O Livro dos espíritos

Capítulo VIII

Da emancipação da alma

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • O sono e os sonhos
• Item 400 •


400: O Espírito encarnado permanece de bom grado no seu envoltório corporal?
“É como se perguntasses se ao encarcerado agrada o cárcere. O Espírito encarnado aspira constantemente à sua libertação e tanto mais deseja ver-se livre do seu invólucro, quanto mais grosseiro é este.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • O sono e os sonhos
• Item 401 •


401: Durante o sono, a alma repousa como o corpo?
“Não, o Espírito jamais está inativo. Durante o sono, afrouxam- -se os laços que o prendem ao corpo e, não precisando este então da sua presença, ele se lança pelo Espaço e entra em relação mais direta com os outros Espíritos.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • O sono e os sonhos
• Item 402 •


402: Como podemos julgar da liberdade do Espírito durante o sono?
“Pelos sonhos. Quando o corpo repousa, acredita-o, tem o Espírito mais faculdades do que no estado de vigília. Lembra-se do passado e algumas vezes prevê o futuro. Adquire maior potencialidade e pode pôr-se em comunicação com os demais Espíritos, quer deste mundo, quer do outro. Dizes frequentemente: Tive um sonho extravagante, um sonho horrível, mas absolutamente inverossímil. Enganas-te. É amiúde uma recordação dos lugares e das coisas que viste ou que verás em outra existência ou em outra ocasião. Estando entorpecido o corpo, o Espírito trata de quebrar seus grilhões e de investigar no passado ou no futuro. Pobres homens, que mal conheceis os mais vulgares fenômenos da vida! Julgais-vos muito sábios e as coisas mais comezinhas vos confundem. Nada sabeis responder a estas perguntas que todas as crianças formulam: Que fazemos quando dormimos? Que são os sonhos? O sono liberta a alma parcialmente do corpo. Quando dorme, o homem se acha por algum tempo no estado em que fica permanentemente depois que morre. Tiveram sonos inteligentes os Espíritos que, desencarnando, logo se desligam da matéria. Esses Espíritos, quando dormem, vão para junto dos seres que lhes são superiores. Com estes viajam, conversam e se instruem. Trabalham mesmo em obras que se lhes deparam concluídas, quando volvem, morrendo na Terra, ao mundo espiritual. Ainda esta circunstância é de molde a vos ensinar que não deveis temer a morte, pois que todos os dias morreis, como disse um santo. Isto, pelo que concerne aos Espíritos elevados. Pelo que respeita ao grande número de homens que, morrendo, têm que passar longas horas na perturbação, na incerteza de que tantos já vos falaram, esses vão, enquanto dormem, ou a mundos inferiores à Terra, onde os chamam velhas afeições, ou em busca de gozos quiçá mais baixos do que os em que aqui tanto se deleitam. Vão beber doutrinas ainda mais vis, mais ignóbeis, mais funestas do que as que professam entre vós. E o que gera a simpatia na Terra é o fato de sentir-se o homem, ao despertar, ligado pelo coração àqueles com quem acaba de passar oito ou nove horas de ventura ou de prazer. Também as antipatias invencíveis se explicam pelo fato de sentirmos em nosso íntimo que os entes com quem antipatizamos têm uma consciência diversa da nossa. Conhecemo-los sem nunca os termos visto com os olhos. É ainda o que explica a indiferença de muitos homens. Não cuidam de conquistar novos amigos, por saberem que muitos têm que os amam e lhes querem. Numa palavra: o sono influi mais do que supondes na vossa vida. Graças ao sono, os Espíritos encarnados estão sempre em relação com o mundo dos Espíritos. Por isso é que os Espíritos superiores assentem, sem grande repugnância, em encarnar entre vós. Quis Deus que, tendo de estar em contato com o vício, pudessem eles ir retemperar-se na fonte do bem, a fim de igualmente não falirem, quando se propõem a instruir os outros. O sono é a porta que Deus lhes abriu, para que possam ir ter com seus amigos do Céu; é o recreio depois do trabalho, enquanto esperam a grande libertação, a libertação final, que os restituirá ao meio que lhes é próprio. O sonho é a lembrança do que o Espírito viu durante o sono. Notai, porém, que nem sempre sonhais. Que quer isso dizer? Que nem sempre vos lembrais do que vistes, ou de tudo o que havias visto, enquanto dormíeis. É que não tendes então a alma no pleno desenvolvimento de suas faculdades. Muitas vezes, apenas vos fica a lembrança da perturbação que o vosso Espírito experimenta à sua partida ou no seu regresso, acrescida da que resulta do que fizestes ou do que vos preocupa quando despertos. A não ser assim, como explicaríeis os sonhos absurdos, que tanto os sábios, quanto as mais humildes e simples criaturas têm? Acontece também que os maus Espíritos se aproveitam dos sonhos para atormentar as almas fracas e pusilânimes. Em suma, dentro em pouco vereis vulgarizar-se outra espécie de sonhos. Conquanto tão antiga como a de que vimos falando, vós a desconheceis. Refiro-me aos sonhos de Joana, ao de Jacó, aos dos profetas judeus e aos de alguns adivinhos indianos. São recordações guardadas por almas que se desprendem quase inteiramente do corpo, recordações dessa segunda vida a que ainda há pouco aludíamos. Tratai de distinguir essas duas espécies de sonhos nos de que vos lembrais, do contrário cairíeis em contradições e em erros funestos à vossa fé.” Os sonhos são efeito da emancipação da alma, que mais independente se torna pela suspensão da vida ativa e de relação. Daí uma espécie de clarividência indefinida que se alonga até aos mais afastados lugares e até mesmo a outros mundos. Daí também a lembrança que traz à memória acontecimentos da precedente existência ou das existências anteriores. As singulares imagens do que se passa ou se passou em mundos desconhecidos, entremeados de coisas do mundo atual, é que formam esses conjuntos estranhos e confusos, que nenhum sentido ou ligação parecem ter. A incoerência dos sonhos ainda se explica pelas lacunas que apresenta a recordação incompleta que conservamos do que nos apareceu quando sonhávamos. É como se a uma narração se truncassem frases ou trechos ao acaso. Reunidos depois, os fragmentos restantes nenhuma significação racional teriam.

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• Item 403 •


403: Por que não nos lembramos sempre dos sonhos?
“Em o que chamas sono, só há o repouso do corpo, visto que o Espírito está constantemente em atividade. Recobra, durante o sono, um pouco da sua liberdade e se corresponde com os que lhe são caros, quer neste mundo, quer em outros. Mas, como é pesada e grosseira a matéria que o compõe, o corpo dificilmente conserva as impressões que o Espírito recebeu, porque a este não chegaram por intermédio dos órgãos corporais.”

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• Item 404 •


404: Que se deve pensar das significações atribuídas aos sonhos?
“Os sonhos não são verdadeiros como o entendem os ledores de buena-dicha, pois fora absurdo crer-se que sonhar com tal coisa anuncia tal outra. São verdadeiros no sentido de que apresentam imagens que para o Espírito têm realidade, porém que, frequentemente, nenhuma relação guardam com o que se passa na vida corporal. São também, como atrás dissemos, um pressentimento do futuro, permitido por Deus, ou a visão do que no momento ocorre em outro lugar a que a alma se transporta. Não se contam por muitos os casos de pessoas que em sonho aparecem a seus parentes e amigos, a fim de avisá-los do que a elas está acontecendo? Que são essas aparições senão as almas ou Espíritos de tais pessoas a se comunicarem com entes caros? Quando tendes certeza de que o que vistes realmente se deu, não fica provado que a imaginação nenhuma parte tomou na ocorrência, sobretudo se o que observastes não vos passava pela mente quando em vigília?”

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• Item 405 •


405: Acontece com frequência verem-se em sonho coisas que parecem um pressentimento, que, afinal, não se confirma. A que se deve atribuir isto?
“Pode suceder que tais pressentimentos venham a confirmar-se apenas para o Espírito. Quer dizer que este viu aquilo que desejava, foi ao seu encontro. É preciso não esquecer que, durante o sono, a alma está mais ou menos sob a influência da matéria e que, por conseguinte, nunca se liberta completamente de suas ideias terrenas, donde resulta que as preocupações do estado de vigília podem dar ao que se vê a aparência do que se deseja, ou do que se teme. A isto é que, em verdade, cabe chamar-se efeito da imaginação. Sempre que uma ideia nos preocupa fortemente, tudo o que vemos se nos mostra ligado a essa ideia.”

