Sementeira de Paz

Capítulo LXVIII

A vida é uma coleção de existências sucessivas



07/01/1948


Meus caros filhos, Deus conceda muita paz a vocês, intensificando-lhes a saúde e a tranquilidade.

Maria, às vésperas de seu aniversário, que nos é sumamente querido, desejo ser o primeiro a abraçar você com os meus votos de muita alegria para o seu coração, hoje e sempre.

e aqueles que jornadeiam conosco, de século a século, são naturalmente os mais fortes credores de nosso amor e reconhecimento. Acredite, minha filha, que eu possa distrair-me do infinito débito de ternura que tenho para com a sua alma? Não suponha que o velho amigo lhe esqueça as dedicações e os sacrifícios de experiência em experiência. Às vezes, enquanto os companheiros encarnados tocam as flores da árvore do tempo, os companheiros do plano espiritual trabalham nas raízes profundas, preparando os serviços e as colheitas do futuro. Sei compreender a nobreza de seu heroísmo silencioso. Na sua luta abençoada, o porvir de muitos corações depende de sua firmeza. Eu conheço as horas que você gasta a pensar na prosperidade humana e espiritual do Rômulo e das crianças, conheço a extensão de seu trabalho íntimo, desconhecido, para que tudo lhes corra bem. O lar, em que tantas graças temos recebido, é um jardim onde aspiramos as flores que você tem plantado carinhosamente. Diante do mar encapelado, que seria de uma organização sem a serenidade da defesa justa?

Compreendo-a, minha filha, e rogo ao Senhor da Vida lhe abençoe os passos. No campo do mundo, sobram os espinhos e as suas mãos já se feriram demasiadamente. A sua dor tem sangrado muito e aqui me refiro ao pretérito remoto e próximo, e não seria eu, que a estima e respeita como um pai, quem desconheceria sua renunciação e seu desejo de acertar.

A hora ainda é de luta, de defesa da paz do santuário. O espírito vigilante de esposa, mãe e guardiã fala alto em seu peito dedicado à retidão e à ordem, ao equilíbrio e à vida proveitosa.

Eis porque, no limiar de seu natalício, trago-lhe as flores de minha visitação. Parece até que estamos outra vez no Rio, quando os visitei, sozinho, com o meu coração tranquilo, reconhecido e feliz. Deixe que o papai trabalhe na outra lavoura. Buscarei semear os canteiros de novo. Mudarei a hera que cobre os muros da separação para que o sol os reaqueça, renovarei as plantações e, sobretudo, combaterei as forças que durante tantos anos nos assediam a paz tentando destruí-la. A terra abandonada será revolvida. Que não pode a enxada que Jesus abençoa, minha filha? Se ele se declarou o Semeador que saiu a semear, que não faremos nós para imitar-lhe o exemplo, que ainda nos encontramos no esforço da redenção? Modificarei tudo e então, quem sabe? Novas flores esperarão sua vinda. Não mais rosas rubras, ostentando escuros espinhos sob a verde folhagem, mas pétalas de paz e contentamento, de harmonia e de luz.

Acredite que estou trabalhando. Nas festas do Natal, costumamos pedir aos amigos que não venham à árvore festiva antes que a mesma se mantenha na forma justa. Não parece a você que é esse o nosso caso? Quero preparar as frondes da renovação e dependurar alegrias em cada folha para que você tenha a felicidade e o deslumbramento que merece. A árvore há de ser bela, cheia de estrelas santificantes, porque você tem trabalhado para a conquista. Se eu pudesse retribuir-lhe a ventura que me tem dado, certo não seria com essas pobres palavras que tentaria fazê-lo. Mas…

Você sabe que hoje as minhas dificuldades sob o ponto de vista humano são maiores. Se vibramos aqui em nota de igualdade espiritual no santuário da oração, em outra parte devo comparecer pedindo e suplicando para que a luz não se extinga. Essa, minha filha, é, porém, uma boa luta. Nunca me senti tão bem como nos últimos anos em que posso trabalhar em conjunto com vocês nesta abençoada comunhão de interesses espirituais. Ainda aqui, servir ao contentamento das criaturas que amamos, qual nos ocorre nesta casa bendita de trabalho, amor e fé viva que você criou para nós, constitui a maior bênção que podemos do eterno Senhor receber.

Creia em mim, na velha e imperecível dedicação de cada hora. Estaremos unidos, cooperando nos setores da redenção. E esteja certa de que, em minha prece de cada dia, rogo a Deus para que você e o Rômulo prossigam cada vez mais unidos, orientando o caminho para os que vêm conosco. Celebramos assim o seu natal com indizível prazer. Seus olhos não as veem, materialmente falando, mas sua alma guardará o perfume das rosas que eu lhe trago. São irmãs das que recebo de seu carinho em nossas noites de oração e entendimento. Abençoe-as o Senhor para que se convertam em estrelas de paz e júbilo para o seu coração consagrado ao bem. Não importa que outros delas não tomem conhecimento. Você e o Rômulo recebendo-as é o que eu desejo. Muitos e muitos anos se repitam com a sua e nossa data querida em feliz dilatação. Precisamos de seu concurso, de seu devotamento, de sua bondade. O carro da redenção prossegue no caminho, que não nos falte dentro dele a sua inspiração e a sua ternura vigilantes. Outros amigos partilham-me a saudação. Estamos ao seu lado tanto quanto você tem estado conosco, na abnegação e na compreensão de cada dia. Deus, minha filha, a fortaleça e enriqueça de dons cada vez mais.

Estimaria alongar-me nestas páginas, não só pela satisfação de escrever-lhe, como também por que desejo falar um pouco sobre as bênçãos que recebemos no 1947, e sobre determinado tratamento aconselhável ao Chico, mas esperaremos a quarta-feira próxima. Hoje, consagramos a noite à filha do coração e senhora do lar.

Para vocês todos a minha mensagem em Fp 1:8 (1:8).

Abraços muito afetuosos do papai,




Nota da organizadora: ao pé da mensagem havia a transcrição do versículo: “Pois Deus é minha testemunha das saudades que tenho de todos vós na terna misericórdia de Jesus.” [Essa citação equivale à da tradução do Padre Ferreira de Almeida. A presente nesse elivro, do Padre Pereira de Figueiredo, é idêntica à de Lemaistre de Sacy, em francês.]