1. — Nosso número do mês de agosto contém a reprodução de um artigo muito notável, tirado do jornal Droit, sobre as funestas consequências do materialismo, do ponto de vista da legislação e da ordem social; o Patrie de 30 de julho de 1868 fazia a apreciação de uma obra sobre a influência do espiritualismo nas artes. Esses dois artigos são o corolário e complemento um do outro: no primeiro provam-se os perigos do materialismo para a sociedade, e no segundo demonstra-se a necessidade do espiritualismo, sem o qual as artes e a poesia ficam privadas de seu elemento vital.
Com efeito, o sublime da arte e da poesia é falar à alma, elevar o pensamento acima da matéria que nos oprime e da qual incessantemente aspiramos a sair; mas, para fazer vibrar as cordas da alma, é preciso ter uma alma que vibre em uníssono. Como aquele que não crê senão na matéria poderia inspirar-se e se tornar intérprete de pensamentos e sentimentos que estão fora da matéria? Seu ideal não sai do terra-a-terra, e é frio, porque nem fala ao coração nem ao espírito, mas somente aos sentidos materiais. O belo ideal não está no mundo material; deve-se, pois, buscá-lo no mundo espiritual, que é o da luz para os cegos; a impossibilidade de o atingir criou a escola realista, que não sai deste mundo, porque aí está todo o seu horizonte; estando o verdadeiro belo fora do alcance de certos artistas, declaram que o belo é feio. A fábula da raposa que tem o rabo cortado continua sempre uma verdade.
A época em que a fé religiosa era ardente e sincera é também aquela em que a arte religiosa produziu suas mais belas obras-primas; o artista se identifica com o seu assunto, porque o via com os olhos da alma e o compreendia; era o seu próprio pensamento que ele traduzia; mas à medida que a fé se foi, o gênio inspirador partiu com ela. Não é, pois, de admirar que se a arte religiosa está hoje em plena decadência, não é o talento que falta, mas o sentimento.
Dá-se o mesmo com o ideal em todas as coisas As obras de arte não cativam senão quando fazem pensar. Pode-se admirar o talento plástico do artista, mas ele não pode suscitar um pensamento que não existe em si; pinta um mundo que não vê, não sente nem compreende; é por isso que às vezes cai no grotesco; sente-se que ele visa ao efeito e se esforçou por fazer algo novo torturando a forma: eis tudo.
Pode-se dizer outro tanto da música moderna; faz muito barulho, exige do executante uma grande agilidade dos dedos e da garganta, uma verdadeira deslocação; ela move as fibras do ouvido, mas não as do coração. Esta tendência da arte para a materialidade perverteu o gosto do público, cuja delicadeza do senso moral se acha embotada.
A obra do Sr. Chassang é a aplicação dessas ideias à arte em geral, e à arte grega em particular. Reproduzimos com prazer o que dela diz o autor da crítica do Patrie, porque é uma prova a mais da enérgica reação que se opera em favor das ideias espiritualistas e que, como dissemos, toda defesa do espiritualismo racional rasga a via do Espiritismo, que é o seu desenvolvimento, combatendo os seus mais tenazes adversários: o materialismo e o fanatismo.
O Sr. Chassang † é o autor da história de Apolônio de Tiana, à qual nos referimos na Revista de outubro de 1862.
2. — “Esse livro, de um caráter todo especial, não foi feito por ocasião dos recentes debates sobre o materialismo e, sem sombra de dúvida, é independentemente da vontade do autor que as circunstâncias lhe vieram dar uma espécie de atualidade. Ao escrevê-lo o Sr. Chassang não pretendia fazer obra de metafísico, mas de simples literato. Todavia, como as grandes questões de metafísica estão eternamente na ordem do dia, e toda obra literária verdadeiramente digna desse nome supõe sempre um princípio filosófico, esse livro, de inspiração espiritualista muito marcante, se acha em correlação com as preocupações do momento.
“O Sr. Chassang deixa a outros a refutação do materialismo do ponto de vista filosófico puro. Sua tese é inteiramente estética. O que ele pretende provar é que a literatura e a arte não estão menos interessadas que a vida moral no triunfo das doutrinas espiritualistas. Assim como o materialismo despoetiza a vida e se dá ao cruel prazer de desencantar o homem, tirando-lhe toda esperança, toda consolação em meio dos males que o cercam, do mesmo modo subtrai impiedosamente da literatura e da arte o que chama as ilusões e as mentiras, e, sob pretexto de verdade, proclama o realismo, fazendo que os artistas e escritores não expressem senão o que é.
“As doutrinas espiritualistas, ao contrário, abrem em todos os sentidos a vida às nobres aspirações; entretêm o homem com o futuro e a imortalidade; dizem ao poeta e ao artista que há um belo ideal, do qual as mais belas criações humanas não passam de pálidos reflexos, e sobre o qual deve sempre fixar os olhos quem quer que queira seduzir os seus contemporâneos e viver para a posteridade.
“Depois de ter, na sua introdução, desenvolvido este dado do ponto de vista geral, o Sr. Chassang procura a sua prova na mais bela das literaturas e na maior das artes que têm excitado a admiração dos homens: na literatura e na arte dos antigos gregos. Para semelhante demonstração, uma ordem rigorosa e didática é antes para fugir do que para rebuscar; assim, depois da introdução que expõe os princípios, vêm não capítulos estreitamente unidos e metodicamente relacionados, mas estudos isolados que, todos, se ligam ao mesmo assunto, inspiram-se no mesmo sentimento e convergem para o mesmo objetivo. Assim, o livro tem, ao mesmo tempo, unidade no conjunto e variedade nas partes.
“É, antes de tudo, um tratado sobre o que o autor chama com propriedade o espiritualismo popular entre os antigos, isto é, as crenças dos gregos e dos romanos sobre o destino das almas após a morte. Mostra que, se entre essas crenças há erros evidentes, não obstante esses erros repousam todos na esperança de uma outra vida. O culto dos mortos não contém, com efeito, implicitamente uma profissão de fé espiritualista? A última vitória do materialismo seria de o suprimir, e seus adeptos deveriam logicamente chegar a isso; do contrário, para que serviria levantar a pedra do túmulo? para que, sobretudo, cercar o túmulo de respeito, se nada há lá dentro? Assim fala o Sr. Chassang.”
Octave Sachot.