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• Item 406 •


406: Quando em sonho vemos pessoas vivas, muito nossas conhecidas, a praticarem atos de que absolutamente não cogitam, não é isso puro efeito de imaginação?
“De que absolutamente não cogitam, dizes. Que sabes a tal respeito? Os Espíritos dessas pessoas vêm visitar o teu, como o teu os vai visitar, sem que saibas sempre o em que eles pensam. Ademais, não é raro atribuirdes, de acordo com o que desejais, a pessoas que conheceis, o que se deu ou se está dando em outras existências.”

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• Item 407 •


407: É necessário o sono completo para a emancipação do Espírito?
“Não; basta que os sentidos entrem em torpor para que o Espírito recobre a sua liberdade. Para se emancipar, ele se aproveita de todos os instantes de trégua que o corpo lhe concede. Desde que haja prostração das forças vitais, o Espírito se desprende, tornando-se tanto mais livre, quanto mais fraco for o corpo.” É assim que a sonolência ou o simples torpor dos sentidos apresenta, frequentemente, as mesmas imagens do sonho.

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• Item 408 •


408: E qual a razão de ouvirmos, algumas vezes em nós mesmos, palavras pronunciadas distintamente e que nenhum nexo têm com o que nos preocupa?
“É fato: ouvis até mesmo frases inteiras, principalmente quando os sentidos começam a entorpecer-se. É, quase sempre, fraco eco do que diz um Espírito que convosco se quer comunicar.”

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• Item 409 •


409: Doutras vezes, num estado que ainda não é bem o do adormecimento, estando com os olhos fechados, vemos imagens distintas, figuras cujas mínimas particularidades percebemos. Que há aí, efeito de visão ou de imaginação?
“Estando entorpecido o corpo, o Espírito trata de desprender- -se. Transporta-se e vê. Se já fosse completo o sono, haveria sonho.”

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• Item 410 •


410: Dá-se também que, durante o sono, ou quando nos achamos apenas ligeiramente adormecidos, acodem-nos ideias que nos parecem excelentes e que se nos apagam da memória, apesar dos esforços que façamos para retê-las. Donde vêm essas ideias?
“Provêm da liberdade do Espírito que se emancipa e que, emancipado, goza de suas faculdades com maior amplitude. Também são, frequentemente, conselhos que outros Espíritos dão.” a) De que servem essas ideias e esses conselhos, desde que, por esquecê- -los, não os podemos aproveitar? “Essas ideias, em regra, mais dizem respeito ao mundo dos Espíritos do que ao mundo corpóreo. Pouco importa que comumente o Espírito as esqueça, quando unido ao corpo. Na ocasião oportuna, voltar-lhe-ão como inspiração de momento.”

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• Item 411 •


411: Estando desprendido da matéria e atuando como Espírito, sabe o Espírito encarnado qual será a época de sua morte?
“Acontece pressenti-la. Também sucede ter plena consciência dessa época, o que dá lugar a que, em estado de vigília, tenha a intuição do fato. Por isso é que algumas pessoas preveem com grande exatidão a data em que virão a morrer.”

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• Item 412 •


412: Pode a atividade do Espírito, durante o repouso, ou o sono corporal, fatigar o corpo?
“Pode, pois que o Espírito se acha preso ao corpo qual balão cativo ao poste. Assim como as sacudiduras do balão abalam o poste, a atividade do Espírito reage sobre o corpo e pode fatigá-lo.” Visitas espíritas entre pessoas vivas

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• Item 413 •


413: Do princípio da emancipação da alma parece decorrer que temos duas existências simultâneas: a do corpo, que nos permite a vida de relação ostensiva; e a da alma, que nos proporciona a vida de relação oculta. É assim?
“No estado de emancipação, prima a vida da alma. Contudo, não há, verdadeiramente, duas existências. São antes duas fases de uma só existência, porquanto o homem não vive duplamente.”

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• Item 414 •


414: Podem duas pessoas que se conhecem visitar-se durante o sono?
“Certo e muitos que julgam não se conhecerem costumam reunir-se e falar-se. Podes ter, sem que o suspeites, amigos em outro país. É tão habitual o fato de irdes encontrar-vos, durante o sono, com amigos e parentes, com os que conheceis e que vos podem ser úteis, que quase todas as noites fazeis essas visitas.”

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• Item 415 •


415: Que utilidade podem elas ter, se as olvidamos?
“De ordinário, ao despertardes, guardais a intuição desse fato, do qual se originam certas ideias que vos vêm espontaneamente, sem que possais explicar como vos acudiram. São ideias que adquiristes nessas confabulações.”

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• Item 416 •


416: Pode o homem, pela sua vontade, provocar as visitas espíritas? Pode, por exemplo, dizer, quando está para dormir: Quero esta noite encontrar-me em Espírito com fulano, quero falar-lhe para dizer isto?
“O que se dá é o seguinte: Adormecendo o homem, seu Espírito desperta e, muitas vezes, nada disposto se mostra a fazer o que o homem resolvera, porque a vida deste pouco interessa ao seu Espírito, uma vez desprendido da matéria. Isto com relação a homens já bastante elevados espiritualmente. Os outros passam de modo muito diverso a fase espiritual de sua existência terrena. Entregam-se às paixões que os escravizaram, ou se mantêm inativos. Pode, pois, suceder, tais sejam os motivos que a isso o induzem, que o Espírito vá visitar aqueles com quem deseja encontrar-se, mas não constitui razão, para que semelhante coisa se verifique, o simples fato de ele o querer quando desperto.”

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• Item 417 •


417: Podem Espíritos encarnados reunir-se em certo número e formar assembleias?
“Sem dúvida alguma. Os laços, antigos ou recentes, da amizade costumam reunir desse modo diversos Espíritos, que se sentem felizes de estar juntos.” Pelo termo antigos se devem entender os laços de amizade contraída em existências anteriores. Ao despertar, guardamos intuição das ideias que haurimos nesses colóquios, mas ficamos na ignorância da fonte donde promanaram.

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• Item 418 •


418: Uma pessoa que julgasse morto um de seus amigos, sem que tal fosse a realidade, poderia encontrar-se com ele, em Espírito, e verificar que continuava vivo? E, dado o fato, poderia, ao despertar, ter dele a intuição?
“Como Espírito, a pessoa que figuras pode ver o seu amigo e conhecer-lhe a sorte. Se lhe não houver sido imposto, por prova, crer na morte desse amigo, poderá ter um pressentimento da sua existência, como poderá tê-lo de sua morte.” Transmissão oculta do pensamento

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• Item 419 •


419: Que é o que dá causa a que uma ideia, a de uma descoberta, por exemplo, surja em muitos pontos ao mesmo tempo?
“Já dissemos que durante o sono os Espíritos se comunicam entre si. Ora bem! Quando se dá o despertar, o Espírito se lembra do que aprendeu e o homem julga ser isso um invento de sua autoria. Assim é que muitos podem simultaneamente descobrir a mesma coisa. Quando dizeis que uma ideia paira no ar, usais de uma figura de linguagem mais exata do que supondes. Todos, sem o suspeitarem, contribuem para propagá-la.” Desse modo, o nosso próprio Espírito revela muitas vezes, a outros Espíritos, mau grado nosso, o que constituía objeto de nossas preocupações no estado de vigília.

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• Item 420 •


420: Podem os Espíritos comunicar-se, estando completamente despertos os corpos?
“O Espírito não se acha encerrado no corpo como numa caixa; irradia por todos os lados. Segue-se que pode comunicar-se com outros Espíritos, mesmo em estado de vigília, se bem que mais dificilmente.”

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• Item 421 •


421: Como se explica que duas pessoas, perfeitamente acordadas, tenham instantaneamente a mesma ideia?
“São dois Espíritos simpáticos, que se comunicam e veem reciprocamente seus pensamentos respectivos, embora não estejam adormecidos os corpos.” Há, entre os Espíritos que se encontram, uma comunicação de pensamento, que dá causa a que duas pessoas se vejam e compreendam sem precisarem dos sinais ostensivos da linguagem. Poder-se-ia dizer que falam entre si a linguagem dos Espíritos. Letargia, catalepsia, mortes aparentes

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Letargia, catalepsia, mortes aparentes
• Item 422 •


422: Os letárgicos e os catalépticos, em geral, veem e ouvem o que em derredor se diz e faz, sem que possam exprimir que estão vendo e ouvindo. É pelos olhos e pelos ouvidos que têm essas percepções?
“Não; pelo Espírito. O Espírito tem consciência de si, mas não pode comunicar-se.” a) Por quê? “Porque a isso se opõe o estado do corpo. E esse estado especial dos órgãos vos prova que no homem há alguma coisa mais do que o corpo, pois que, então, o corpo já não funciona e, no entanto, o Espírito se mostra ativo.”

