quando algumas crianças foram colocadas à sua frente, a fim de que as abençoasse.
Era costume entre os judeus que os homens santos ministrassem suas bênçãos - uma evocação da proteção divina sobre crianças e adultos.
O ato de abençoar enraizou-se no Cristianismo, estendendo-se ao próprio relacionamento familiar, envolvendo pais e filhos.
—A "bença", pai!
—Deus te abençoe, filho!
—A "bença", mãe!
—Deus te abençoe, filho!
A criançada podia dormir tranquila!
Estava presente a proteção divina, evocada pelos pais!
Gente com mania de originalidade contesta o ato de abençoar, sob a alegação de que tende a estabelecer barreiras entre pais e filhos.
O que abençoa situa-se acima daquele que é abençoado.
Isso inibiría a comunhão afetiva.
Levada às últimas consequências essa orientação, deveriamos eliminar toda disciplina no lar, porquanto, qualquer iniciativa nesse sentido representaria o exercício de indébito autoritarismo, a erguer barreiras entre adultos e crianças.
Ah, esses doutos!
Quando o cérebro se desliga do coração, perde o rumo e envereda por estranhos caminhos.
Os pais que abençoam seus filhos.
—Deixai vir a mim as criancinhas, porque delas é o Reino de Deus.
Em verdade vos digo que aquele que não receber o Reino de Deus como uma criança, de modo algum entrará nele.
Abraçando os pequenos, abençoou-os, impondo-lhes as mãos.
Situava, assim, as crianças como o símbolo das condições necessárias ao ingresso no Reino de Deus.
Bem, em princípio, uma perguntinha: Onde fica?
Se você não sabe, leitor amigo, não se preocupe.
—O Reino de Deus está dentro de vós.
Então, não se trata de local geográfico, na Terra ou alhures.
E um estado de consciência!
. Céu está em algum recanto, em nosso universo interior.
Obviamente, o inferno também.
Diriamos que são realizações pessoais, condicionadas ao que pensamos e fazemos.
Uma senhora vivia desolada e infeliz!
Dizia-se mal-amada...
O marido não lhe dava atenção; os filhos a desrespeitavam; os vizinhos eram invejosos; o pessoal de sua igreja agia com falsidade; sua vida, um tormento! Quando desencarnou, por uma questão de afinidade, ela, que cultivava um inferno em seu coração, viu-se em região de sofrimentos.
Ali, mais que nunca, sentia-se infeliz.
Mal-amada...
Reclamava que Deus não lhe ouvia as orações. Via-se cercada de gente atormentada; revoltava-se contra o destino ingrato, mergulhada num oceano de aflições...
Depois de muito sofrer, brilhou em seu coração uma réstia de humildade.
Lavou o coração com lágrimas contritas, implorando a complacência divina.
Imediatamente foi socorrida por benfeitores espirituais que a levaram para estágio reparador, em maravilhosa colônia espiritual.
Ali vivia uma comunidade feliz e ajustada, que observava integralmente o Evangelho, cultivando os valores do Bem.
A senhora esteve satisfeita...
por algum tempo.
Em breve caiu nos tormentos a que se habituara. .
Mal-amada...
Ninguém lhe dava atenção...
Havia falsidade nas pessoas...
A ladainha de sempre!
Vivendo em autêntico paraíso, permanecia no inferno que sustentava em si mesma.
Em Velho Tema, Vicente de Carvalho (1866-1
924) exprime essa arraigada condição humana: a incapacidade de sermos felizes por não valorizarmos o que a vida nos oferece.
Só a leve esperança, em toda a vida, Disfarça a pena de viver, mais nada;
Nem é mais a existência, resumida, Que uma grande esperança malograda.
O eterno sonho da alma desterrada, Sonho que a traz ansiosa e embevecida, E uma hora feliz, sempre adiada E que não chega nunca em toda a vida.
Essa felicidade que supomos, Arvore milagrosa que sonhamos, Toda arreada de dourados pomos, Existe, sim; mas nós não a alcançamos Porque está sempre apenas onde a pomos E nunca a pomos onde nós estamos.
Onde estivermos, na Terra ou no Além, sustentaremos o céu ou o inferno, construído na intimidade de nosso ser com as ferramentas do cérebro e do coração, tendo por material o que pensamos e sentimos.
Para ingressar na recôndita região de nosso universo interior, onde está o Reino de Deus, é preciso uma senha.
Ser como as crianças - revela Jesus.
Há algo inerente à natureza infantil que devemos imitar para abrir as portas do paraíso interior.
A senha se compõe de duas virtudes.
• Pureza.
A criança não é maliciosa, não vê o mal no comportamento alheio, não se compraz com a maledicência, não guarda mágoas, desconhece a hipocrisia.
É capaz de relacionar-se com qualquer pessoa, independente da cor, raça, nacionalidade, religião, posição social...
• Simplicidade.
A criança não se sente infeliz por morar em singela cabana.
Diverte-se tanto com um pau de vassoura feito cavalo, quanto o faria o menino rico num palácio, movendo-se em patinete motorizada.
Para entrar no Reino de Deus, na intimidade de nós mesmos, é preciso resgatar a criança que fomos, aprisionada na teia das ambições, dos vícios e das mazelas.
Evidentemente, não é fácil.
Como diz André Luiz, contra a pálida réstia de luz do presente, simbolizada pelo desejo de melhorar, há montanhas de trevas do passado.
Proclama o apóstolo Paulo (Romanos
O mal que não desejo, esse eu faço.
Temos visto esse filme, no desdobrar de múltiplas existências.
Mudam os cenários, mas o enredo é sempre o mesmo: Começamos a vida como "mocinhos", dispostos a mudar o.
mundo.
Terminamos como "bandidos", comprometidos por vícios e mazelas.
E preciso produzir um filme diferente, nos estúdios da Vida.
Perseverar nos bons propósitos...
Lutar contra nossas tendências inferiores...
Conservar fidelidade ao Bem...
Cultivar ideais que nos permitam sustentar a simplicidade e a pureza dos verdes anos. "Mocinhos", jamais "bandidos".
Bem-aventurados, jamais mal-amados.
No Céu, ainda que enfrentando as agruras da Terra.