E deixando-os, retirou-se.
O fato de aparecer duas vezes em Mateus, pode significar que realmente a cena se repetiu. É a opinião de Lagrange, apoiado em alguns manuscritos e versões, bem como na tradição de Taciano, Eusébio e João Crisóstomo, seguido nisto por Pirot, Entretanto, Tischendorf, Hort, Soden, Vogels, firmam opini ão contrária, por causa da omissão do Sinaítico, do Vaticano e das versões copta, armênia e siríacas (sinaítica e curetoniana), assim como da tradição de Orígenes e talvez Jerônimo. De qualquer forma, não havendo segurança, resolvemos englobar tudo num só comentário, pois os termos são quase idênticos.
Os fariseus, escribas e saduceus pedem que, como comprovação de seu ministério, Jesus lhes forneça um "sinal celeste". É como podemos entender o ek ou apò tou ouranou: sinal proveniente do céu (hebraico: min hachâmaim). Não bastam as palavras e as curas, fenômenos terrenos: querem algo supernatural, tal como (nota Pirot) faz exatamente a igreja católica romana, quando exige dos candidatos à canonização, sinais extraordinários (milagres!). Se Jesus voltasse à Terra, novamente teria que submeterse às mesmas exigências, e talvez desse literalmente as mesmas respostas... Os homens eram e são julgados não pelo que SÃO, mas pelo que FAZEM.
Habituados à leitura do Antigo Testamento, conheciam eles os sinais "celestes" realizados como demonstração da autoridade divina: o maná caído do céu (EX
Ora, jamais se deixou Jesus arrastar, pelo que conhecemos das Escrituras e de Sua formação psicológica.
a realizar atas espetaculares, embora, segundo Suas próprias palavras, pudesse fazê-lo (cfr. MT
Jesus recusa o sinal, invectivando aquela "geração", termo que pode referir-se a Seus contemporâneos em geral, ou particularmente ao clero hierosolimitano, que o condenou à morte e que estava ali presente, por seus representantes credenciados. Qualquer que seja o sentido, a "geração" é acusada de" adúltera e má".
O qualificativo "adúltera" (moichális) é aplicado no sentido bíblico (veja vol 2 e vol 4). Concordam com isso Pirot (o. c. vol. 9. º, pág.
163) que diz serem adúlteros "os infiéis a seu deus" (sic.) ; e o jesuíta Padre Max Zerwick (Analysis Philogica Novi Testamenti Graeci, Roma, 1960, pág. 31): defectio a Deo; qui cum populo suo quasi matrimonio se junxit, adulterium in Vetere Testamento appellatur, isto é, o afastamento de Deus que se uniu a seu povo como em matrimônio, é chamado adultério, no Antigo Testamento".
"iona inteiro".
A citação de Jonas evoca Ninive, cidade "pagã", mas que atendeu à pregação do profeta e modificou seu modo de agir. E ali, perante o clero de Jerusalém. estava alguém maior (pleion) que Jonas.
Outra lembrança é trazida: a rainha de Sabá saiu de sua Terra, empreendendo longa viagem para ouvir a sabedoria de Salomão (1RS
No segundo trecho de Mateus há outro pormenor: Jesus compara os sinais meteorológicos da aparência do céu, que tinham sido observados por eles, com os sinais da época messiânica, predita pelos profetas.
Se eles sabiam dizer, ao chegar a tarde "Bom tempo, céu vermelho", e pela manhã: "Temporal, céu vermelho e carregado", como não tinham capacidade de perceber as palavras dos profetas, que haviam falado a respeito do Messias?
A grande ansiedade da personagem humana volta-se para os fenômenos exteriores: sinais, "milagres", manifestações de espíritos, ectoplasmias, materializações, curas espirituais espetaculares, operações realizadas por entidades do astral, etc. etc. A busca é aflita, intessante, angustiosa. Organizam-se centros de estudos, grupos de pesquisa, reuniões médicas; observam-se rituais, armam-se sessões de efeitos físicos, prendem-se os médiuns em gaiolas fechadas a cadeado, e este é coberto com esparadrapo que leva a assinatura dos assistentes, tudo em teatralização bem montada para o aplauso público.
Visa tudo isso, em grande parte, à caça de prosélitos, para aumentar o número de cabeças, como se o valor de um sistema religioso se computasse como a riqueza de um vaqueiro: pela contagem das rezes.
E se essas "cabeças" forem "coroadas" pela nobreza do sangue ou da riqueza, isso dá para "encher a boca" de vanglória, como se a matéria pudesse trazer prestígio ao campo espiritual. Organizamse festas, espetáculos pomposos, exterioridades vazias, com os mais variados pretextos: todos se julgam "merecedores" de assistir a fenômenos extraordinários de toda ordem, realizados no momento preciso em que são desejados.como passes de mágica.