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• Item 423 •


423: Na letargia, pode o Espírito separar-se inteiramente do corpo, de modo a imprimir-lhe todas as aparências da morte e voltar depois a habitá-lo?
“Na letargia, o corpo não está morto, porquanto há funções que continuam a executar-se. Sua vitalidade se encontra em estado latente, como na crisálida, porém não aniquilada. Ora, enquanto o corpo vive, o Espírito se lhe acha ligado. Rompendo-se, por efeito da morte real e pela desagregação dos órgãos, os laços que prendem um ao outro, integral se torna a separação e o Espírito não volta mais ao seu envoltório. Desde que um homem, aparentemente morto, volve à vida, é que não era completa a morte.”

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• Item 424 •


424: Por meio de cuidados dispensados a tempo, podem reatar-se laços prestes a se desfazerem e restituir-se à vida um ser que definitivamente morreria se não fosse socorrido?
“Sem dúvida e todos os dias tendes a prova disso. O magnetismo, em tais casos, constitui, muitas vezes, poderoso meio de ação, porque restitui ao corpo o fluido vital que lhe falta para manter o funcionamento dos órgãos.” A letargia e a catalepsia derivam do mesmo princípio, que é a perda temporária da sensibilidade e do movimento, por uma causa fisiológica ainda inexplicada. Diferem uma da outra em que, na letargia, a suspensão das forças vitais é geral e dá ao corpo todas as aparências da morte; na catalepsia, fica localizada, podendo atingir uma parte mais ou menos extensa do corpo, de sorte a permitir que a inteligência se manifeste livremente, o que a torna inconfundível com a morte. A letargia é sempre natural; a catalepsia é por vezes espontânea, mas pode ser provocada e suprimida, artificialmente, pela ação magnética. Sonambulismo

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• Item 425 •


425: O sonambulismo natural tem alguma relação com os sonhos? Como explicá-lo?
“É um estado de independência do Espírito, mais completo do que no sonho, estado em que maior amplitude adquirem suas faculdades. A alma tem então percepções de que não dispõe no sonho, que é um estado de sonambulismo imperfeito. No sonambulismo, o Espírito está na posse plena de si mesmo. Os órgãos materiais, achando-se de certa forma em estado de catalepsia, deixam de receber as impressões exteriores. Esse estado se apresenta principalmente durante o sono, ocasião em que o Espírito pode abandonar provisoriamente o corpo, por se encontrar este gozando do repouso indispensável à matéria. Quando se produzem os fatos do sonambulismo, é que o Espírito, preocupado com uma coisa ou outra, se aplica a uma ação qualquer, para cuja prática necessita de utilizar-se do corpo. Serve-se então deste, como se serve de uma mesa ou de outro objeto material no fenômeno das manifestações físicas, ou mesmo como se utiliza da mão do médium nas comunicações escritas. Nos sonhos de que se tem consciência, os órgãos, inclusive os da memória, começam a despertar. Recebem imperfeitamente as impressões produzidas por objetos ou causas externas e as comunicam ao Espírito, que, então, também em repouso, só experimenta, do que lhe é transmitido, sensações confusas e, amiúde, desordenadas, sem nenhuma aparente razão de ser, mescladas que se apresentam de vagas recordações, quer da existência atual, quer de anteriores. Facilmente, portanto, se compreende por que os sonâmbulos nenhuma lembrança guardam do que se passou quando estiveram no estado sonambúlico e por que os sonhos, de que se conserva memória, as mais das vezes não têm sentido. Digo — as mais das vezes, porque também sucede serem a consequência de lembrança exata de acontecimentos de uma vida anterior e até, não raro, uma espécie de intuição do futuro.”

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• Item 426 •


426: O chamado sonambulismo magnético tem alguma relação com o sonambulismo natural?
“É a mesma coisa, com a só diferença de ser provocado.”

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• Item 427 •


427: De que natureza é o agente que se chama fluido magnético?
“Fluido vital, eletricidade animalizada, que são modificações do fluido universal.”

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• Item 428 •


428: Qual a causa da clarividência sonambúlica?
“Já o dissemos: É a alma que vê.”

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• Item 429 •


429: Como pode o sonâmbulo ver através dos corpos opacos?
“Não há corpos opacos senão para os vossos grosseiros órgãos. Já precedentemente não dissemos que a matéria nenhum obstáculo oferece ao Espírito, que livremente a atravessa? Frequentemente ouvis o sonâmbulo dizer que vê pela fronte, pelo punho etc., porque, achando-vos inteiramente presos à matéria, não compreendeis lhe seja possível ver sem o auxílio dos órgãos. Ele próprio, pelo desejo que manifestais, julga precisar dos órgãos. Se, porém, o deixásseis livre, compreenderia que vê por todas as partes do seu corpo, ou, melhor falando, que vê de fora do seu corpo.”

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• Item 430 •


430: Pois que a sua clarividência é a de sua alma ou de seu Espírito, por que o sonâmbulo não vê tudo e tantas vezes se engana?
“Primeiramente, aos Espíritos imperfeitos não é dado verem tudo e tudo saberem. Não ignoras que ainda partilham dos vossos erros e prejuízos. Depois, quando unidos à matéria, não gozam de todas as suas faculdades de Espírito. Deus outorgou ao homem a faculdade sonambúlica para fim útil e sério, não para que se informe do que não deva saber. Eis por que os sonâmbulos nem tudo podem dizer.”

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• Item 431 •


431: Qual a origem das ideias inatas do sonâmbulo e como pode falar com exatidão de coisas que ignora quando desperto, de coisas que estão mesmo acima de sua capacidade intelectual?
“É que o sonâmbulo possui mais conhecimentos do que os que lhe supões. Apenas, tais conhecimentos dormitam, porque, por demasiado imperfeito, seu invólucro corporal não lhe consente rememorá-lo. Que é, afinal, um sonâmbulo? Espírito, como nós, e que se encontra encarnado na matéria para cumprir a sua missão, despertando dessa letargia quando cai em estado sonambúlico. Já te temos dito, repetidamente, que vivemos muitas vezes. Esta mudança é que, ao sonâmbulo, como a qualquer Espírito, ocasiona a perda material do que haja aprendido em precedente existência. Entrando no estado que chamas crise, lembra-se do que sabe, mas sempre de modo incompleto. Sabe, mas não poderia dizer donde lhe vem o que sabe, nem como possui os conhecimentos que revela. Passada a crise, toda recordação se apaga e ele volve à obscuridade.” Mostra a experiência que os sonâmbulos também recebem comunicações de outros Espíritos, que lhes transmitem o que devam dizer e suprem à incapacidade que denotam. Isto se verifica principalmente nas prescrições médicas. O Espírito do sonâmbulo vê o mal, outro lhe indica o remédio. Essa dupla ação é às vezes patente e se revela, além disso, por estas expressões muito frequentes: dizem-me que diga, ou proíbem-me que diga tal coisa. Neste último caso, há sempre perigo em insistir-se por uma revelação negada, porque se dá azo a que intervenham Espíritos levianos, que falam de tudo sem escrúpulo e sem se importarem com a verdade.

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Sonambulismo
• Item 432 •


432: Como se explica a visão a distância em certos sonâmbulos?
“Durante o sono, a alma não se transporta? O mesmo se dá no sonambulismo.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Sonambulismo
• Item 433 •


433: O desenvolvimento maior ou menor da clarividência sonambúlica depende da organização física ou só da natureza do Espírito encarnado?
“De uma e outra. Há disposições físicas que permitem ao Espírito desprender-se mais ou menos facilmente da matéria.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Sonambulismo
• Item 434 •


434: As faculdades de que goza o sonâmbulo são as que tem o Espírito depois da morte?
“Somente até certo ponto, pois cumpre se atenda à influência da matéria a que ainda se acha ligado.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Sonambulismo
• Item 435 •


435: Pode o sonâmbulo ver os outros Espíritos?
“A maioria deles os vê muito bem, dependendo do grau e da natureza da lucidez de cada um. É muito comum, porém, não perceberem, no primeiro momento, que estão vendo Espíritos e os tomarem por seres corpóreos. Isso acontece principalmente aos que, nada conhecendo do Espiritismo, ainda não compreendem a essência dos Espíritos. O fato os espanta e fá-los supor que têm diante da vista seres terrenos.” O mesmo se dá com os que, tendo morrido, ainda se julgam vivos. Nenhuma alteração notando ao seu derredor e parecendo-lhes que os Espíritos têm corpos iguais aos nossos, tomam por corpos reais os corpos aparentes com que os mesmos Espíritos se lhes apresentam.

