8. Naquela região havia pastores que viviam nos campos e guardavam seus rebanhos durante as vigílias da noite.
9. Um anjo do Senhor apareceu-lhes e a glória do Senhor brilhou ao redor deles, e encheramse de grande temor.
10. Disse-lhes o anjo: "não temais, pois vos trago uma boa notícia de grande alegria, que o será para todo o povo,
11. e é que hoje vos nasceu. na cidade de David, um Salvador, que é Cristo Senhor;
12. e eis para vós o sinal: encontrareis uma criança envolta em faixas e deitada numa mangedoura".
13. De repente apareceu com o anjo uma multidão da milícia celeste, louvando a Deus e dizendo:
14. "Glória a Deus nas maiores alturas e paz na Terra aos homens de boa vontade".
de Belém havia numerosas pastagens, onde era hábito viverem os pastores em tendas, a cuidar dos rebanhos. Todavia, após as grandes chuvas de novembro e no rigor do inverno, já nos fins de dezembro, não era provável que lá permanecessem: já deviam ter recolhido os rebanhos aos currais desde novembro. Daí deduz-se que o nascimento de Jesus não deve ter ocorrido em dezembro.
Sabemos, com efeito, que só muito mais tarde, em Roma, para "aproveitar" a festa de Mitra (natalis invicti solis", nascimento do Sol invicto (ou seja, a entrada do sol no solstício do inverno) festejado em 25 de dezembro, é que a igreja de Roma, por volta de 354 A. D. vulgarizou essa data a toda a cristandade, contrariando muitas outras tradições locais que festejavam o natal em datas diferentes. (Cf. Calendarius Philocalus, publicado por Theodor Mommsen, no Abhandlungen d Sachs Alcad. d. Wissensch em 1850). Nessa época os bispos da Síria e da Armênia acusaram os romanos de "admiradores do sol" e "idólatras".
Aí também apresenta o mesmo sentido (cfr. 2SM
Aparece, a seguir, aos pastores, um grande grupo ("milícia") de anjos, que cantam o célebre versículo, sobre o qual se estabelecem discussões.
O ensinamento é de grande profundidade.
Verificado o Encontro, que se realiza no mais oculto do coração, embora este ainda esteja mergulhado no corpo animal de carne (na estrebaria), o recém-nascido é colocado no intelecto, que alimenta de luzes o corpo animal (na mangedoura), e daí expande suas luzes para todo o corpo. Nessa "região" há pastores que guardam o rebanho, isto é, há o sangue ("o sangue é a vida", DT
nervoso, o "anúncio" do extraordinário e divino fato. No primeiro momento, o sangue se retraí aterrorizado (a criatura empalidece), mas depois que recebe o aviso, se acalma, porque vem a saber que na Casa do Amado (na "cidade de David") - o coração - nasceu o Cristo que é o Salvador, e que lá se encontra sob a forma de uma criança envolta em faixas. Realmente, o Encontro se dá na "célulam ônada" que está fixa no ventrículo esquerdo do coração (exatamente no nó de Kait-Flake e His).
Ora, o sangue poderá dar-se conta desse nascimento, ao encontrar o "menino" espiritual, envolto em faixas (envolto em matéria), cercado do intelecto (José) e da intuição (Maria), que descem ao coração, na meditação profunda, mergulhando em si mesmo. Só quando a mente desce ao coração pode encontrar o Eu Profundo, a Centelha Divina, que lá permanece em estado latente, mas que nascerá um dia.
Ao entrar nesse local sagrado, depois de percorrer outros caminhos, e já purificado pela hematose nos pulmões, o sangue se regozija com o louvor a Deus, que ali jaz "aniquilado em forma humana", o infinito dentro de uma célula, o Verbo feito carne, e que se manifesta aos homens, que visita "seu povo". Aqueles que experimentaram o "Encontro Supremo" percebem, com iniludível clareza que sua circulação sanguínea se acelera e "responde" ao apelo de louvar a Deus. De modo geral, é nessas circunstâncias que percebemos a diferença entre um corpo comum e o corpo de um asceta, totalmente espiritualizado, embora ainda sujeito a todas as vicissitudes e necessidades carnais. De qualquer forma, no entanto, o próprio corpo do místico irradia, através da carne, a espiritualização interna.
Por isso o fato tem também repercussão externa. Qualquer pessoa que tenha a intuição desenvolvida, mesmo que não seja no grau máximo, percebe, sente, que aquela criatura teve o encontro, vive em união com Deus. E a criatura que experimentou essa felicidade não precisa convocar discípulos, adeptos e sequazes: todos a procuram espontaneamente, porque a intuição lhes avisa: "os anjos do Senhor" lhes revelam, sobretudo "durante as vigílias da noite", isto é, nas horas penumbrosas da meditação, e enquanto eles "guardam os rebanhos", ou seja, enquanto pacificamente cuidam de seus afazeres. Avisa-os intuitivamente. Os "pastores" inicialmente temem que possa tratar-se de um equívoco. Mas a insistência e a clareza do aviso os alerta de tal forma que eles resolvem abandonar, nem que seja por curtas horas, os negócios terrenos, para ir também em busca do recém-nascido, do homem novo que surgiu na Terra, Luz para o mundo, Salvação para todos.
Entoa-se, então, o hino místico da Glória a Deus que nasce nas criaturas, e de Paz às criaturas que foram visitadas pelo "nascimento" de Deus em seus corações.
Convém aqui salientar que esse "nascimento" corresponde, simplesmente a um DESPERTAMENTO.
O Cristo interno, a Mônada Divina, existe em tudo e em todos, no mineral, no vegetal, no animal, no homem, mas em estado latente, impulsionando-o à evolução, mas sem ser percebido pela própria cri atura. Quando esta descobre o caminho e "entra" no "reino-de-Deus" DENTRO de seu coração, aí descobre a Mônada Divina, e a ela se unifica no Encontro Sublime. Diz-se que "nasceu" o Cristo interno, secretamente, oculto aos olhos da multidão, colocado num estábulo que é o corpo de carne, e depois deitado na mangedoura, que é o intelecto, alimentador par excelência do homem-animal.