A cena incomparável da restituição da vista, ao cego de nascença, produzira um impacto singular e poderoso nos que o conheciam.
Havendo nascido nas sombras da cegueira, o jovem tornara-se mendigo. Exibia sua aflição à misericórdia dos passantes, que o consideravam filho do pecado.
Preconceituoso, na sua imensa ignorância, o povo, à época, desdenhava os enfermos e considerava-os punidos por Deus. A impiedade, dessa atitude decorrente, caracterizava os eleitos que, dia a dia, mais se distanciavam do objetivo sagrado da vida, que é o amor.
Com a escudela na mão, o infortunado suplicava ajuda, até o momento em que Jesus o resgatou da treva exterior.
Pode-se-lhe imaginar o júbilo, a emoção.
Apresentara-se à família e aos amigos, dando a notícia feliz. Nunca, porém, esperava reação em contrário.
Não conhecia os homens, ignorava o mundo.
Como o evento sucedera em um sábado, a hipocrisia farisaica convocou-o a depoimento e inquirição sórdida, assinalada por ameaças, desprezo da sua palavra e dúvida quanto à evidência de que fora portador.
Os pais, acovardados ante a truculência predominante nos poderosos, quando interrogados, responderam que o jovem, sim, era seu filho, que nascera cego, porém, como sucedera a cura, não sabiam, somente ele o poderia informar com segurança, pois já era responsável por si mesmo, tinha idade para depor.
Desse modo, ele repetiu com riqueza de detalhes e ingenuidade, como ocorrera o fato libertador.
Instado a afirmar que Jesus era pecador, não teve alternativa em discrepar dos arrogantes, indagando, como poderia alguém que não fosse de Deus realizar o que Ele conseguira.
E, inesperadamente, perguntou-lhes se queriam ser Seus discípulos.
A resposta e a pergunta lúcida, chocando os seus algozes, fizeram que o expulsassem da sinagoga.
Repete-se o fato desse tipo de agressão todos os dias.
Urdindo as malhas do ódio com os tecidos da inveja, o competidor desforça nos fracos a sua fragilidade, por não poder superar aqueles a quem combate.
Solitário, ao domínio da própria pequenez, não se faz solidário aos que o podem agigantar.
Calunia, porque não acredita nos outros, face às dúvidas que o assaltam, em relação aos valores morais que não possui.
Presunçoso, ostenta a fatuidade, por lhe escassearem os legítimos bens do espírito.
Árido nas emoções, é insensível nas ações.
Pululam no mundo esses biótipos atormentados, em todos os tempos, formando a legião dos infelizes-infelicitadores.
Jesus não se poderia furtar à sanha deles. Ninguém avança nos ideais de engrandedmento humano, passando incólume diante deles.
Nenhuma evidência leva-os à constatação do bem, que os violenta, e, por isso, são duplamente cegos: da razão e do discernimento, embora vejam...
Seria natural que expulsassem o recém-curado da sinagoga, ante a impossibilidade de o recolocarem na cegueira.
Aquele sábado assinalava experiência nova, arrebatadora.
Desconsiderando o preceito hipócrita de guardá-lo, Jesus recuperou inúmeros enfermos, nesse dia, demonstrando que ele fora feito para as criaturas e não estas para se lhe submeterem.
A fúria dos zelotes, que preferem a aparência cuidadosa à realidade profunda, sempre explodia com azedume, exprobando o Senhor, porque não podiam fazer o que Ele realizava...
Sabendo que o jovem fora expulso da sinagoga, Jesus chamou-o.
No moço cantavam as músicas felizes da recuperação.
Os conhecidos discutiam quanto a ser ele o ex-cego ou alguém parecido com ele.
O seu depoimento, repetido, mais causava espanto, enquanto no seu mundo íntimo as emoções eram de superlativa alegria.
Sair da treva para a luz, inesperadamente, constituía-lhe prêmio, porque nem ele nem seus pais haviam pecado, mas assim viera para contribuir em favor do Reino de Deus.
A sua atual reencarnação não era de resgate, antes sim, de aprimoramento íntimo.
— Conheces o Filho do Homem? — interrogou-lhe o Benfeitor Divino.
— Não, senhor.
— Pois, sou eu. Crês que eu seja o Emissário do Pai Todo-Poderoso?
— Sim, eu creio. Eu era cego, e agora vejo. Eu creio, Senhor!
A palavra do Mestre teceu comentários sobre a cegueira dos que enxergam, atingindo os que acompanhavam a cena e recalcitraram, dizendo-se ofendidos.
̈iu o Mestre — mas como vedes, vossos pecados são mais graves.
Os cegos espirituais têm os olhos como candeias acesas, mas sua luz não os liberta das sombras densas da ignorância.
Bem-aventurados, no entanto, os cegos do corpo, cujo espírito vê e discerne a verdade.
O Mensageiro do Pai abria os olhos do mundo, naquele momento, e implantava as bases da Era Nova, que até hoje ainda não foram identificadas por muitos dos Seus seguidores, que permanecem cegos para com a Verdade e não se deram conta que Ele é.
João