Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1860

Capítulo XXXVIII

Junho - O Espírito de um idiota

Junho

Charles de Saint-G..., é um jovem idiota de treze anos, vivo, e cujas faculdades intelectuais são de uma tal nulidade que nem conhece os pais e apenas pode alimentar-se. Há nele uma parada completa do desenvolvimento em todo o sistema orgânico.
Pensou-se que poderia ser assunto interessante de estudo psicológico.

1. (A São Luís) ─ Poderíeis dizer-nos se podemos evocar o Espírito dessa criança?
─ Podeis evocá-lo como se fosse um morto.

2. ─ Vossa resposta faz-nos supor que a evocação poderia ser feita em qualquer momento.
─ Sim. Sua alma se liga ao corpo por laços materiais, mas não por laços espirituais. Ela pode sempre desprender-se.

3. Evocação de Ch. de Saint-G...
─ Sou um pobre Espírito ligado à terra, como uma ave por um pé.

4. ─ Em vosso estado atual, como Espírito, tendes consciência de vossa nulidade neste mundo?
─ Certamente. Sinto bem o meu cativeiro.

5. ─ Quando vosso corpo dorme e vosso Espírito se desprende, tendes as ideias tão lúcidas quanto se estivésseis em estado normal?
─ Quando meu corpo infeliz repousa, estou um pouco mais livre para me elevar ao Céu, a que aspiro.

6. ─ Como Espírito experimentais um sentimento penoso do estado corporal?
─ Sim, pois é uma punição.

7. ─ Lembrai-vos da vossa existência anterior?
─ Oh, sim! Ela é a causa de meu exílio atual.

8. ─ Qual foi essa existência?
─ Um jovem libertino ao tempo de Henrique III.

9. ─ Dissestes que vossa condição atual é uma punição. Então não a escolhestes?
─ Não.

10. ─ Como pode vossa existência atual servir ao vosso progresso, no estado de nulidade em que estais?
─ Ela não me é nula perante Deus, que a impôs.

11. ─ Prevedes a duração da existência atual?
─ Não: mais alguns anos e voltarei à minha pátria.

12. ─ Desde a existência precedente até a encarnação atual, que fizestes como Espírito?
─ Porque eu era um Espírito leviano, Deus me aprisionou.

13. ─ No estado de vigília tendes consciência do que se passa em vosso redor, a despeito da imperfeição dos órgãos?
─ Vejo, entendo, mas meu corpo não compreende nem vê.

14. ─ Podemos fazer-vos algo de útil?
─ Nada.

15. (A São Luís): ─ As preces por um Espírito reencarnado podem ter a mesma eficácia que por um errante?
─ As preces são sempre boas e agradáveis a Deus. Na posição deste pobre Espírito, elas não lhe podem servir; servirão mais tarde, pois Deus as deixa de reserva.

OBSERVAÇÃO: Ninguém desconhecerá o alto ensinamento moral que decorre desta evocação. Além disso, ela confirma o que sempre foi dito sobre os idiotas. Sua nulidade moral não significa nulidade do Espírito, que, abstração feita dos órgãos, goza de todas as faculdades. A imperfeição dos órgãos é apenas um obstáculo à livre manifestação das faculdades; não as aniquila. É o caso de um homem vigoroso, cujos membros fossem comprimidos por laços. Sabe-se que, em certas regiões, longe de serem objeto de desprezo, os cretinos são cercados de cuidados benevolentes. Este sentimento não brotaria de uma intuição do verdadeiro estado desses infelizes, tanto mais dignos de atenções quanto mais seu Espírito, que compreende sua posição, deve sofrer por se ver como um refugo da Sociedade?