Mensagem do Amor Imortal (A)

CAPÍTULO 26

A HORA QUASE FINAL

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Marcos 14:12-17 e Lucas 22:7-13

 

A força demolidora da intriga produzia estupefação em toda parte, ampliada pelas calúnias bem-urdi- das, envolvendo a figura ímpar de Jesus.

 

Os mercadores da mentira atiçavam os ânimos dos imprevidentes, e as víboras do Sinédrio preparavam a armadilha da perversidade.

 

Mais de uma vez, as estranhas personagens tentaram encontrar motivos para O prenderem, retendo-Lhe os passos conquistadores, de forma que o verbo flamívomo silenciasse na túrgida garganta vencida pela agonia do sofrimento.

 

O ódio é um vínculo de fogo que arde entre os sicários da Humanidade. Eles se unem e se consomem em combustão penosa, enquanto refrigeram o calor insuportável da vingança, nas labaredas com que envolvem as suas vítimas. Na sucessão dos seus sentimentos terríveis, mantêm-se vivos até quando são consumidos pelas torpes atitudes a que se entregam.

 

As suas resistências, que parecem inesgotáveis, são vencidas, por fim, pelo implacável suceder do tempo, pelas circunstâncias ligeiras que variam, pela mudança de situação política ou religiosa, social ou econômica, em que apoiam a voracidade da loucura a que se entregam.

 

Era abril, e esse mês é mais curto do que junho, por exemplo, em Israel, em face do inverno em sua etapa final. . .

 

A noite chega mais rapidamente e as sombras tornam-se poderoso instrumento para as mancomunações da sordidez humana.

 

Os acontecimentos que tiveram lugar no Templo, fazia pouco tempo, eram aumentados pelos hábeis fornicado- res, esses míseros servos da difamação.

 

Mesmo que Ele fosse inocente, conforme o era, a Sua vida, o Seu holocausto se impunham, a fim de que os criminosos pudessem parecer honrados e os imorais de branco vestidos exibissem a falsa pulcritude.

 

Antes d’Ele, a História narra o martírio, o suplício e a doação de inocentes que beneficiaram as cidades, as comunidades com o seu sacrifício, sofrimento esse exigido pelos infames triunfadores da aparência.

 

Quando Orestes, por exemplo, deveria ser justiçado, por haver desrespeitado as leis, Pílades ofereceu-se ao suplício no lugar do indigitado.

 

Conta-se, também, que Efigênia ofereceu o pescoço ao cutelo, a fim de que a frota de Agamenon alcançasse Troia sem qualquer perigo. . .

 

Epimênedes fez que fossem sacrificados muitos inocentes sobre os túmulos, liberando Atenas da profanação que sofrerá pelos partidários de Chilão.

 

Na Mitologia hebraica, Abraão teve o filho salvo a tempo pelo mesmo Deus que lhe pedira o sacrifício, a fim de testar-lhe a fé, sendo substituído por um cordeiro conduzido por um anjo. . . Na grega, para salvar Atimeto, Alceste entregou-se à morte imposta pelo ódio de Artémis.

 

E imensa a lista apresentando as vítimas da crueldade humana que parece acalmar-se ante o espetáculo hediondo com o sangue inocente.

 

Depois de Jesus, as arenas de Roma ficaram cobertas pelos cadáveres das vítimas da alucinação reinante por muitos anos.

 

De igual maneira, o sangue de Jesus, talvez na paras- ceve, pudesse acalmar os iracundos inimigos da verdade, conforme pensavam. . .

 

O Seu ministério, no entanto, ainda não estava terminado.

 

Fazia-se necessário concluí-lo com urgência, e Ele o sabia.

 

O conciliábulo entre Herodes, os sacerdotes e os comerciantes, exigia a vida do Inocente que os incomodava. A Sua verdade era insuportável e não podia continuar.

 

Certamente, em todas as épocas, a verdade é um ferrete em brasa que assinala os mentirosos que a temem e se utilizam de todos os abjetos recursos para impedir-lhe a ação.

 

Sabem que é inútil, porque ninguém consegue impedir o Sol de avançar no rumo contínuo da treva, ensejando a luz sobre a Terra.

