Sementeira da Fraternidade

CAPÍTULO 33

RICOS

Parte 1

Contam que, antes de encerrar o colóquio com o Mestre, o moço rico inquiriu:

— Senhor, um galardão será oferecido àqueles que, embora pobres, sem terem a que renunciar, seguirão contigo?

 

— Ser-lhes-á concedido o Reino dos Céus.

 

— Terão eles, porventura, o mérito que reivindicam os ricos que tudo abandonaram para te seguir? Estes, trocaram os tesouros do mundo pelas excelências do Paraíso. E eles, que deram, se nada possuíam?

 

— Enganas-te! Ricos não são somente os detentores das moedas guardadas em cofres de usura sombria que o tempo gasta. A mocidade é também valioso tesouro de inapreciável valor. Enquanto alguns a gastam impensadamente, usando-a no prazer, para despertarem na velhice prematura, eles oferecem a renúncia pelos gozos terrenos. A saúde é igualmente poderosa fortuna que não pode ser comparada às joias saídas da terra nem às peças de ourivesaria.

 

Muitos a utilizam no jogo ilusório da carne, em antros de sedução, para serem surpreendidos pela enfermidade e o desgaste orgânico. Eles, porém, permutaram-na pelo dever puro e nobre de construírem uma felicidade imperecível. A pureza é inestimável posse. Enquanto alguns a aplicam na volúpia da vida carnal, eles lutaram para conservá-la, sofrendo múltiplos embates por amor ao Evangelho. A austeridade é valor insuperável. Nas refregas comuns, para granjearem posição, muitos se fazem cômpares do crime, enquanto eles tudo perderam para tudo ganharem depois.

 

Como vês, é muito mais fácil renunciar às moedas do que às concessões da juventude; trocar as arcas abarrotadas de ouro pela saúde. Muita gente, na Terra, ofereceria todos os poderes para retornar à pureza e à inocência, guardando a austeridade nos cofres da honradez...

 

A juventude que labora pode armazenar haveres ; a saúde que se aplica pode entesourar poderes; a pureza que se conduz adquire prestígio e a austeridade que se irradia comanda homens. Todavia, ninguém soube de qualquer valor amoedado que restituísse a alvorada dos anos nem recuperasse totalmente a saúde perdida. Nenhum prestígio, no mundo, retribui a inocência que se corrompeu, nem servidor algum repôs, no íntimo dalma, o càráter que se poluiu...

 

Ricos, verdadeiramente, não são os mordomos do dinheiro e das terras, senhores de escravos e animais que morrem ou passam de mãos. A maioria deles tem muito e são escravos do que têm, encarcerados nas paredes frias do poder que se desvair e entenebrece. Rico, porém, é todo aquele que tem a alma livre de compromissos sombrios, sendo senhor de si mesmo; que, nada possuindo, é feliz sem ter coisa alguma, e, dispondo da saúde e do amor no coração, entrega-se ao serviço do bem, por amor ao Bem.

 

De tais é, sem contestação, o Reino da Alegria Perene, ou daqueles que, dispondo de outros recursos em títulos e moedas, distribuam-nos aos pobres para a alegria de todos e a felicidade própria.

 

— Compreendo...

 

E como se afastasse o moço, irresoluto e sombrio, o Mestre enúnciou e o apóstolo Marcos registou no Capítulo 10, versículo 23 (Marcos 10:23): "Quão dificilmente entrarão no reino de Deus os que têm riquezas!"

 

Pe. Natividade