Estudos Espíritas

CAPÍTULO 6

VIVER



CONCEITO - São as mais diversas as conceituações em torno do fenómeno da vida, variando de uns para outros autores, sempre ávidos de novas afirmações ou estribados em conquistas mais recentes. Os diversos pesquisadores discrepam entre si, na definição, considerando os fatores causais da vida, quando examinados sob severo rigor científico. Raramente, porém, é precisa ou definitiva a explicação apresentada.

Aristóteles foi dos primeiros pensadores a elaborar uma definição da vida, encarando-a sob as manifestações de nutrição, desenvolvimento e desgaste, possuindo em si mesma o fator causal, e, simultaneamente, a sua destruição, fator esse por ele denominado enteléquia.

Nos tempos modernos, Claude Bernard, o eminente fisiologista francês, concluiu pela impossibilidade de se definir a vida, tendo em vista a sua imponderabilidade, abstração.

Ocorre que os estudiosos em geral examinam a matéria orgânica (viva) e a inorgânica (inerte), pelas moléculas de que se constitui cada uma. E para tanto, remontam aos primórdios convulsionados do planeta, quando se deram as primeiras reações em cadeia, das quais a síntese das proteínas e ácidos nucleicos, sob a contingência de ininterruptas alterações, modificações e adaptações deu origem à estrutura de peças capazes de se nutrirem de matéria orgânica (heterotrofia) ou de substâncias simples por meio da energia luminosa (autotrofia) conhecidas como organismos, pela sua complexidade, possuidores das condições de se reproduzirem, promovendo atividades diversas e específicas, que seres de espécie diferente são incapazes de produzir.

DESENVOLVIMENTO -• Ante a complexidade do problema, fascinante quão difícil, pensadores e filósofos, considerando as informações científicas escassas, recorreram às hipóteses metafísicas tais o Animismo, o Vitalismo e as concepções de natureza físico-químicas, para melhores esclarecimentos sobre a vida.

O Animismo decorreu das observações do fenómeno da morte, quando o princípio vital ou alma se desprendia do corpo, reduzindo-o à condição cadavérica. Com Stahl, o Animismo logrou mais clara definição nos primeiros anos do século XVIII, tendo em vista expressar a alma, simultaneamente, o princípio do pensamento e da vida orgânica, com os recursos suficientes para produzir as peças, como também fazê-las atuar na organização somática.

Essa doutrina filosófica encontrou, logo depois, tremenda reação do Materialismo.

Todavia os mecanicistas, tais Descartes e Leibniz, opondo-se às duas correntes: Animismo e Materialismo, sugeriam uma diferença basilar. O primeiro via no mundo metafísico a predominância da alma, através do seu atributo essencial, o pensamento, e o mundo físico ou material onde domina a "extensão no espaço". O segundo afirmava que, embora independentes, alma e corpo mantinham uma identidade preestabelecida e relações extrafísicas, havendo fenómenos na alma como se não existisse o corpo e vice-versa.

Com Bordeu, na metade do século XVIII, o Animismo ficou descaracterizado e o Vitalismo passou a figurar como conceito doutrinário de caráter científico.

Para os vitalistas, todos os fenómenos vivos são dirigidos por um princípio vital independente da "alma pensante" como das "propriedades físico-químicas do organismo", o que constitui um dualismo, no qual Pitágoras como Aristóteles fazem diferir o princípio vital automático, vegetativo, encarregado de todos os fenómenos da vida (psyché) e a alma propriamente dita, incumbida da razão, atributo particular do ser humano (nous).

Outros nobres filósofos e médicos, simultaneamente, examinando o Vitalismo introduziram o conceito do pneuma, que dava origem nos pulmões por onde passava o sangue incumbido da vida de todo o organismo, como sendo um princípio material, transcendente quase, na sua estrutura delicada e sutil.

A teoria recebeu conotações diversas, desde Paracelso e Van Helmont, divulgador da "teoria da geração espontânea", a Dumas (Charles-Louis), e, alterando-se sucessivamente em face dos novos atributos que lhe concediam, surgiu e ressurgiu inúmeras vezes.

Os conceitos físico-químicos a respeito da vida igualmente percorreram longas experiências até a sua integração nas pesquisas da Biologia Experimental. Do Atomismo ao Mecanicismo, do latromecanicismo de Borelli e Boerhaave, ao latroquimismo de Willis, culminou na teoria do Monismo, de Haeckel, com o domínio da substância universal, nas modalidades de matéria e energia.

Concomitantemente, os esculápios dos diversos séculos situaram a vida nos múltiplos órgãos, mediante concepcoes ingénuas, desde o antropocentrismo ao desconcentrismo, nos quais, respectivamente, procurou-se encontrar um núcleo diretor de todos os fenómenos da vida, na realidade orgânica.

Bohr, um dos pais da Física moderna, concebeu uma teoria que aplicou aos fenómenos vitais na condição de complementaridade, através da qual a vida, que resultaria de um complexo de processos físico-químicos, ora surge como um "dinamismo evolutivo", ora transcende a Físico-Química, sem independência, complementando-se os dois estados, algo semelhantes aos "aspectos ondulatórios ou corpusculares das entidades físicas".

Schrõdinger, o teórico moderno da Física, ajustando esses conceitos à Biologia concluiu que os elementos fundamentais da vida são partículas microscópicas, resultantes da agregação de átomos.

