Há quem afirme que a Doutrina dos Espíritos é viveiro de crentes indisciplinados, pelo excesso das interpretações e pelo arraigado individualismo dos pontos de vista. Outros proclamam que a Nova Revelação desloca a vida mental daqueles que a esposam, compelindo-os à renunciação.
Tais enunciados, porém, não encontram guarida nos fundamentos da verdade.
O Espiritismo, naturalmente, amplia os horizontes do ser.
A visão mais segura do Universo e a mais alta concepção da justiça dilatam na mente a sede de libertação, para mais altos voos do espírito, e a compreensão mais clara, aliando-se à mais viva noção de responsabilidade, estabelece sublimes sentimentos para a alma, renovando os centros de interesse para o campo íntimo, que se vê, de imediato, atraído para problemas que transcendem a experiência vulgar.
Realmente, para quem estima os padrões convencionalistas, com plena adaptação ao menor esforço, não será fácil manejar caracteres livres, nos domínios da fé, porque os desvairamentos da personalidade invariavelmente nos espreitam, tentando-nos a impor sobre outrem o tacão do nosso modo de ser.
Dentro da Nova Revelação, todavia, não há lugar para qualquer processo de cristalização dogmática ou de tirania intelectual.
A imortalidade desvendada convida o homem a afirmar-se e o centro espiritual do aprendiz desloca-se para interesses que transcendem a esfera comum.
As inteligências de todos os tipos, tanto quanto os mundos, gravitam em torno de núcleos de força, que as influenciam e sustentam.
O panorama do infinito, descortinado ao homem pelo nosso ideal, atrai o cérebro e o coração para outros poderes, e a criatura encarnada, imperceptivelmente induzida a operar em serviços diferentes, parece desajustada e sedenta, à procura de valores efetivamente importantes para os seus destinos na vida eterna.
As escolas religiosas oficializadas ou organizadas, presas a imperativos de estabilidade econômica, habitualmente gravitam em derredor da riqueza perecível ou da autoridade temporal da Terra e jazem magnetizadas pela ideia de domínio e influência que, no mundo, facilitam a solidariedade e a união, de vez que a maioria dos espíritos encarnados, ainda cegos para a divina luz, reúnem-se e obedecem alegremente, ao redor do ouro ou do comando sobre os mais fracos.
Mas no Espiritismo é difícil aglutinar caracteres libertados, sob o estandarte nivelador da convenção.
Assim como aconteceu nos trezentos anos que antecederam a escravização política do Evangelho redentor, o discípulo da nossa Doutrina Consoladora pretende encontrar um caminho de acesso à vida superior.
Aceita as facilidades humanas — para dar com largueza e desprendimento da posse.
Disputa o contentamento de trabalhar — para servir.
Busca a liberdade — para submeter-se às obrigações que lhe cabem.
Adquire luz — para ajudar na extinção das trevas.
“Está no mundo sem ser do mundo.” (Jo
E demorando-se cada discípulo, em esfera variada de trabalho, observamos que eles todos, à maneira de viajores, peregrinando escada acima — cada qual contemplando a vida e a paisagem do degrau em que se encontra —, oferecem o espetáculo de almas em desajuste e extremamente separadas entre si, porquanto os habitantes do vale ou da planície, acostumados aos mesmos quadros de cada dia, com a repetição das mesmas nuances de claridade solar, não conseguem esquecer, de improviso, as velhas atitudes de muito tempo e nem podem entender o roteiro dos que se desinteressam da ilusão, caminhando, em sentido contrário ao deles, ao encontro de outra luz.