Respeitosamente, os olhares ansiosos estavam nEle cravados, enquanto as emoções estrugiam, desordenadas, expressando a gravidade do momento.
Os perturbadores da ordem, com a habilidade que tipifica os pusilânimes, colocaram-se a regular distância, dissimulando os sentimentos hostis, anuindo na aparência, mas aguardando algum deslize, a fim de acusá-lO.
À medida que sua voz se alteava com a energia necessária para verbalizar as ideias, os baderneiros dispersavam-se, ruminando o próprio fracasso.
Ali estavam corações afetuosos que vieram de longe: sofredores de todo matiz que anelavam por conforto; desiludidos que aguardavam novas esperanças, sintonizando com a sua palavra, deixando-se embriagar pela luz que dEle se irradiava.
Todos sabiam dos acontecimentos que precederam aquele momento, que irritavam os fariseus e demais membros da sinagoga. . .
Certamente Ele era maior do que o sábado, porquanto os seus discípulos se alimentaram de trigo, que colheram no dia proibido; curara um homem de mão mirrada e um cego, surdo-mudo, que sofria a constrição de um Espírito.
Impertérrito, enfrentava a multidão sempre suscetível de agitação.
De alguma forma, a massa humana parecia-se com o lago-espelho; num momento era transparente, sereno; subitamente agitava-se sob os ventos e tornados, ameaçando. . .
Ele lograva acalmar os ânimos somente com a sua presença, e a palavra, embora veemente, era qual ferro em brasa cauterizando feridas, mas também bálsamo retirandolhes as dores.
A patética, no entanto, não fora concluída.
Antes de afastar-se, Ele afirmou:
– Os ninivitas levantar-se-ão no dia do juízo contra esta geração e condená-la-ão, porque fizeram penitência ao ouvir a pregação de Jonas. Ora, está aqui alguém que é maior do que Jonas. . .
Houve um frêmito que sacudiu o povo.
Tê-lO-iam ouvido corretamente?
Maior do que Jonas, o profeta?
Não houve tempo para divagações, porque Ele pros-
seguiu:
– A rainha de Sabá erguer-se-á no dia do juízo contra essa geração e condená-la-á, porque veio dos confins da Terra para ouvir a sabedoria de Salomão. Ora, aqui está alguém que é maior do que Salomão. . .
Novo espanto e admiração simultâneos.
Ele agigantava-se na sua afirmação corajosa e destituí- da de prosápia ou de qualquer outra veleidade humana.
Era, sim, o excelente Filho de Deus!
O silêncio reinante foi quebrado pelo suave marulhar das leves ondas, que o vento morno do dia movimentava, lançando-as de encontro às praias.
Havia uma ansiedade incomum aguardando a revela- ção de novos ensinamentos.
Ele concluiu solene:
– Quando o Espírito imundo sai de um homem, vagueia por sítios áridos em busca de repouso e não o encontra. Diz, então: "Voltarei para a casa donde saí". E, à chegada, encontra-a livre, varrida e arrumada. Vai e toma sete outros Espíritos piores do que ele; e, entrando, instalam-se nessa casa. E o estado final daquele homem torna-se pior do que o inicial. Assim será também com esta geração.
Aquela era a explicação, a chave para decifrar o enigma das doenças e das perturbações.
A casa é o coração e se este é limpo de sentimentos maus, não oferece guarida às doenças, nem aos Espíritos doentes, perversos. No entanto, insatisfeito, o perseguidor recorre ao auxílio de outros parasitas, de outros cruéis companheiros, e sitiam o domicílio da alma, aguardando as brechas morais, a fim de tomá-la de assalto.
Ele, que era maior do que os Espíritos, enfrentava-os, expulsando os ociosos e os maus, porém, advertindo quanto à necessidade de não mais dar-lhes acesso mediante o erro, o acumpliciamento com o vício, a tirania, a vulgaridade, o egoísmo. . .
Terminara a magna lição, e os ouvintes deixaram-se penetrar pelos acordes finais de sua musicalidade.
Já não podiam ser confundidas suas palavras, nem alteradas.
O Homem-Luz era transparente e triunfador.
Referindo-se a Jonas, interditado por três dias, reportava-se igualmente ao futuro, quando, também Ele, ficaria no silêncio sepulcral, para ressurgir em triunfo. . .
Os olhos que o viam nublaram-se de pranto, e as dores gerais, naquele momento, se acalmaram.
No imo, sem palavras, muitos se interrogavam: Até quando O teriam?
Na comunhão natural com o pensamento dEle, deiO xavam-se envolver pelas incessantes ondas de ternura que irradiava, e comoviam-se até às lágrimas.
Ao longe, a natureza em festa estuava.
Ouviam-se as salmodias distantes.
As pessoas locomoviam-se, voltavam aos lares. . .
. . . O Espírito inferior toma sete outros e retorna, sen-
do em número de oito aqueles que passam a habitar a casa imunda, tornando-a mais devastada.
. . . Ele é maior do que Jonas, do que Salomão, Senhor deles todos!
A sinfonia alcançaria outros ouvidos, outros lugares, e fazia-se necessário seguir adiante.
Quando, quase a sós com os doze, deslumbrados, confusos ainda, ao sopro da brisa morna, deixou aquelas praias, seguindo além. Os sofrimentos humanos aguardavam-nO à frente e era necessário atender o chamado. . .
Maior de todos!