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Sonambulismo
• Item 436 •


436: O sonâmbulo que vê, a distância, vê do ponto em que se acha o seu corpo, ou do em que está sua alma?
“Por que esta pergunta, desde que sabes ser a alma quem vê e não o corpo?”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Sonambulismo
• Item 437 •


437: Posto que o que se dá, nos fenômenos sonambúlicos, é que a alma se transporta, como pode o sonâmbulo experimentar no corpo as sensações do frio e do calor existentes no lugar onde se acha sua alma, muitas vezes bem distante do seu invólucro?
“A alma, em tais casos, não tem deixado inteiramente o corpo; conserva-se-lhe presa pelo laço que os liga e que então desempenha o papel de condutor das sensações. Quando duas pessoas se comunicam de uma cidade para outra, por meio da eletricidade, esta constitui o laço que lhes liga os pensamentos. Daí vem que confabulam como se estivessem ao lado uma da outra.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Êxtase
• Item 438 •


438: O uso que um sonâmbulo faz da sua faculdade influi no estado do seu Espírito depois da morte?
“Muito, como o bom ou mau uso que o homem faz de todas as faculdades com que Deus o dotou.” Êxtase

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Êxtase
• Item 439 •


439: Que diferença há entre o êxtase e o sonambulismo?
“O êxtase é um sonambulismo mais apurado. A alma do extático ainda é mais independente.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Êxtase
• Item 440 •


440: O Espírito do extático penetra realmente nos mundos superiores?
“Vê esses mundos e compreende a felicidade dos que os habitam, donde lhe nasce o desejo de lá permanecer. Há, porém, mundos inacessíveis aos Espíritos que ainda não estão bastante purificados.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Êxtase
• Item 441 •


441: Quando o extático manifesta o desejo de deixar a Terra, fala sinceramente, não o retém o instinto de conservação?
“Isso depende do grau de purificação do Espírito. Se verifica que a sua futura situação será melhor do que a sua vida presente, esforça-se por desatar os laços que o prendem à Terra.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Êxtase
• Item 442 •


442: Se se deixasse o extático entregue a si mesmo, poderia sua alma abandonar definitivamente o corpo?
“Perfeitamente, poderia morrer. Por isso é que preciso se torna chamá-lo a voltar, apelando para tudo o que o prende a este mundo, fazendo-lhe sobretudo compreender que a maneira mais certa de não ficar lá, onde vê que seria feliz, consistiria em partir a cadeia que o tem preso ao planeta terreno.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Êxtase
• Item 443 •


443: Pretendendo que lhe é dado ver coisas que evidentemente são produto de uma imaginação que as crenças e prejuízos terrestres impressionaram, não será justo concluir-se que nem tudo o que o extático vê é real?
“O que o extático vê é real para ele, mas como seu Espírito se conserva sempre debaixo da influência das ideias terrenas, pode acontecer que veja a seu modo, ou melhor, que exprima o que vê numa linguagem moldada pelos preconceitos e ideias de que se acha imbuído, ou, então, pelos vossos preconceitos e ideias, a fim de ser mais bem compreendido. Neste sentido, principalmente, é que lhe sucede errar.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Êxtase
• Item 444 •


444: Que confiança se pode depositar nas revelações dos extáticos?
“O extático está sujeito a enganar-se muito frequentemente, sobretudo quando pretende penetrar no que deva continuar a ser mistério para o homem, porque, então, se deixa levar pela corrente das suas próprias ideias, ou se torna joguete de Espíritos mistificadores, que se aproveitam da sua exaltação para fasciná-lo.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Êxtase
• Item 445 •


445: Que deduções se podem tirar dos fenômenos do sonambulismo e do êxtase? Não constituirão uma espécie de iniciação na vida futura?
“A bem dizer, mediante esses fenômenos, o homem entrevê a vida passada e a vida futura. Estude-os e achará o aclaramento de mais de um mistério, que a sua razão inutilmente procura devassar.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Êxtase
• Item 446 •


446: Poderiam tais fenômenos adequar-se às ideias materialistas?
“Aquele que os estudar de boa-fé e sem prevenções não poderá ser materialista, nem ateu.” Dupla vista

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Dupla vista
• Item 447 •


447: O fenômeno a que se dá a designação de dupla vista tem alguma relação com o sonho e o sonambulismo?
“Tudo isso é uma só coisa. O que se chama dupla vista é ainda resultado da libertação do Espírito, sem que o corpo seja adormecido. A dupla vista ou segunda vista é a vista da alma.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Dupla vista
• Item 448 •


448: É permanente a segunda vista?
“A faculdade é, o exercício não. Nos mundos menos materiais do que o vosso, os Espíritos se desprendem mais facilmente e se põem em comunicação apenas pelo pensamento, sem que, todavia, fique abolida a linguagem articulada. Por isso mesmo, em tais mundos, a dupla vista é faculdade permanente, para a maioria de seus habitantes, cujo estado normal se pode comparar ao dos vossos sonâmbulos lúcidos. Essa também a razão por que esses Espíritos se vos manifestam com maior facilidade do que os encarnados em corpos mais grosseiros.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Dupla vista
• Item 449 •


449: A segunda vista aparece espontaneamente ou por efeito da vontade de quem a possui como faculdade?
“As mais das vezes é espontânea, porém, a vontade também desempenha com grande frequência importante papel no seu aparecimento. Toma, para exemplo, de umas dessas pessoas a quem se dá o nome de ledoras da buena-dicha, algumas das quais dispõem desta faculdade, e verás que é com o auxílio da própria vontade que se colocam no estado de terem a dupla vista e o que chamas visão.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Dupla vista
• Item 450 •


450: A dupla vista é suscetível de desenvolver-se pelo exercício?
“Sim, do trabalho sempre resulta o progresso e a dissipação do véu que encobre as coisas.” a) Esta faculdade tem qualquer ligação com a organização física? “Incontestavelmente, o organismo influi para a sua existência. Há organismos que lhe são refratários.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Dupla vista
• Item 451 •


451: Por que a segunda vista parece hereditária em algumas famílias?
“Por semelhança da organização, que se transmite como as outras qualidades físicas. Depois, a faculdade se desenvolve por uma espécie de educação, que também se transmite de um a outro.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Dupla vista
• Item 452 •


452: É exato que certas circunstâncias desenvolvem a segunda vista?
“A moléstia, a proximidade do perigo, uma grande comoção podem desenvolvê-la. O corpo, às vezes, vem a achar-se num estado especial que faculta ao Espírito ver o que não podeis ver com os olhos carnais.” Nas épocas de crises e de calamidades, as grandes emoções, todas as causas, enfim, de superexcitação do moral provocam não raro o desenvolvimento da dupla vista. Parece que a Providência, quando um perigo nos ameaça, nos dá o meio de conjurá-lo. Todas as seitas e partidos perseguidos oferecem múltiplos exemplos desse fato.

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Dupla vista
• Item 453 •


453: As pessoas dotadas de dupla vista sempre têm consciência de que a possuem?
“Nem sempre. Consideram isso coisa perfeitamente natural e muitos creem que, se cada um observasse o que se passa consigo, todos verificariam que são como eles.”

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Dupla vista
• Item 454 •


454: Poder-se-ia atribuir a uma espécie de segunda vista a perspicácia de algumas pessoas que, sem nada apresentarem de extraordinário, apreciam as coisas com mais precisão do que outras?
“É sempre a alma a irradiar mais livremente e a apreciar melhor do que sob o véu da matéria.” a) Pode esta faculdade, em alguns casos, dar a presciência das coisas? “Pode. Também dá os pressentimentos, pois que muitos são os graus em que ela existe, sendo possível que num mesmo indivíduo exista em todos os graus, ou em alguns somente.” Resumo teórico do sonambulismo, do êxtase e da dupla vista

Parte Segunda • Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos • Resumo teórico do sonambulismo, do êxtase e da dupla vista
• Item 455 •


