Vida em vida

Capítulo VI

Ante Jesus



Inda vejo, Senhor, de alma oprimida,

A Trácia devastada, a ânsia de Atenas,

Constantinopla em lágrimas e penas

E Roma flagelada e envilecida…


Vejo a conquistadora e horrenda lida,

O gozo, o saque e a morte, em velhas cenas,

E o fausto senhoril que trouxe apenas

Desilusão e horror à nossa vida.


E ouço-Te a voz, Jesus, dizendo — Basta!

De um rei fizeste um verme que se arrasta

E abriste-me o caminho da aflição!…


Anos correram como sombras vagas,

Mas, depois de vestir-me em lepra e chagas,

Achei-Te, Excelso, no meu coração!


II


Hoje, Senhor, não peço o vão tributo

Das multidões famélicas, vencidas,

Que humilhei, no transcurso de outras vidas,

Semeando miséria, pranto e luto…


Das rosas que me deste por feridas

Recolhi muita graça e muito fruto.

Passageiras vitórias não disputo,

Nem procuro vanglórias esquecidas.


Perdoa-me, Senhor, se agora venho,

Recordando-Te as úlceras no Lenho,

Rogar-Te algo das bênçãos que entesouras!


E que eu possa, feliz com o dom divino,

Socorrer os irmãos do meu destino

No turbilhão das chagas redentoras!