Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1864

Capítulo 4

Setembro Conversas de Além-Túmulo

Setembro

A Sra. Gaspard, amiga da Sra. Delanne, era uma fervorosa espírita; seu pesar era não ser médium; teria desejado sobretudo ser médium vidente. Desde longa data sofria muito de um aneurisma. Em 2 de julho último, durante a noite, a ruptura desse aneurisma provocou-lhe a morte súbita. A Sra. Delanne ainda não tinha sido informada do evento quando, de dia, ouviu pancadas em diversas partes do quarto; a princípio não prestou grande atenção, mas a persistência dos golpes fez pensasse que algum Espírito queria comunicar-se. Como é excelente médium, tomou do lápis e escreveu o que se segue:

Oh! boa Sra. Delanne, como me fizestes esperar! Corri para vos contar minha nova faculdade: sou médium vidente. Vi meu caro Emílio, minhas crianças, todos, minha mãe, a mãe do Sr. Gaspard. Oh! como ele vai sentir-se feliz quando souber! Obrigado meu Deus, por tão grande favor!


P. – Sois vós mesma, Sra. Gaspard, que me falais neste momento?

Resposta. – Como! não me vedes? Há muito tempo estou perto de vós. Estava impaciente porque não me respondíeis. Vamos! vireis, não? Agora é a vossa vez. E, depois, isto vos fará bem; iremos passear, agora que me sinto bem. Oh! como se é feliz, ao rever aqueles a quem se ama! Foi o que me curou. Como o bom Deus é bom e como cumpre suas promessas quando se é fiel aos seus mandamentos! – Hem, meu Emílio! e dizer que meu pobre pai ainda vai falar que estou louca! Isso não tem importância; mesmo assim lho direi. – Vamos partir? É preciso levar vossa mãe, pois isto lhe fará bem. Pobre mulher! ela tem um ar tão bom!


P – Vamos partir, Sra. Gaspard; eu vos sigo. Vamos mesmo à vossa casa em Châtillon? Dizei-me o que vedes ou, melhor, o que lá se passa no momento.

Resposta. – Coisas singulares!


Dito isto, o Espírito se foi e a Sra. Delanne nada mais pôde obter.

Para a compreensão desta última parte da comunicação, diremos que, desde algum tempo, as duas amigas haviam planejado um passeio na casa de campo da Sra. Gaspard, em Châtillon. Surpreendida por uma morte súbita, a Sra. Gaspard não se dá conta de sua posição e ainda se julga viva; como vê os Espíritos que lhe são caros, imagina haver-se tornado vidente; é uma particularidade notável da transição da vida corpórea à vida espiritual. Além disso, achando-se livre do sofrimento, a Sra. Gaspard crê-se curada e vem renovar seu convite à Sra. Delanne. Contudo, nela as ideias são confusas, pois vem avisá-la por meio de golpes em torno dela, sem compreender que não seria advertida desta maneira se estivesse viva.

A Sra. Delanne logo compreende a singularidade da posição, mas, não lhe querendo tirar as ilusões, a convida a ver o que se passa em Châtillon. O Espírito para ali se transporta e talvez tenha sido chamado à realidade por alguma circunstância imprevista, já que exclama: “Coisas singulares!”, e interrompe a comunicação.

Aliás, a ilusão durou pouco. A partir do dia seguinte a Sra. Gaspard já estava completamente desprendida e ditou excelente comunicação, dirigida ao marido e aos amigos, congratulando-se por haver conhecido o Espiritismo, que lhe proporcionara uma morte isenta das angústias da separação.