Astronautas do Além

Capítulo XXIV

Conflitos domésticos




As nossas tarefas foram precedidas por várias observações de pais e mães que dialogavam no recinto. Eram amigos ou simpatizantes da Doutrina Espírita que nos visitavam procurando esclarecimento e reconforto, em vista dos conflitos domésticos que estão enfrentando. Conflitos sobretudo com os próprios descendentes.

No remate de cada conjunto de alegações só a ideia e a certeza da reencarnação davam lógica e entendimento aos assuntos em foco. Depois de várias conversações, todas elas proveitosas e oportunas, a nossa reunião foi iniciada e O Livro dos Espíritos nos ofereceu para estudo as questões 209 e 210 () que motivaram comentários preciosos sobre os temas da família consanguínea, aliados aos ensinamentos da reencarnação.

Ao término da reunião mais uma vez Emmanuel esteve presente complementando os estudos da noite.


O parente que se te instalou no caminho por obstáculo dificilmente transponivel…

Abençoa-o e ampara-o, quanto puderes.

As leis de causa e efeito, tanto quanto os princípios de afinidade, não funcionam sem razão.

Observa.

O tempo segue rápido. Criaturas que viste na infância do corpo físico, quase que de improviso se transformaram e renteiam contigo nos caminhos da madureza.

Acontecimentos que rearticulas, a cores vivas, na memória, mostram a idade de muitos lustros.

Assim, no curso do tempo, as existências se intercambiam umas com as outras.

Os companheiros do passado voltam a nós, reclamando o trabalho ou a pacificação, o reajuste ou a assistência que lhes devemos.

Esse coração magoado e sofredor que nos compartilha a estrada do cotidiano na Terra é invariavelmente aquele mesmo espírito que nos fez o credor de maior ternura e mais ampla abnegação.

O filho rebelde, junto do qual te surpreendes hoje, é o irmão a quem prejudicaste ontem, com irreflexões que o atiraram para a teimosia ou para as sugestões de vingança;

a filha menos submissa de agora é a jovem de antigamente em cujo sentimento plantaste desespero e revolta;

o pai enigmático dos dias que correm é o companheiro que escravizaste aos próprios caprichos e de quem, no pretérito, comandavas as horas com violência e tirania;

a genitora dominante é a irmã de outrora que tratavas sob os pés;

o familiar portador de inquietação e de sofrimento é sempre a mesma pessoa que se desequilibrou à conta de nossos erros, em épocas transatas, e que exige reabilitação ao preço de nosso cuidado e devotamento, nas áreas da existência física.

É verdade que isso nem sempre ocorre na pauta de débitos nossos, ante a justiça. O amor, onde surja, sabe sempre trazer a si aqueles a quem se consagra, convertendo empeços e provas em esperanças e alegrias, à feição de Jesus que nos ama desde séculos imemoriais muito antes que o conhecêssemos, e nos sustenta a todos, na Terra, sem dívida alguma para conosco. Ainda assim, recordemos: todo parente difícil é trabalho de amor ou rearmonização que a Divina Providência nos confia, a fim de que tenhamos o privilégio de transfigurá-lo em degrau de serviço e de luz, no rumo de nossa própria sublimação.




Para transformar as almas só existe um poder miraculoso: o amor. Sem ele, caímos, inevitavelmente, no cadinho do sofrimento, sob o fogo da dor. O amor é aquela energia misteriosa que os alquimistas procuravam, capaz de produzir a panaceia universal, remédio para todos os males, e revelar a pedra filosofal que transformava os metais comuns em ouro. A um toque de amor, as almas rudes e violentas se aprimoram e se abrandam. Por isso, ensina-nos Emmanuel que filhos e parentes difíceis não são enviados a nós apenas como inimigos do passado, mas também como criaturas queridas que perdemos nos descaminhos da vida. Nosso amor os atraí para transformá-los. Nesses casos de alquimia espiritual, os pais são sempre pacientes, abnegados, como os alquimistas medievais que se empenhavam em longas destilações e fundições em busca, de resultados impossíveis.

Em geral, pensamos que os alquimistas nada produziram nas suas loucas tentativas. Mas a verdade histórica, é bem outra. Da velha alquimia nasceu a Química, toda uma técnica de filtragem e mistura, de fusão de metais, com resultados positivos para a evolução científica do planeta. Assim, também na alquimia do amor, através das metamorfoses da reencarnação, os sacrifícios não são inúteis, os sofrimentos trazem os seus frutos. A mãe, que tudo perdoa e tudo esquece, acaba tocando o coração do filho e nele acende a chispa renovadora do amor. O pai, que suporta a rebeldia do filho em nome do amor paterno, dá-lhe a lição viva do exemplo que o libertará do passado negativo. Ai de nós se não fosse o amor, esse toque do espírito que, como a vara de Moisés, faz nascer da pedra a água para os sedentos! (Nm 20:11)

Deus criou o mundo por amor, num ato de amor fez surgir o caos do nada e o cosmos do caos. Essas alegorias aturdem os espíritos positivos, mas quando encaramos a vida em suas transformações, vemos que a metamorfose é uma lei universal. Por toda parte, as coisas e os seres se transformam. Os educadores antigos usavam os castigos físicos para os alunos rebeldes, mas os pedagogos modernos verificaram que a verdadeira disciplina é a que nasce do coração do educando tocado pelo coração do mestre. Descartes descobriu que a ideia de Deus é inata no homem; Rousseau revelou a bondade natural da criatura humana e desde Pestalozzi sabemos que a educação é um ato de amor. Mas esse ato de amor não se realiza apenas na escola, começa no lar e prossegue pela vida afora. Os pregoeiros do ódio e da violência ainda infestam a nossa cultura, mas os conflitos e as fogueiras que acenderam se vão apagando ante a compreensão de que o amor é a única força capaz de modificar o mundo. Por isso, Jesus ensinou que devemos amar os nossos inimigos (Mt 5:44) e perdoar sempre. Filhos e parentes difíceis são pedintes de amor que o nosso amor atraiu para as nossas vidas. Não são provações, são apenas provas.



Os itens citados de O Livro dos Espíritos tratam precisamente da questão de pais bons com filhos maus, advertindo que estes são uma prova para os pais, e que o dever dos pais é melhorar o Espírito que lhes foi confiado, dando-lhe a orientação necessária.