara residência desde muito tempo. O velho companheiro de lutas informou Paulo dos fatos mínimos de Jerusalém, onde muito esperavam do seu esforço pessoal para continuação da igreja. Muito velhinho, o generoso galileu falou da paisagem espiritual da cidade dos rabinos, sem disfarçar os receios que a situação lhe causava. Não somente isso constrangeu os missionários. Agabo, já em Antioquia, viera da Judeia e, em transe mediúnico na primeira reunião íntima em casa de Filipe, formulou os mais dolorosos vaticínios. (At 21:10) As perspectivas eram tão sombrias que o próprio Lucas chorou. Os amigos rogaram a Paulo de Tarso que não partisse. Seria preferível a liberdade e a vida a benefício da causa.

Ele, porém, sempre disposto e resoluto, referiu-se ao Evangelho, comentou a passagem em que o Mestre profetizava os martírios que o aguardavam na cruz e concluía arrebatadamente:

— Por que chorarmos magoando o coração? Os seguidores do Cristo devem estar prontos para tudo. Por mim, estou disposto a dar testemunho, ainda que tenha de morrer em Jerusalém pelo nome do Senhor Jesus!…


A impressão dos vaticínios de Agabo ainda não havia desaparecido, quando a casa de Filipe recebeu nova surpresa, no dia imediato. Os cristãos de Cesareia levaram à presença do ex-rabino um emissário de Tiago, de nome Mnason. (At 21:16) O Apóstolo galileu soubera da chegada do convertido de Damasco ao porto palestinense e dera-se pressa em se comunicar com ele, mediante um portador devotado à causa comum. Mnason explicou ao ex-rabino o motivo de sua presença, advertindo-o dos perigos que arrostaria em Jerusalém, onde o ódio sectarista esfervilhava e atingia as mais atrozes perseguições. Dadas a exaltação e a vigilância do judaísmo, Paulo não deveria procurar imediatamente a igreja, mas, hospedar-se em casa dele, mensageiro, onde Tiago iria falar-lhe em particular e assim resolverem o que melhor conviesse aos sagrados interesses do Cristianismo. Isto posto, o Apóstolo dos gentios seria recebido na instituição de Jerusalém, para discutir com os atuais diretores os destinos da casa.


Paulo achou muito razoáveis os cuidados e sugestões de Tiago, mas preferiu seguir os alvitres verbais do portador.

Angustiosas sombras pairavam no espírito dos companheiros do grande Apóstolo, quando a caravana, seguida de Mnason, se deslocou de Cesareia para a capital do judaísmo. Como sempre, Paulo de Tarso anunciou a Boa Nova nos burgos mais humildes.

Após alguns dias de marcha vagarosa, para que todos os trabalhos apostólicos fossem suficientemente atendidos, os discípulos do Evangelho transpuseram as portas da cidade dos rabinos, assomados de graves preocupações.

Envelhecido e alquebrado, o Apóstolo dos gentios contemplou os edifícios de Jerusalém, demorando o olhar na paisagem árida e triste que lhe recordava os anos da mocidade tumultuosa e morta para sempre. Elevou o pensamento a Jesus e pediu-lhe que o inspirasse no cumprimento do sagrado ministério.




(Paulo e Estêvão, FEB Editora., pp. 400 e 401. Indicadores 68 a
70)