Sabedoria do Evangelho - Volume 1

CAPÍTULO 3

ZACARIAS E ISABEL



LC 1:5-7

Temos um fato REAL, que se passou logo antes da chegada de Jesus a este planeta: o nascimento do precursor João, denominado "o Batista", cuja ocorrência havia sido predita por vários médiuns (profetas), com muita antecedência.

Lucas situa o fato historicamente, apresentando ao leitor a época do acontecimento, o pai de João, seu nome, idade e profissão, e a mãe, dando-lhes inclusive a filiação. Temos, pois, que Herodes era rei da Judeia (nomeado pelo Senado em 40 AC, tomou Jerusalém em 37 AC e morreu no ano 4 antes da era cristã), quando o sacerdote Zacarias teve a revelação do nascimento de um filho, embora já fora das possibilidades humanas.

Os fatos são claros e não necessitam de explicação.

Muitos ensinamentos, todavia, transparecem dessa narrativa singela. Estudemo-los.

Herodes, o Grande (como toda sua linhagem), não era israelita de raça: era idumeu, convertido à religião judaica. Não fazia parte, pelo sangue, do povo hebreu.

Herodes representa o homem ainda animalizado, a força material, despótica, que apenas busca conforto (reino mineral), as sensações físicas (reino vegetal) e as emoções (reino animal), preocupandose somente com a matéria terrena transitória, para ele a única realidade, porque é palpável aos sentidos físicos.

Diz o evangelista que Herodes era "rei da Judeia".

Observemos: Judeia significa "louvor a YHWH", fase típica da personalidade, ainda sujeita a ritos e liturgia exteriores da religião. Notemos ainda que em O Novo Testamento aparece com frequência a oposição entre as duas localidades: Judeia e Galileia. Galileia significa "região cercada"; exprime, pois, o ambiente da individualidade, o "horto florido", ou seja, a região inacessível ao vulgo, "cercada" para que os profanos nela não possam penetrar.

Logicamente, Herodes só podia ser rei (dominador, déspota) da Judeia, isto é, da personalidade inferior, já que só as coisas terrenas e materiais constituíam seu domínio absoluto.

A expressão "nos dias de Herodes" demonstra-nos que o simbolismo que nos vai ser apresentado sob a capa dos fatos (que se realizaram), deve ser procurado na época em que a humanidade era preponderantemente materialista, cogitando tão só dos interesses dos carpos físico, sensitivo e emocional.


Nessa época e nesse ambiente, viveu na Terra. um sacerdote - por mais baixas que sejam as condições ambientais, pode elevar-se o espírito, tal como o lírio que pode florescer, num pântano - A palavra sacerdote, tradução latina do grego ίερέυς, exprime o homem que "se dedica. " (dos, dotis = dote, doa ção) às coisas sagradas (sacer, sacra, sacrum). Sacerdote é, portanto, a criatura dedicada e devotada a Deus, a Ele consagrada. Zacarias (cujo nome significa "lembrança" ou "recordação" de YHWH) é o protótipo do INTELECTO que, neste caso, já está voltado para as coisas espirituais e divinas, pois "se lembra de Deus", tanto que "se dedicou" às coisas sagradas.

E, uma das provas de que tinha Deus, conscientemente, como Pai, é a notícia que dele nos chegou: segundo Lucas, ele era filho de Abia (Abijah, cfr. 2CR 24:10), que significa "Deus é meu Pai".

Com essas características tinha, forçosamente, que procurar ouvir a INTUIÇÃO, representada por Isabel. Em hebraico, o nome é Elisheba, isto é, "adoradora de Deus", ou "obra de YHWH". Com efeito, a intuição está "ligada" ao EU Superior e Divino de cada criatura.

Escreveu o evangelista que Isabel "era descendente de Arão". Ora, mesmo em nossos dias (com registros de nascimento) raramente conhecemos nossos ascendentes além da 3. ª geração (pais, avós, bisavós). Só excepcionalmente chegamos à 6. ª ou 7. ª geração, ou seja, a. 200 ou 300 anos para trás.

No entanto, o tempo transcorrido entre Arão e Isabel era de 1. 500 anos! Que diríamos, atualmente, de um homem moderno, que afirmasse ser descendente de uma personagem do ano 500 depois de Cristo?

... Se isto hoje é impossível na prática, que não seria - dadas as proporções - naquela recuada época?

Como poderia ser feito o controle? Donde concluímos que, no caso, existe em tudo isso uma alegoria, um símbolo. Arão significa "o iluminado". Quer dizer que Isabel (a intuição) já se encontrava "iluminada" pela luz do Eu Supremo, da Centelha Divina; mas não se havia ainda unido a ela. A tentativa, entretanto, estava sendo feita: Zacarias (o intelecto) já se unira em matrimônio a Isabel (a intuição) na busca. intensa dessa união com o Eu Superior.

Prossegue o evangelista: "ambos eram justos perante Deus, andando irrepreensíveis em todos os mandamentos e preceitos do Senhor" - excluindo, por omissão, os preceitos "dos homens", exprimindo assim que viviam mais na individualidade do que na personalidade. E a "justiça" neles exaltada, é aquela que vige perante Deus, não perante os homens.

Vem a seguir um versículo interessante: "e não tinham filhos, porque Isabel era estéril e ambos (estavam) em idade avançada". Humanamente, um fato natural, embora tivesse que ser dividido em duas partes: a) a esterilidade feminina (porque "dela" e não dele?) ; b) a idade avançada.

A primeira, compreendemos, justifica a falta de filhos nas idades juvenis e na madureza. A segunda apenas comprova que, na idade já avançada, nada mais podia esperar-se.

Dai ser imprescindível, para o fato "material", algo que fugisse ao normal. Para a personalidade aparece a intervenção divina, e portando o "milagre", e tudo pára aí.

Na interpretação mais profunda aparecem as razões claras.

Apesar de estar iluminada a intuição (Isabel descendente de Arão) e apesar de voltado para Deus o intelecto (Zacarias sacerdote), e apesar de os dois se haverem unido para o encontro supremo, os dois ainda não tinham conseguido essa união: "não tinham filhos", ou seja, não haviam chegado a um resultado. As razões procedem: a intuição era "estéril" porque ao intelecto faltava o elemento fecundador, e isto não obstante estarem buscando há muito tempo - "ambos" estavam "em idade avançada".

Nesse momento, entra em campo novo elemento de ação, ou seja, aparece um "guru", um mestre (porque o discípulo estava preparado), e dá-se o acontecimento tão desejado: nasce um filho, chegase à união total.

Ve-lo-emos no trecho seguinte.