Excluindo-se as expiações pungitivas e indispensáveis ao reequilíbrio espiritual, as provações constituem abençoado elenco de experiências iluminativas, graças às quais é possível uma existência digna, avançando no rumo da felicidade.
Normalmente, durante o seu transcurso ocorrem fenômenos de dor e de sombra ajustados ao programa de recuperação moral do ser equivocado ou rebelde.
A dor sempre acerca-se-lhe benfazeja e opera-lhe as transformações interiores que o capacitam a melhor discernir para agir entre o bem e o mal, o correto e o danoso, amadurecendoo psicologicamente para novos e oportunos empreendimentos libertadores.
O curso existencial é rico de alegrias e de descobrimentos dos tesouros da vida, que proporcionam beleza e motivações múltiplas para os contínuos tentames.
Vez que outra, apresentam-se as provações que podem ser consideradas como testes de avaliação do desenvolvimento intelecto-moral, como técnica pedagógica para fixar a aprendizagem, como recurso de promoção para estágio superior.
Bem recebidos esses contributos da evolução, o Espírito enrijece-se nas lutas, adquirindo resistência para os enfrentamentos com as tendências inferiores que periodicamente ressumam do inconsciente, herança poderosa que são do passado, e que necessitam ser liberadas sem qualquer prejuízo.
O hábito, porém, do bem-estar e o natural anelo pelo prazer assinalam esses momentos de aflição de maneira tão profunda, que passam a ser evocados com maior facilidade do que todo aquele arsenal de alegrias e preciosas conquistas.
Muitos indivíduos desassisados vivem a remoer mentalmente os acontecimentos afligentes, a comentá-los com tanta frequência que dão a impressão de haver sido a sua caminhada uma via crucis sem trégua.
Detêm-se em relatórios amargos dos momentos difíceis, como se fossem anjos perseguidos em sua imácula pureza, num atestado de rebeldia e ingratidão para com o Pai Soberano que os favoreceu com preciosos recursos capazes de anular aqueles pequenos incidentes, aliás, necessários ao processo de autoidentificação e de vinculação de segurança com a vida.
São tantas as concessões de paz e de saúde, de inteligência e de arte, de pensamento e de trabalho, de convivência agradável com as demais pessoas, que praticamente desaparecem as ocorrências que foram penosas enquanto duraram, deixando benefícios incalculáveis.
Essa postura raia, às vezes, à condição patológica de masoquismo, em face do prazer mórbido de privilegiá-la em detrimento das ocorrências felizes e favorecedoras de alegria.
Esse, sem dúvida, é um comportamento injustificável quando se trata de um cristão em particular ou de um espiritista em especial, por conhecerem ambos as razões morais que desencadeiam tais acontecimentos.
A admirável senhora Helen Keller, embora cega, surda e muda, viveu em constante alegria, tornando-se uma semeadora de esperança e de bom humor para milhões de outros seres atormentados nas suas expiações retificadoras, havendo dedicado a existência a encorajar o próximo através de memoráveis discursos e livros formosos.
Louis Braille, igualmente padecendo de cegueira, transformou os seus limites em bênção para os companheiros invidentes, criando o alfabeto para o tato, de resultados surpreendentes, e que hoje lhe guarda o nome.
Beethoven, em surdez total, utilizou-se do silêncio profundo para compor as últimas sinfonias da sua existência e, particularmente, a 9ª, A Coral, considerada como um verdadeiro coroamento da sua obra.
Vicente Van Gogh, atormentado pela esquizofrenia, e cuja existência foi um fracasso, conseguiu, no entanto, pintar com esmero e realismo, refletindo o seu estado interior… O Aleijadinho, apesar da injunção perversa da hanseníase, transformou pedras em estátuas deslumbrantes, pintando com maestria e tornando-se um artista incomum… Apesar da tuberculose que o consumia, Louis Pasteur prosseguiu nas suas investigações em torno dos micróbios, oferecendo incalculáveis benefícios à saúde da humanidade… Ninguém atravessa os caminhos humanos isento dos sofrimentos que fazem parte da própria constituição orgânica em face do desgaste a que está sujeita, dos conflitos psicológicos, resultados das vivências passadas, das contaminações que produzem enfermidades, das injunções defluentes da vida na Terra, planeta de provas e de expiações, e não paraíso por enquanto… Mulheres e homens valorosos que foram enviados à Terra com limitações e impedimentos quase superlativos, demonstraram a grandeza de que eram portadores, transformando a existência em um hino de alegria, tornando-se missionários do amor e da ciência, da tecnologia, da arte, da fé religiosa, estimulando o progresso e trabalhando em seu benefício.
Possuidor de mil recursos preciosos, o indivíduo não tem por que queixar-se das dificuldades que o promovem, quando enfrentadas com sabedoria e superadas, dando-lhe dignidade e elevação moral.
As provações devem ser abençoadas por aqueles que as experimentam, porque nada acontece que não tenha razões ponderosas para a sua ocorrência, e, naquilo que se refere ao sofrimento, é claro que tem ele o papel de educador rigoroso, porém, gentil, indispensável ao crescimento espiritual dos seres humanos.
Reflexiona, quando nas tuas dores, as ocorrências da vida de Jesus, e compreenderás que Ele, sem culpa, lição viva de amor e de abnegação, experimentou agressões e escárnio, apedrejamento e coroa de espinhos, calúnias e perseguições, culminando na cruz da desonra, sem qualquer reclamação… Naturalmente que Ele não padeceu enfermidades, conflitos e ansiedades, porque era puro, jamais se havendo comprometido com o erro e com o crime, o que é diferente dos habitantes do planeta terrestre que procedem das sombras da ignorância e do primarismo avançando no rumo da luz imarcescível.
Abençoa, pois, as tuas provações, e sê feliz em todos os momentos da tua vida.