 

Reconhecem, no entanto, que podem sombreá-lo, dificultando-lhe a claridade libertadora.

 

A religião em Israel era uma indústria e uma contínua negociata, como ainda permanece no mundo enganado pelos hábeis ministros que a vendem pelo ouro que fica no mundo, quando a poderiam oferecer em contínua alvorada de libertação das consciências, como raramente acontece.

 

Assim procediam com Jesus os maquiavélicos membros do Sinédrio, da Academia e da Banca. . .

 

Todos eles acreditavam-nO como seu inimigo, mas eram eles, por sua vez, o real adversário do Libertador.

 

Invejavam-nO, pelo que Ele fazia, pela misericórdia que distendia com as Suas mãos, pelo amor que espraiava do Seu coração.

 

Neles somente havia fel e ambição em conúbio mortífero de insatisfação interior e insegurança emocional.

 

Sabiam, sim, que Ele era o Esperado, por isso deveriam liquidá-lO, porque Ele não se apresentava conforme a sua imaginação e incontrolável ambição: poderoso e odiado, conquistador perverso e venal, protetor dos espúrios controladores das vidas em ruínas. . .

 

Antes, Ele era gentil e nobre, sábio e justo, o que mais os irritava.

 

Desejavam que Ele quisesse o poder do mundo, esquecidos que Ele é o Rei do mundo, das suas grandezas e misérias, que viera reverter. . .

 

— A hora aproxima-se — dissera com suavidade.

 

Os amigos também não O entenderam, pois que, de alguma forma, ambicionavam o mundo. Eram pessoas simples e gentis, humanas e judias, cuja cultura se firmava no poder temporal. . .

 

Naquela manhã de quinta-feira, quando se inaugurava o primeiro dia dos pães ázimos, os amigos Lhe perguntaram onde Ele desejava comemorar a Páscoa.

 

Ele, que nada possuía, depois de pensar tranquilamente, repassou pela memória que não tinha amigos na cidade que lhe pudessem oferecer um espaço para a celebração.


Nada obstante, chamando Pedro e João, disse-lhes com segurança:

— Ide à cidade, e encontrareis um homem com um cântaro com água; que virá ao vosso encontro. Segui-o empós, e quando ele chegar à casa, dizei-lhe: o Mestre manda informar que o tempo está próximo. Ele manda perguntar em que aposento poderá comemorar a Páscoa com os Seus amigos? Ele vos mostrará um grande quarto mobiliado e preparado para esse fim. Fazei aí os preparativos para todos nós.

 

Eles foram e encontraram o homem anunciado, que os recebeu muito bem e levou-os ao aposento onde estariam reunidos pela última vez com o Amigo.

 

Quando desceu a noite, com o céu de veludo escuro salpicado de diamantes estrelares, Ele chegou com os outros dez discípulos, sentou-se sobre as almofadas e coxins, e manteve o último encontro coletivo com aqueles aos quais amava, mas não era por eles totalmente compreendido. . .

 

Estes são dias muito semelhantes àqueles.

 

Os Seus inimigos caluniam-nO, disfarçados de amigos, adulteram as Suas palavras, confundem as criaturas em Seu nome.

 

Todos aqueles que O amam, ainda não se decidiram pela ceia pascal e não sabem exatamente onde se dará. Interrogam os Céus em momentosos silêncios de angústia, e ficam expectantes.

 

No báratro, porém, das inquietações, Ele anuncia: Ide à cidade e encontrareis um homem servindo outros homens, sem tempo para si mesmo. Segui-o empós, e quando ele se detiver em algum lugar, dizei-lhe: o Mestre manda informar que a hora está próxima. Onde poderá Ele reunir os seus discípulos para a Páscoa de amor? O homem abrirá os braços e após tocar o peito na área do coração, responderá: —Aqui tenho preparado o recinto para essa hora na sala sublime que tenho reservado para a ação da caridade. . .

 

Esta é a hora, a hora da união, a hora quase final. Quem tiver ouvidos, que ouça. Quem possuir entendimento, que compreenda. . .

 

Paramirim-BA, em 21. 07. 2008.

 

AMÉLIA RODRIGUES