455: Resumo teórico do sonambulismo, do êxtase e da dupla vista
Os fenômenos do sonambulismo natural se produzem espontaneamente e independem de qualquer causa exterior conhecida. Em certas pessoas dotadas de especial organização, porém, podem ser provocados artificialmente, pela ação do agente magnético. O estado que se designa pelo nome de sonambulismo magnético apenas difere do sonambulismo natural em que um é provocado, enquanto o outro é espontâneo. O sonambulismo natural constitui fato notório, que ninguém mais se lembra de pôr em dúvida, não obstante o aspecto maravilhoso dos fenômenos a que dá lugar. Por que seria então mais extraordinário ou irracional o sonambulismo magnético? Apenas por produzir-se artificialmente, como tantas outras coisas? Os charlatães o exploram, dizem. Razão a mais para que não lhes seja deixado nas mãos. Quando a Ciência se houver apropriado dele, muito menos crédito terão os charlatães junto às massas populares. Enquanto isso não se verifica, como o sonambulismo, natural ou artificial, é um fato, e como contra fatos não há raciocínio possível, vai ele ganhando terreno, apesar da má vontade de alguns, no seio da própria Ciência, no qual penetra por uma imensidade de portinhas, em vez de entrar pela porta larga. Quando lá estiver totalmente, terão que aceitá-lo sem contextação. Para o Espiritismo, o sonambulismo é mais do que um fenômeno psicológico, é uma luz projetada sobre a psicologia. É aí que se pode estudar a alma, porque é onde esta se mostra a descoberto. Ora, um dos fenômenos que a caracterizam é o da clarividência independente dos órgãos ordinários da vista. Fundam-se os que contestam este fato em que o sonâmbulo nem sempre vê, e à vontade do experimentador, como com os olhos. Será de admirar que difiram os efeitos, quando diferentes são os meios? Será racional que se pretenda obter os mesmos efeitos, quando há e quando não há o instrumento? A alma tem suas propriedades, como os olhos têm as suas. Cumpre julgá-las em si mesmas e não por analogia. De uma causa única se originam a clarividência do sonâmbulo magnético e a do sonâmbulo natural. É um atributo da alma, uma faculdade inerente a todas as partes do ser incorpóreo que existe em nós e cujos limites não são outros senão os assinados à própria alma. O sonâmbulo vê em todos os lugares em que sua alma possa transportar-se, qualquer que seja a longitude. No caso de visão a distância, o sonâmbulo não vê as coisas de onde está o seu corpo, como por meio de um telescópio. Vê as presentes, como se se achasse no lugar onde elas existem, porque sua alma, em realidade, lá está. Por isso é que seu corpo fica como que aniquilado e privado de sensação, até que a alma volte a habitá-lo novamente. Essa separação parcial da alma e do corpo constitui um estado anormal, suscetível de duração mais ou menos longa, porém, não indefinida. Daí a fadiga que o corpo experimenta após certo tempo, mormente quando aquela se entrega a um trabalho ativo. A vista da alma ou do Espírito não é circunscrita e não tem sede determinada. Eis por que os sonâmbulos não lhe podem marcar órgão especial. Veem porque veem, sem saberem o motivo nem o modo, uma vez que, para eles, na condição de Espíritos, a vista carece de foco próprio. Se se reportam ao corpo, esse foco lhes parece estar nos centros em que maior é a atividade vital, principalmente no cérebro, na região do epigástrio, ou no órgão que considerem o ponto de ligação mais forte entre o Espírito e o corpo. O poder da lucidez sonambúlica não é ilimitado. O Espírito, mesmo quando completamente livre, tem restringidos seus conhecimentos e faculdades, conforme o grau de perfeição que haja alcançado. Ainda mais restringidos os tem quando ligado à matéria, a cuja influência está sujeito. É o que motiva não ser universal, nem infalível, a clarividência sonambúlica. E tanto menos se pode contar com a sua infalibilidade, quanto mais desviada seja do fim visado pela natureza e transformada em objeto de curiosidade e de experimentação. No estado de desprendimento em que fica colocado, o Espírito do sonâmbulo entra em comunicação mais fácil com os outros Espíritos encarnados ou não encarnados, comunicação que se estabelece pelo contato dos fluidos, que compõem os perispíritos e servem de transmissão ao pensamento, como o fio elétrico. O sonâmbulo não precisa, portanto, que se lhe exprimam os pensamentos por meio da palavra articulada. Ele os sente e adivinha. É o que o torna eminentemente impressionável e sujeito às influências da atmosfera moral que o envolva. Essa também a razão por que uma assistência muito numerosa e a presença de curiosos mais ou menos malevolentes lhe prejudicam de modo essencial o desenvolvimento das faculdades que, por assim dizer, se contraem, só se desdobrando com toda a liberdade num meio íntimo ou simpático. A presença de pessoas mal-intencionadas ou antipáticas lhe produz efeito idêntico ao do contato da mão na sensitiva. O sonâmbulo vê ao mesmo tempo o seu próprio Espírito e o seu corpo, os quais constituem, por assim dizer, dois seres que lhe representam a dupla existência corpórea e espiritual, existências que, entretanto, se confundem, mediante os laços que as unem. Nem sempre o sonâmbulo se apercebe de tal situação e essa dualidade faz que muitas vezes fale de si, como se falasse de outra pessoa. É que ora é o ser corpóreo que fala ao ser espiritual, ora é este que fala àquele. Em cada uma de suas existências corporais, o Espírito adquire um acréscimo de conhecimentos e de experiência. Esquece-os parcialmente, quando encarnado em matéria por demais grosseira, porém, deles se recorda como Espírito. Assim é que certos sonâmbulos revelam conhecimentos acima do grau da instrução que possuem e mesmo superiores às suas aparentes capacidades intelectuais. Portanto, da inferioridade intelectual e científica do sonâmbulo, quando desperto, nada se pode inferir com relação aos conhecimentos que porventura revele no estado de lucidez. Conforme as circunstâncias e o fim que se tenha em vista, ele os pode haurir da sua própria experiência, da sua clarividência relativa às coisas presentes, ou dos conselhos que receba de outros Espíritos. Podendo o seu próprio Espírito ser mais ou menos adiantado, possível lhe é dizer coisas mais ou menos certas. Pelos fenômenos do sonambulismo, quer natural, quer magnético, a Providência nos dá a prova irrecusável da existência e da independência da alma e nos faz assistir ao sublime espetáculo da sua emancipação. Abre-nos, dessa maneira, o livro do nosso destino. Quando o sonâmbulo descreve o que se passa a distância, é evidente que vê, mas não com os olhos do corpo. Vê-se a si mesmo e se sente transportado ao lugar onde vê o que descreve. Lá se acha, pois, alguma coisa dele e, não podendo essa alguma coisa ser o seu corpo, necessariamente é sua alma ou Espírito. Enquanto o homem se perde nas sutilezas de uma metafísica abstrata e ininteligível, em busca das causas da nossa existência moral, Deus cotidianamente nos põe sob os olhos e ao alcance da mão os mais simples e patentes meios de estudarmos a psicologia experimental. O êxtase é o estado em que a independência da alma, com relação ao corpo, se manifesta de modo mais sensível e se torna, de certa forma, palpável. No sonho e no sonambulismo, o Espírito anda em giro pelos mundos terrestres. No êxtase, penetra em um mundo desconhecido, o dos Espíritos etéreos, com os quais entra em comunicação, sem que, todavia, lhe seja lícito ultrapassar certos limites, porque, se os transpusesse, totalmente se partiriam os laços que o prendem ao corpo. Cerca-o então resplendente e desusado fulgor, inebriam-no harmonias que na Terra se desconhecem, indefinível bem-estar o invade: goza antecipadamente da beatitude celeste e bem se pode dizer que pousa um pé no limiar da eternidade. No estado de êxtase, o aniquilamento do corpo é quase completo. Fica-lhe somente, pode-se dizer, a vida orgânica. Sente-se que a alma se lhe acha presa unicamente por um fio, que mais um pequenino esforço quebraria sem remissão. Nesse estado, desaparecem todos os pensamentos terrestres, cedendo lugar ao sentimento apurado, que constitui a essência mesma do nosso ser imaterial. Inteiramente entregue a tão sublime contemplação, o extático encara a vida apenas como paragem momentânea. Considera os bens e os males, as alegrias grosseiras e as misérias deste mundo quais incidentes fúteis de uma viagem, cujo termo tem a dita de avistar. Dá-se com os extáticos o que se dá com os sonâmbulos: mais ou menos perfeita podem ter a lucidez e o Espírito mais ou menos apto a conhecer e compreender as coisas, conforme seja mais ou menos elevado. Muitas vezes, porém, há neles mais excitação do que verdadeira lucidez, ou, melhor, muitas vezes a exaltação lhes prejudica a lucidez. Daí o serem, frequentemente, suas revelações um misto de verdades e erros, de coisas grandiosas e coisas absurdas, até ridículas. Dessa exaltação, que é sempre uma causa de fraqueza, quando o indivíduo não sabe reprimi-la, Espíritos inferiores costumam aproveitar-se para dominar o extático, tomando, com tal intuito, aos seus olhos, aparências que mais o aferram às ideias que nutre no estado de vigília. Há nisso um escolho, mas nem todos são assim. Cabe-nos tudo julgar friamente e pesar-lhes as revelações na balança da razão. A emancipação da alma se verifica às vezes no estado de vigília e produz o fenômeno conhecido pelo nome de segunda vista ou dupla vista, que é a faculdade graças à qual quem a possui vê, ouve e sente além dos limites dos sentidos humanos. Percebe o que exista até onde estende a alma a sua ação. Vê, por assim dizer, através da vista ordinária e como por uma espécie de miragem. No momento em que o fenômeno da segunda vista se produz, o estado físico do indivíduo se acha sensivelmente modificado. O olhar apresenta alguma coisa de vago. Ele olha sem ver. Toda a sua fisionomia reflete uma como exaltação. Nota-se que os órgãos visuais se conservam alheios ao fenômeno, pelo fato de a visão persistir, malgrado a oclusão dos olhos. Aos dotados desta faculdade ela se afigura tão natural, como a que todos temos de ver. Consideram-na um atributo de seus próprios seres, que em nada lhes parecem excepcionais. De ordinário, o esquecimento se segue a essa lucidez passageira, cuja lembrança, tornando-se cada vez mais vaga, acaba por desaparecer, como a de um sonho. O poder da vista dupla varia, indo desde a sensação confusa até a percepção clara e nítida das coisas presentes ou ausentes. Quando rudimentar, confere a certas pessoas o tato, a perspicácia, uma certa segurança nos atos, a que se pode dar o qualificativo de precisão de golpe de vista moral. Um pouco desenvolvida, desperta os pressentimentos. Mais desenvolvida, mostra os acontecimentos que deram ou estão para dar-se. O sonambulismo natural e artificial, o êxtase e a dupla vista são efeitos vários, ou de modalidades diversas, de uma mesma causa. Esses fenômenos, como os sonhos, estão na ordem da natureza. Tal a razão por que hão existido em todos os tempos. A História mostra que foram sempre conhecidos e até explorados desde a mais remota antiguidade e neles se nos depara a explicação de uma imensidade de fatos que os preconceitos fizeram fossem tidos por sobrenaturais.