VIDA E ESPIRITISMO - No que concerne às origens da vida no planeta terrestre, Oparin crê que os hidratos de carbônio são os encarregados da formação genérica dos organismos mais complexos. Duvalier e Desquin apresentaram, também, a teoria do efeito da fotossíntese primitiva como responsável pela vida, sem que fosse possível, em laboratório, comprovar a validade de uma ou outra afirmativa.

O estudo dos vírus e das alterações que podem sofrer vem contribuindo para melhor compreensão do fenómeno a respeito do surgimento da vida orgânica e sua complexidade, na Terra.

Duas teorias fundamentais apresentavam-se capazes de elucidar a problemática: Criacionismo e abiogênese ou geração espontânea.

A primeira, estribada nas conceituações filosóficas e religiosas de um Deus criador, que tudo elaborou definitivo, organizado, e a segunda, que seria decorrente de um mecanismo de que se utilizara o Criador para o surgimento das formas vivas, de certo modo, complementando a anterior.

Francesco Redi, Spallanzani, Pasteur e outros demonstraram a inviabilidade da abiogênese, quando provaram, mediante experiências nas quais se impossibilitava a presença do ar e da poeira (carregados de bactérias e germens), nas infusões de carnes e caldos fervidos, que a vida não se originava de tais organismos.

O Criacionismo igualmente sofreu rudes combates por parte do Materialismo, em suas múltiplas facetas, ridicularizando a teoria de uma vida em biótipos concluídos, definidos, estruturados em padrões exatos.

O Transformismo, de Lamarck, embora elucidando as modificações dos seres vivos, não conseguiu estabelecer a origem da vida, não obstante a larga contribuição apresentada.

Com Darwin estabeleceram-se linhas características para o estudo da evolução, sem que fosse possível encontrar os prodromes causais da vida na Terra.

Teorias de que germens houvessem vindo de outros planetas, ou formas primitivas de vida aqui chegaram em aerolites, ou poeira cósmica, foram abandonadas, em face dos modernos estudos da Astronomia. E se fossem exatas, essas opiniões, elas elucidariam não a génese da vida, mas o seu surgimento na Terra.

Indubitavelmente, ante o impasse existente, a vida, a manifestar-se no protoplasma, tem o seu princípio construtor e mantenedor na "matéria cósmica primitiva" elaborada pelos Angélicos Construtores do planeta, sob a égide do Cristo, o realizador e diretor do Orbe terrestre.

Tal não ocorreu em um ponto único da Terra, mas, simultaneamente, em toda parte onde as condições permitiram, após as convulsões telúricas da imensa fornalha atómica, que sacudiram o planeta. Apareceram então os sémens da vida, que repousaram no tépido abismo das águas oceânicas abissais, ali se aglutinando e tornando-se cçmplexas, emergindo após, na busca do abençoado heliotropismo, para o ministério a que mais tarde se destinariam.

Provindos da imensa geleia que envolveu o planeta, no seu repouso, representava essa grandiosa massa a geratriz donde se originam, no fluido cósmico, todas as expressões gerais e vivas das diversas constelações do Universo.

Construtores Espirituais encarregados do mundo das formas, em experiências sucessivas no plano físico e no extrafísico, comandaram contínuas realizações até que se definisse a programática da evolução, partindo das construções simples às mais complexas e audaciosas estruturas inertes e vivas.

Os milénios e a operosidade incessante dos Excelsos Realizadores se encarregaram de elaborar o domicílio celular para o Espírito viver e crescer na busca intérmina de Deus.

Nascendo e renascendo ao impositivo da Sabedoria Cósmica, cresce o Espírito e se enriquece de conquistas que o alçarão à felicidade plena, como decorrência natural do empenho aplicado para a própria sublimação.

Milénios de sombra e de sensação nas formas primárias cedem lugar, a pouco e pouco, às experiências da emoção superior, donde se erguerá às conquistas da intuição, a fim de lograr o perfeito entrosamento com a Consciência Divina.

Até colimar esse objetivo elevado, faz-se mister a cada um mergulhar nas lições de vida eterna da Boa Nova, ao alcance de todos, de modo a haurir forças e coragem para o supremo desiderato, que nos fascina, atrai e conduz.

"Donde vieram para a Terra os seres vivos?

"A Terra lhes continha os germens, que aguardavam momento favorável para se desenvolverem. Os princípios orgânicos se congregaram, desde que cessou a atuação da força que os mantinha afastados, e formaram os germens de todos os seres vivos.


Estes germens permaneceram em estado latente de inércia, como a crisálida e as sementes das plantas, até o momento propicio ao surto de cada espécie. Os seres de cada uma destas se reuniram, então, e se multiplicaram. " (O Livro dos Espíritos, Allan Kardec, questão 44.)
"Esse fluido penetra os corpos, como um oceano imenso. É nele que reside o principio vital que dá origem à vida dos seres e a perpetua em cada globo, conforme a condição deste, princípio que, em estado latente, se conserva adormecido onde a voz de um ser não o chama. Toda criatura, mineral, vegetal, animal ou qualquer outra
—porquanto há muitos outros reinos naturais, de cuja existência nem sequer suspeitais - sabe, em virtude desse principio vital e universal, apropriar as condições de sua existência e de sua duração. " (A Génese, Allan Kardec, cap. VI, item 18.)