Amanhecendo a Era da esperança e da alegria, a paisagem humana nas praias do mar da Galileia começou a modificar-se.
Os semblantes, anteriormente carregados de revolta e ressentimento, abriam-se em sorrisos de generosidade e bem-es-tar, após os incomparáveis contatos com Ele.
A magia do Seu verbo e o encanto da Sua presença acalmavam as ansiedades mais perturbadoras e diluíam os sentimentos inamistosos, sem que se dessem conta aqueles que os sofriam.
As notícias corriam de boca a ouvido e se espalhavam como pólvora incendiada entre os infelizes.
Cada vez chegavam à região os desvalidos e chibatados pelo abandono, aguardando solução para as suas cargas aflitivas, os seus sofrimentos superlativos.
Ele os atendia com ternura incomum, irmão de todos e amigo especial de cada um, dando-lhes a impressão de que viera somente para socorrê-los, a cada qual de maneira coloquial e única.
Essa, porém, não era a finalidade da Sua mensagem. Usava de misericórdia e de compaixão porque era a única forma de ser seguido nas circunstâncias, tendo em vista a magnitude da proposta que apresentava em parábolas, a fim de não os assustar. Imaturos e sofridos, o importante era-lhes a diminuição das dores e das penas momentâneas, como os apelos do estômago esfaimado, de modo a poderem ouvir o que Ele tinha a lhes dizer.
Porque os ventos gentis da alegria estivessem no ar, era necessário levá-los a outras regiões, além da simplória Galileia.
Ainda não estava consolidado pela confiança e pelo conhecimento o grupo que O deveria seguir e testemunhar-lhe fidelidade quando cada um fosse chamado ao mesmo.
Ele tomou a decisão formosa de multiplicar as vozes e ampliar o círculo da esperança, preparando as veredas humanas que visitaria depois.
O Seu verbo deveria entoar a musicalidade sublime do perdão aos ouvidos moucos dos desesperados ou insensíveis dos poderosos de um dia...
Reuniu alguns daqueles ouvintes mais frequentes e sinceros, deu-lhes instruções e recomendou-lhes prudência durante o período de divulgação.
As ideias devem ser expostas para poderem ser compreendidas ou combatidas. Quanto mais comentadas, mais amplo o curso da sua difusão. O silêncio em torno delas asfixia -as na ignorância dos seus conteúdos.
O mar generoso era assinalado por aldeias e grupamentos, urbes famosas e de alta movimentação, como se fosse um colar de pérolas à sua volta com diferentes modelos presos ao fio de segurança.
— Grande é, em verdade, a seara, mas os obreiros são poucos; rogai, pois, ao Senhor da seara que envie obreiros para a sua seara.
Houve uma expectação incomum, assinalada pelo entusiasmo dos que se candidatavam a seareiros.
— Ide; eis que vos mando como cordeiros ao meio de lobos.
A advertência oportuna dava-lhes dimensão do que iria ocorrer, porque a confiança e o respeito humano haviam cedido lugar à desconfiança e à rapina. Fazia-se necessário apresentar-se desarmados, de modo a conseguirem ser amados.
— Não leveis bolsa, nem alforje, nem alparcas; e a ninguém saudeis pelo caminho.
Desde que estariam a serviço da renúncia e da abnegação, não lhes seria lícito conduzir objetos desnecessários, valores que despertam cobiça e agressão. Despojados, seriam iguais aos visitados, confundindo-se com eles, sem os destaques que chamam a atenção e criam antipatias.
— E, em qualquer casa onde entrardes, dizei primeiro: paz seja nesta casa. E, se ali houver algum filho de paz, repousará sobre ele a vossa paz; e, se não, voltará para vós. E ficai na mesma casa, comendo e bebendo do que eles tiverem, pois digno é o obreiro de seu salário. Não andeis de casa em casa. E, em qualquer cidade em que entrardes, e vos receberem, comei do que vos for oferecido.
Estava mantida a ética do comportamento social, o respeito às ocorrências, com simplicidade, sem exigências nem extravagâncias. Eles seriam aceitos ou não pela maneira de se comportarem.
—E curai os enfermos que nela houver, e dizei-lhes: é chegado a vós o reino de Deus. Mas em qualquer cidade, em que entrardes e vos não receberem, saindo por suas ruas, dizei: até o pó, que da vossa cidade se nos pegou, sacudimos sobre vós. Sabei, contudo, isto, que já o reino de Deus é chegado a vós.
A psicologia de Jesus era toda centrada no Amor, nada de violência, de imposição dos Seus ensinamentos. Da mesma forma, nenhuma submissão ao mundo perverso e às suas determinações. A independência moral fazia parte do seu programa, porque somente aqueles que são livres podem comentar a bênção da liberdade.
Seguindo as circunstâncias, Ele passou a explicar os perigos para as cidades e pessoas que desprezassem o convite, optando pela ilusão que, às vezes, sobrepõem-se à realidade.
As pequenas pérolas, às margens do mar Galileu: Corazim, Bethsaida, estavam recebendo o anúncio do mundo melhor, mas também Cafarnaum, Magdala, Dalmanuta seriam bafejadas pela notícia revolucionária.
Também Tiro, Sidom e outras distantes, igualmente Jerico das águas cantantes e cristalinas seriam convidadas ao banquete com a opção de o aceitarem ou não.
— Quem vos ouve a vós, a mim me ouve; e quem vos rejeita a vós, a mim me rejeita; e quem a mim me rejeita, rejeita Aquele que me enviou.
Partiram os mensageiros e visitaram os recantos da região assinalada e de outras, vivendo o ensinamento que transmitiam, amparando-se reciprocamente, por isso, os mandara, dois a dois, para que a solidão não se transformasse em desespero em cada coração.
Transcorreram os dias justos e propostos, quando eles retornaram em inusitado júbilo.
O verdadeiro regozijo não se deve apoiar nas vitórias sobre os outros, sejam Espíritos ou criaturas, mas na superação das próprias imperfeições, na consciência íntegra, decorrente do dever nobremente cumprido.
Ele os mandou, dois a dois, para anunciar o Seu Reino que se estava instalando no mundo.
— (...) Alegrai-vos antes por estarem os vossos nomes escritos nos céus.