Da lei do progresso

Parte Terceira • Das leis morais • Estado de natureza
• Item 776 •


776: Serão coisas idênticas o estado de natureza e a lei natural?
“Não, o estado de natureza é o estado primitivo. A civilização é incompatível com o estado de natureza, ao passo que a lei natural contribui para o progresso da Humanidade.” O estado de natureza é a infância da Humanidade e o ponto de partida do seu desenvolvimento intelectual e moral. Sendo perfectível e trazendo em si o gérmen do seu aperfeiçoamento, o homem não foi destinado a viver perpetuamente no estado de natureza, como não o foi a viver eternamente na infância. Aquele estado é transitório para o homem, que dele sai por virtude do progresso e da civilização. A lei natural, ao contrário, rege a Humanidade inteira e o homem se melhora à medida que melhor a compreende e pratica.

Parte Terceira • Das leis morais • Estado de natureza
• Item 777 •


777: Tendo o homem, no estado de natureza, menos necessidades, isento se acha das tribulações que para si mesmo cria, quando num estado de maior adiantamento. Diante disso, que se deve pensar da opinião dos que consideram aquele estado como o da mais perfeita felicidade na Terra?
“Que queres! é a felicidade do bruto. Há pessoas que não compreendem outra. É ser feliz à maneira dos animais. As crianças também são mais felizes do que os homens feitos.”

Parte Terceira • Das leis morais • Marcha do progresso
• Item 778 •


778: Pode o homem retrogradar para o estado de natureza?
“Não, o homem tem que progredir incessantemente e não pode volver ao estado de infância. Desde que progride, é porque Deus assim o quer. Pensar que possa retrogradar à sua primitiva condição fora negar a lei do progresso.” Marcha do progresso

Parte Terceira • Das leis morais • Marcha do progresso
• Item 779 •


779: A força para progredir, haure-a o homem em si mesmo, ou o progresso é apenas fruto de um ensinamento?
“O homem se desenvolve por si mesmo, naturalmente, mas nem todos progridem simultaneamente e do mesmo modo. Dá-se então que os mais adiantados auxiliam o progresso dos outros, por meio do contato social.”

Parte Terceira • Das leis morais • Marcha do progresso
• Item 780 •


780: O progresso moral acompanha sempre o progresso intelectual?
“Decorre deste, mas nem sempre o segue imediatamente.” (192 a
365) a) Como pode o progresso intelectual engendrar progresso moral? “Fazendo compreensíveis o bem e o mal. O homem, desde então, pode escolher. O desenvolvimento do livre-arbítrio acompanha o da inteligência e aumenta a responsabilidade dos atos.” b) Como é, nesse caso, que, muitas vezes, sucede serem os povos mais instruídos os mais pervertidos também? “O progresso completo constitui o objetivo. Os povos, porém, como os indivíduos, só passo a passo o atingem. Enquanto não se lhes haja desenvolvido o senso moral, pode mesmo acontecer que se sirvam da inteligência para a prática do mal. O moral e a inteligência são duas forças que só com o tempo chegam a equilibrar- -se.” (365 a 751)

Parte Terceira • Das leis morais • Marcha do progresso
• Item 781 •


781: Tem o homem o poder de paralisar a marcha do progresso?
“Não, mas tem, às vezes, o de embaraçá-la.” a) Que se deve pensar dos que tentam deter a marcha do progresso e fazer que a Humanidade retrograde? “Pobres seres, que Deus castigará! Serão levados de roldão pela torrente que procuram deter.” Sendo o progresso uma condição da natureza humana, não está no poder do homem opor-se-lhe. É uma força viva, cuja ação pode ser retardada, porém não anulada, por leis humanas más. Quando estas se tornam incompatíveis com ele, despedaça-as juntamente com os que se esforcem por mantê-las. Assim será, até que o homem tenha posto suas leis em concordância com a Justiça divina, que quer que todos participem do bem e não a vigência de leis feitas pelo forte em detrimento do fraco.

Parte Terceira • Das leis morais • Marcha do progresso
• Item 782 •


782: Não há homens que de boa-fé obstam ao progresso, acreditando favorecê-lo, porque, do ponto de vista em que se colocam, o veem onde ele não existe?
“Assemelham-se a pequeninas pedras que, colocadas debaixo da roda de uma grande viatura, não a impedem de avançar.”

Parte Terceira • Das leis morais • Marcha do progresso
• Item 783 •


783: Segue sempre marcha progressiva e lenta o aperfeiçoamento da Humanidade?
“Há o progresso regular e lento, que resulta da força das coisas. Quando, porém, um povo não progride tão depressa quanto devera, Deus o sujeita, de tempos a tempos, a um abalo físico ou moral que o transforma.” O homem não pode conservar-se indefinidamente na ignorância, porque tem de atingir a finalidade que a Providência lhe assinalou. Ele se instrui pela força das coisas. As revoluções morais, como as revoluções sociais, se infiltram nas ideias pouco a pouco; germinam durante séculos; depois, irrompem subitamente e produzem o desmoronamento do carunchoso edifício do passado, que deixou de estar em harmonia com as necessidades novas e com as novas aspirações. Nessas comoções, o homem quase nunca percebe senão a desordem e a confusão momentâneas que o ferem nos seus interesses materiais. Aquele, porém, que eleva o pensamento acima da sua própria personalidade, admira os desígnios da Providência, que do mal faz sair o bem. São a procela, a tempestade que saneiam a atmosfera, depois de a terem agitado violentamente.

Parte Terceira • Das leis morais • Marcha do progresso
• Item 784 •


784: Bastante grande é a perversidade do homem. Não parece que, pelo menos do ponto de vista moral, ele, em vez de avançar, caminha aos recuos?
“Enganas-te. Observa bem o conjunto e verás que o homem se adianta, pois que melhor compreende o que é mal, e vai dia a dia reprimindo os abusos. Faz-se mister que o mal chegue ao excesso, para tornar compreensível a necessidade do bem e das reformas.”

