As heranças morais do primitivismo humano demoram-se como chagas abertas, exsudando desagradavelmente, embora a meditação eficiente da evolução desconsiderada.
As criaturas aferram-se aos ódios, quando apenas poderiam amar, permitir-se o forte tropismo do amor.
Há ódios de casta, de raça, de religião, de paixão dissolvente e ódio de ter ódio.
O ódio que asselvaja, cega, alucina, mata e se mata. A opção por ele é viciosa, porque o ódio é enfermidade vil, que os homens preferem cultivar, tornando-se infelizes.
Jesus sempre o enfrentou com um antídoto único, eficiente e poderoso, que é o amor.
Jamais revidou, porque a luz absorve a treva como o amor dilui o miasma que do ódio se exterioriza.
No jogo das forças, a do amor perseverante predomina pela vitalidade de que se faz portadora, modificando a onda vibratória pela qual se espraia, gerando harmonia.
Por isso, Jesus permanece invencível ao longo dos milênios.
A Samaria primitiva fora construída por Omi, antigo rei de Israel, por volta de 880 a.C. Segundo a narrativa em I Reis
Graças à sua situação geográfica e estratégica, sofreu várias invasões e vicissitudes, especialmente por parte de Sargão II, da Assíria, que a conquistou, impiedosamente, no ano 721 a.C., após um cerco de três anos, tendo sido parte da sua população escravizada e enviada para a Média...
Quando os judeus retornaram da escravidão na Babilônia, mantiveram, de Jerusalém, indesculpável rancor, que passaria de uma para outra geração, sob a justificativa de miscigenação racial...
Depois de cruéis dificuldades sofridas, Sétimo Severo ali instalou uma colônia para veteranos, passando a uma situação subalterna de longo curso.
O seu nome, Garizim, era o símbolo do ódio, por tentar competir com o de Jerusalém, onde o templo era a glória máxima de Israel.
Para os samaritanos, Deus repousava no seu santuário, desde a cisão antiga, que teve o seu máximo momento com Esdras, em 935 - a.C., quando um sacerdote de Sião ali erigiu o santuário.
Israel nunca perdoaria os samaritanos pela audácia de desdenhar o augusto altar de Jerusalém...
O ódio alimenta-se do combustível da suspeição, gerando rancor venenoso.
A aldeia não era expressiva, mas, sim, poderoso, o ódio.
Amontoado de casas entre caminhos tortuosos, não tinha qualquer significação.
Possuía mais orgulho que dignidade, mais violência que paz, mais miséria que elevação.
Por isso, pelo que dispunha, e era o pior, chegou à posteridade sem nome, sem glória.
Jesus e os discípulos seguiam a Jerusalém e passaram por ali.
Seus mensageiros iam à frente.
Estava chegando a hora, o momento do Seu testemunho, e Ele o sabia.
Todo ternura, derramava esperança e compaixão por onde transitava.
Aquelas terras, ora áridas, ora verdejantes, aqueles dias de sol, ricos de luz e noites abençoadas de estrelas, não tornariam a vê-lO.
A paisagem amena ou tórrida era percorrida pela última vez.
A canção iria silenciar a Sua voz suave e bela.
Nunca mais se escutaria igual outro cantor da Natureza.
Jamais se repetiria a música daquele poema de infinito amor.
Ninguém, no entanto, se dava conta.
A trêfega ingenuidade arquitetava planos terrenos, enquanto Ele elaborava programas espirituais.
Os Seus amigos viviam com Ele, mas não O conheciam.
Compreendê-lO-iam mais tarde, só depois, quando Ele "fosse erguido"...
Quando os que O precediam chegaram à aldeia, a fim de adquirir víveres e mantimentos, somente porque estavam de passagem para Jerusalém não foram recebidos.
Não importava que eles não fossem judeus.
O ódio não logica, tenta dominar.
Obstruindo a razão, impõe-se, pois que é incapaz de conquistar.
Porque chegassem empós, e vendo a rudeza, a maldade que explodia em ira, João e Tiago deixaram-se contaminar e rogaram-lhe: — "Senhor, queres que digamos que desça fogo do céu e os consuma?" (Lucas
A paciência é a mestra do bruto, que o transforma, enquanto a compreensão faz-se o instrumento para que a compaixão perdoe o agressor, jamais revidando um com outro mal, nunca sintonizando com o desequilíbrio.
O sacerdócio era de amor e só com o amor seria realizado.
Percebendo a imaturidade dos discípulos e a sua pequenez, o Senhor repreendeu-os, seguindo para outra povoação.
Quando alguém despreza, outrem anela.
Uns repudiam, outros desejam.
A vida é feita de buscas, de trocas, de encontros.
A aldeia insignificante expulsava Jesus, que é o Senhor do mundo...
Porque não vê, o cego reduz o universo à dimensão do seu limite...
Os pigmeus consideram a vida sob o desfocar da sua altura.
A aldeia da Samaria era grande na sua pequenez orgulhosa, e rica na imensa pobreza do seu desvalor.
O preconceito é a força da ignorância, e o ignorante se destaca na pujança da sua limitação.
Jesus estava ali e os prejuízos morais O expulsavam, por uma questão de estreiteza de conceito, de óptica, de paixão.
Os aldeãos nem sequer buscaram conhecê-lO.
Há um medo, quase inconsciente, da verdade; um terrível pavor da liberdade.
Por isso, o homem torna-se libertino, quando se supõe livre, e presunçoso, quando se crê na posse da verdade.
Jesus, não obstante, seguiu a Jerusalém, ao seu destino...
Há samaritanos e judeus pelo caminho da verdade.
Expulsaram Jesus e os Seus seguidores, das paisagens que supõem dominar, sem mesmo saber a razão.
Não se dão conta ainda de que eles passam e o Mestre fica.
Na sua mesquinhez aprisionam-se e não veem, senão o que lhes agrada a morbidez.
Incapazes de compreender, acusam.
Porque não podem amar, perseguem...
Os samaritanos expulsaram-nO dali, a Ele que sempre os tomou como modelo, e foi, talvez, o seu único amigo, na história dos tempos.