Parte Terceira • Das leis morais • Marcha do progresso
• Item 785 •


785: Qual o maior obstáculo ao progresso?
“O orgulho e o egoísmo. Refiro-me ao progresso moral, porquanto o intelectual se efetua sempre. À primeira vista, parece mesmo que o progresso intelectual reduplica a atividade daqueles vícios, desenvolvendo a ambição e o gosto das riquezas, que, a seu turno, incitam o homem a empreender pesquisas que lhe esclarecem o Espírito. Assim é que tudo se prende, no mundo moral, como no mundo físico, e que do próprio mal pode nascer o bem. Curta, porém, é a duração desse estado de coisas, que mudará à proporção que o homem compreender melhor que, além da que o gozo dos bens terrenos proporciona, uma felicidade existe maior e infinitamente mais duradoura.” (Vide: “Egoísmo”, cap. XII.) Há duas espécies de progresso, que uma a outra se prestam mútuo apoio, mas que, no entanto, não marcham lado a lado: o progresso intelectual e o progresso moral. Entre os povos civilizados, o primeiro tem recebido, no correr deste século, todos os incentivos. Por isso mesmo atingiu um grau a que ainda não chegara antes da época atual. Muito falta para que o segundo se ache no mesmo nível. Entretanto, comparando-se os costumes sociais de hoje com os de alguns séculos atrás, só um cego negaria o progresso realizado. Ora, sendo assim, por que haveria essa marcha ascendente de parar, com relação, de preferência, ao moral, do que com relação ao intelectual? Por que será impossível que entre o século XIX e o século XXIV haja, a esse respeito, tanta diferença quanta entre o século XIV e o século XIX? Duvidar fora pretender que a Humanidade está no apogeu da perfeição, o que seria absurdo, ou que ela não é perfectível moralmente, o que a experiência desmente. Povos degenerados

Parte Terceira • Das leis morais • Povos degenerados
• Item 786 •


786: Mostra-nos a História que muitos povos, depois de abalos que os revolveram profundamente, recaíram na barbaria. Onde, neste caso, o progresso?
“Quando tua casa ameaça ruína, mandas demoli-la e constróis outra mais sólida e mais cômoda. Mas, enquanto esta não se apronta, há perturbação e confusão na tua morada. Compreende mais o seguinte: eras pobre e habitavas um casebre; tornando-te rico, deixaste-o, para habitar um palácio. Então, um pobre diabo, como eras antes, vem tomar o lugar que ocupavas e fica muito contente, porque estava sem ter onde se abrigar. Pois bem! aprende que os Espíritos que, encarnados, constituem o povo degenerado não são os que o constituíam ao tempo do seu esplendor. Os de então, tendo- -se adiantado, passaram para habitações mais perfeitas e progrediram, enquanto os outros, menos adiantados, tomaram o lugar que ficara vago e que também, a seu turno, terão um dia que deixar.”

Parte Terceira • Das leis morais • Povos degenerados
• Item 787 •


787: Não há raças rebeldes, por sua natureza, ao progresso?
“Há, mas vão aniquilando-se corporalmente, todos os dias.” a) Qual será a sorte futura das almas que animam essas raças? “Chegarão, como todas as demais, à perfeição, passando por outras existências. Deus a ninguém deserda.” b) Assim, pode dar-se que os homens mais civilizados tenham sido selvagens e antropófagos? “Tu mesmo o foste mais de uma vez, antes de seres o que és.”

Parte Terceira • Das leis morais • Povos degenerados
• Item 788 •


788: Os povos são individualidades coletivas que, como os indivíduos, passam pela infância, pela idade da madureza e pela decrepitude. Esta verdade, que a História comprova, não será de molde a fazer supor que os povos mais adiantados deste século terão seu declínio e sua extinção, como os da Antiguidade?
“Os povos, que apenas vivem a vida do corpo, aqueles cuja grandeza unicamente assenta na força e na extensão territorial, nascem, crescem e morrem, porque a força de um povo se exaure, como a de um homem. Aqueles, cujas leis egoísticas obstam ao progresso das luzes e da caridade, morrem, porque a luz mata as trevas e a caridade mata o egoísmo. Mas, para os povos, como para os indivíduos, há a vida da alma. Aqueles, cujas leis se harmonizam com as leis eternas do Criador, viverão e servirão de farol aos outros povos.”

Parte Terceira • Das leis morais • Povos degenerados
• Item 789 •


789: O progresso fará que todos os povos da Terra se achem um dia reunidos, formando uma só nação?
“Uma nação única, não; seria impossível, visto que da diversidade dos climas se originam costumes e necessidades diferentes, que constituem as nacionalidades, tornando indispensáveis sempre leis apropriadas a esses costumes e necessidades. A caridade, porém, desconhece latitudes e não distingue a cor dos homens. Quando, por toda parte, a Lei de Deus servir de base à lei humana, os povos praticarão entre si a caridade, como os indivíduos. Então, viverão felizes e em paz, porque nenhum cuidará de causar dano ao seu vizinho, nem de viver a expensas dele.” A Humanidade progride, por meio dos indivíduos que pouco a pouco se melhoram e instruem. Quando estes preponderam pelo número, tomam a dianteira e arrastam os outros. De tempos a tempos, surgem no seio dela homens de gênio que lhe dão um impulso; vêm depois, como instrumentos de Deus, os que têm autoridade e, nalguns anos, fazem-na adiantar-se de muitos séculos. O progresso dos povos também realça a justiça da reencarnação. Louváveis esforços empregam os homens de bem para conseguir que uma nação se adiante, moral e intelectualmente. Transformada, a nação será mais ditosa neste mundo e no outro, concebe-se, mas, durante a sua marcha lenta através dos séculos, milhares de indivíduos morrem todos os dias. Qual a sorte de todos os que sucumbem ao longo do trajeto? Privá-los-á, a sua relativa inferioridade, da felicidade reservada aos que chegam por último? Ou também relativa será a felicidade que lhes cabe? Não é possível que a Justiça divina haja consagrado semelhante injustiça. Com a pluralidade das existências, é igual para todos o direito à felicidade, porque ninguém fica privado do progresso. Podendo, os que viveram ao tempo da barbaria, voltar, na época da civilização, a viver no seio do mesmo povo, ou de outro, é claro que todos tiram proveito da marcha ascensional. Outra dificuldade, no entanto, apresenta aqui o sistema da unicidade das existências. Segundo este sistema, a alma é criada no momento em que nasce o ser humano. Então, se um homem é mais adiantado do que outro, é que Deus criou para ele uma alma mais adiantada. Por que esse favor? Que merecimento tem esse homem, que não viveu mais do que outro, que talvez haja vivido menos, para ser dotado de uma alma superior? Esta, porém, não é a dificuldade principal. Uma nação passa, em mil anos, da barbaria à civilização. Se os homens vivessem um milênio, conceber-se-ia que, nesse período milenar, tivessem tempo de progredir. Diariamente, porém, morrem criaturas em todas as idades; incessantemente se renovam na face do planeta, de tal sorte que todos os dias aparece uma multidão delas e outra desaparece. Ao cabo de mil anos, já não há naquela nação vestígio de seus antigos habitantes. Contudo, de bárbara, que era, ela se tornou policiada. Que foi o que progrediu? Foram os indivíduos outrora bárbaros? mas esses morreram há muito tempo. Teriam sido os recém-chegados? mas, se suas almas foram criadas no momento em que eles nasceram, essas almas não existiam na época da barbaria e forçoso será então admitir-se que os esforços que se despendem para civilizar um povo têm o poder, não de melhorar almas imperfeitas, porém de fazer que Deus crie almas mais perfeitas. Comparemos esta teoria do progresso com a que os Espíritos apresentaram. As almas vindas no tempo da civilização tiveram sua infância, como todas as outras, mas já tinham vivido antes e vêm adiantadas por efeito do progresso realizado anteriormente. Vêm atraídas por um meio que lhes é simpático e que se acha em relação com o estado em que atualmente se encontram. De sorte que, os cuidados dispensados à civilização de um povo não têm como consequência fazer que, de futuro, se criem almas mais perfeitas; têm, sim, o de atrair as que já progrediram, quer tenham vivido no seio do povo que se figura, ao tempo da sua barbaria, quer venham de outra parte. Aqui se nos depara igualmente a chave do progresso da Humanidade inteira. Quando todos os povos estiverem no mesmo nível, no tocante ao sentimento do bem, a Terra será ponto de reunião exclusivamente de bons Espíritos, que viverão fraternalmente unidos. Os maus, sentindo-se aí repelidos e deslocados, irão procurar, em mundos inferiores, o meio que lhes convém, até que sejam dignos de volver ao nosso, então transformado. Da teoria vulgar ainda resulta que os trabalhos de melhoria social só às gerações presentes e futuras aproveitam, sendo de resultados nulos para as gerações passadas, que cometeram o erro de vir muito cedo e que ficam sendo o que podem ser, sobrecarregadas com o peso de seus atos de barbaria. Segundo a Doutrina dos Espíritos, os progressos ulteriores aproveitam igualmente às gerações pretéritas, que voltam a viver em melhores condições e podem assim aperfeiçoar-se no foco da civilização. (222) Civilização

Parte Terceira • Das leis morais • Civilização
• Item 790 •


790: É um progresso a civilização ou, como o entendem alguns filósofos, uma decadência da Humanidade?
“Progresso incompleto. O homem não passa subitamente da infância à madureza.” a) Será racional condenar-se a civilização? “Condenai antes os que dela abusam e não a obra de Deus.”

Parte Terceira • Das leis morais • Civilização
• Item 791 •


791: Apurar-se-á algum dia a civilização, de modo a fazer que desapareçam os males que haja produzido?
“Sim, quando o moral estiver tão desenvolvido quanto a inteligência. O fruto não pode surgir antes da flor.”

Parte Terceira • Das leis morais • Civilização
• Item 792 •


792: Por que não efetua a civilização, imediatamente, todo o bem que poderia produzir?
“Porque os homens ainda não estão aptos nem dispostos a alcançá-lo.” a) Não será também porque, criando novas necessidades, suscita paixões novas? “É, e ainda porque não progridem simultaneamente todas as faculdades do Espírito. Tempo é preciso para tudo. De uma civilização incompleta não podeis esperar frutos perfeitos.” (751 a 780)

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• Item 793 •


793: Por que indícios se pode reconhecer uma civilização completa?
“Reconhecê-la-eis pelo desenvolvimento moral. Credes que estais muito adiantados, porque tendes feito grandes descobertas e obtido maravilhosas invenções; porque vos alojais e vestis melhor do que os selvagens. Todavia, não tereis verdadeiramente o direito de dizer-vos civilizados, senão quando de vossa sociedade houverdes banido os vícios que a desonram e quando viverdes como irmãos, praticando a caridade cristã. Até então, sereis apenas povos esclarecidos, que hão percorrido a primeira fase da civilização.” A civilização, como todas as coisas, apresenta gradações diversas. Uma civilização incompleta é um estado transitório, que gera males especiais, desconhecidos do homem no estado primitivo. Nem por isso, entretanto, constitui menos um progresso natural, necessário, que traz consigo o remédio para o mal que causa. À medida que a civilização se aperfeiçoa, faz cessar alguns dos males que gerou, males que desaparecerão todos com o progresso moral. De duas nações que tenham chegado ao ápice da escala social, somente pode considerar-se a mais civilizada, na legítima acepção do termo, aquela em que exista menos egoísmo, menos cobiça e menos orgulho; em que os hábitos sejam mais intelectuais e morais do que materiais; em que a inteligência possa desenvolver-se com maior liberdade; em que haja mais bondade, boa-fé, benevolência e generosidade recíprocas; em que menos enraizados se mostrem os preconceitos de casta e de nascimento, por isso que tais preconceitos são incompatíveis com o verdadeiro amor do próximo; em que as leis nenhum privilégio consagrem e sejam as mesmas, assim para o último, como para o primeiro; em que com menos parcialidade se exerça a justiça; em que o fraco encontre sempre amparo contra o forte; em que a vida do homem, suas crenças e opiniões sejam melhormente respeitadas; em que exista menor número de desgraçados; enfim, em que todo homem de boa vontade esteja certo de lhe não faltar o necessário. Progresso da legislação humana

Parte Terceira • Das leis morais • Progresso da legislação humana
• Item 794 •


794: Poderia a sociedade reger-se unicamente pelas leis naturais, sem o concurso das leis humanas?
“Poderia, se todos as compreendessem bem. Se os homens as quisessem praticar, elas bastariam. A sociedade, porém, tem suas exigências. São-lhe necessárias leis especiais.”

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• Item 795 •


795: Qual a causa da instabilidade das leis humanas?
“Nas épocas de barbaria, são os mais fortes que fazem as leis e eles as fizeram para si. À proporção que os homens foram compreendendo melhor a justiça, indispensável se tornou a modificação delas. Quanto mais se aproximam da vera justiça, tanto menos instáveis são as leis humanas, isto é, tanto mais estáveis se vão tornando, conforme vão sendo feitas para todos e se identificam com a lei natural.” A civilização criou necessidades novas para o homem, necessidades relativas à posição social que ele ocupe. Tem-se então que regular, por meio de leis humanas, os direitos e deveres dessa posição. Influenciado, porém, pelas suas paixões, o homem não raro há criado direitos e deveres imaginários, que a lei natural condena e que os povos riscam de seus códigos à medida que progridem. A lei natural é imutável e a mesma para todos; a lei humana é variável e progressiva. Na infância das sociedades, esta só pôde consagrar o direito do mais forte.

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• Item 796 •


796: No estado atual da sociedade, a severidade das leis penais não constitui uma necessidade?
“Uma sociedade depravada certamente precisa de leis severas. Infelizmente, essas leis mais se destinam a punir o mal depois de feito, do que a lhe secar a fonte. Só a educação poderá reformar os homens, que, então, não precisarão mais de leis tão rigorosas.”

Parte Terceira • Das leis morais • Influência do Espiritismo no progresso
• Item 797 •


797: Como poderá o homem ser levado a reformar suas leis?
“Isso ocorre naturalmente, pela força mesma das coisas e da influência das pessoas que o guiam na senda do progresso. Muitas ele já reformou e muitas outras reformará. Espera!” Influência do Espiritismo no progresso

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• Item 798 •


798: O Espiritismo se tornará crença comum, ou ficará sendo partilhado, como crença, apenas por algumas pessoas?
“Certamente que se tornará crença geral e marcará nova era na história da Humanidade, porque está na natureza e chegou o tempo em que ocupará lugar entre os conhecimentos humanos. Terá, no entanto, que sustentar grandes lutas, mais contra o interesse, do que contra a convicção, porquanto não há como dissimular a existência de pessoas interessadas em combatê-lo, umas por amor-próprio, outras por causas inteiramente materiais. Porém, como virão a ficar insulados, seus contraditores se sentirão forçados a pensar como os demais, sob pena de se tornarem ridículos.” As ideias só com o tempo se transformam; nunca de súbito. De geração em geração, elas se enfraquecem e acabam por desaparecer, paulatinamente, com os que as professavam, os quais vêm a ser substituídos por outros indivíduos imbuídos de novos princípios, como sucede com as ideias políticas. Vede o paganismo. Não há hoje mais quem professe as ideias religiosas dos tempos pagãos. Todavia, muitos séculos após o advento do Cristianismo, delas ainda restavam vestígios, que somente a completa renovação das raças conseguiu apagar. Assim será com o Espiritismo. Ele progride muito; mas, durante duas ou três gerações, ainda haverá um fermento de incredulidade, que unicamente o tempo aniquilará. Sua marcha, porém, será mais célere que a do Cristianismo, porque o próprio Cristianismo é quem lhe abre o caminho e serve de apoio. O Cristianismo tinha que destruir; o Espiritismo só tem que edificar.

Parte Terceira • Das leis morais • Influência do Espiritismo no progresso
• Item 799 •


799: De que maneira pode o Espiritismo contribuir para o progresso?
“Destruindo o materialismo, que é uma das chagas da sociedade, ele faz que os homens compreendam onde se encontram seus verdadeiros interesses. Deixando a vida futura de estar velada pela dúvida, o homem perceberá melhor que, por meio do presente, lhe é dado preparar o seu futuro. Abolindo os prejuízos de seitas, castas e cores, ensina aos homens a grande solidariedade que os há de unir como irmãos.”

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• Item 800 •


800: Não será de temer que o Espiritismo não consiga triunfar da negligência dos homens e do seu apego às coisas materiais?
“Conhece bem pouco os homens quem imagine que uma causa qualquer os possa transformar como que por encanto. As ideias só pouco a pouco se modificam, conforme os indivíduos, e preciso é que algumas gerações passem, para que se apaguem totalmente os vestígios dos velhos hábitos. A transformação, pois, somente com o tempo, gradual e progressivamente, se pode operar. Para cada geração uma parte do véu se dissipa. O Espiritismo vem rasgá-lo de alto a baixo. Entretanto, conseguisse ele unicamente corrigir num homem um único defeito que fosse e já o haveria forçado a dar um passo. Ter-lhe-ia feito, só com isso, grande bem, pois esse primeiro passo lhe facilitará os outros.”

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• Item 801 •


801: Por que não ensinaram os Espíritos, em todos os tempos, o que ensinam hoje?
“Não ensinais às crianças o que ensinais aos adultos e não dais ao recém-nascido um alimento que ele não possa digerir. Cada coisa tem seu tempo. Eles ensinaram muitas coisas que os homens não compreenderam ou adulteraram, mas que podem compreender agora. Com seus ensinos, embora incompletos, prepararam o terreno para receber a semente que vai frutificar.”

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• Item 802 •


802: Visto que o Espiritismo tem que marcar um progresso da Humanidade, por que não apressam os Espíritos esse progresso, por meio de manifestações tão generalizadas e patentes, que a convicção penetre até nos mais incrédulos?
“Desejaríeis milagres, mas Deus os espalha a mancheias diante dos vossos passos e, no entanto, ainda há homens que o negam. Conseguiu, porventura, o próprio Cristo convencer os seus contemporâneos, mediante os prodígios que operou? Não conheceis presentemente alguns que negam os fatos mais patentes, ocorridos às suas vistas? Não há os que dizem que não acreditariam, mesmo que vissem? Não; não é por meio de prodígios que Deus quer encaminhar os homens. Em sua bondade, Ele lhes deixa o mérito de se convencerem pela razão.”