... anandas, etc. Quanto mais honrarias e comendas se distribuem: mais comparsas aparecem, em busca de destaques - mas não de trabalho - adorando-se os "cargos", mas não os "encargos".
Em outras palavras, encontramos a curiosidade intelectual que se repasta nos termos complicados, nas etimologias abstrusas, nos segredos "indizíveis", só revelados aos que atingiram determinados graus prefixados numa escala hierárquica artificialmente criada e caprichosamente organizada (ou aos que pagaram as quotas correspondentes a esses graus...) ; tudo é feito num sigilo grotesco e ilusório, facilmente desvendável e decepcionante, pois quando se vem a conhecer "o grande mistério", se verifica que é assunto ultra-superado, talvez escrito há séculos ou milênios e que só se acha sem divulgação porque a massa perdeu o contato com línguas antigas (hebraico, sânscrito, grego, persa antigo, copta, tibetano e até latim). Só é mistério porque alguém descobriu como "novidade" e disso se serve para mostrar-se (ou julgar-se) superior aos outros, só revelando sua descoberta aos seus "eleitos".
Vale-se desses segredos de polichinelo como de um escabelo para manter-se superior aos demais companheiros, conquistando a auréola de douto ou de sábio, de ser privilegiado, que os ignorantes lhe confirmam.
Os "mestres" legítimos, os que realmente trazem mandato dos planos superiores, jamais agem dessa forma, nem concordam com essas criancices: fazem como Salomão (Sab. 7:
13) "aprendi sem hipocrisia, transmito sem inveja". Não procuram agradar nem lhes interessam aplausos, nem aumento quantitativo de discípulos, nem se envaidecem porque conquistam sequazes nas altas esferas sociais, políticas, intelectuais ou financeiras: visam apenas à qualidade, à evolução íntima, preferindo, por vezes, pescadores e publicanos humildes, a doutores da lei e escribas.
Cristo deu-nos a lição, com Seu exemplo e com Suas palavras, como sempre: "nenhum sinal lhes será dado" a esse amontoado de vaidades, a esses que julgam que uma doutrina só pode vencer se tiver a aprovação, o beneplácito e a adesão deles! ... Mas eles passam, e a doutrina, se for boa, se for legítima, permanece durante séculos iluminando as criaturas.
Sinal celeste? Mas "eles" só têm altitude para compreender o "céu" meteorológico, que prenuncia tempo bom ou borrascoso. Mas o "céu" da alma, o "reino dos céus" do coração, lhes está totalmente fora do alcance evolutivo. Por isso pedem sinais exteriores, já que não sabem ouvir a voz silenciosa do Cristo Interno.
Mas só lhes será dado o "sinal de lonas". As palavras relembram a tradição, tal como ficou registrada no livro, embora sentidos outros possam surgir.
Jonas (cujo nome Iona significa "pombo") recebe de YHWH a incumbência de dirigir-se à cidade de Nínive, capital da Assíria, para anunciar que dentro de 40 dias ela será destruída. Fugindo da ordem, o vidente vai a Társis, cidade do sul da Espanha, o extremo oposto... O navio é sacudido por forte temporal, com risco de naufragar. Jonas apresenta-se como "responsável" daquilo e pede para ser lançado ao mar, o que é feito. Um "peixe" o engole e três dias depois o lança na praia, perto de Nínive, onde ele anuncia a destruição da cidade. Todos nele acreditam e, do rei ao último dos cidadãos, modificam sua conduta, sendo então poupada a cidade, que não é destruída, o que muito decepciona Jonas, que teme passar por mentiroso.
Evidentes a alegoria e o simbolismo, que transparecem de todos os pormenores.
Podemos alargar os horizontes e verificar que o Mestre ficará oculto durante o signo de "piscis" (até o ano 2. 000, mais ou menos), no "coração (ou interior) da terra", voltando a aparecer na era do Aquário.
Outra interpretação, no setor dos mistérios iniciáticos, nos esclareceria que o único sinal que o ser evoluído pode dar, é submeter-se pessoalmente à experiência (páthein) ou paixão, com uma morte, mesmo violenta, mas aparente, podendo dali sair, superando-a e arrebentando-lhe os grilhões. Esse passo deve ser vivido no último plano: supremamente difícil e arriscado, são poucos os que, mesm "iniciados", podem tentar vencê-lo. Jesus conquistou o seu, e com vitória notável, demonstrando o domínio pleno e o comando seguro dos veículos inferiores: depois de passar o tempo necessário no" inferno" (parte baixa geograficamente, o "coração da terra", ou centro), volveu à vida, como se nada Lhe houvesse acontecido, triunfante e glorioso, conquistando com justiça o título e o posto de "Sumo Sacerdote" (HB
Esse seria o único sinal que Ele daria a "esta geração", ou seja, a "quem tivesse olhos de ver": sua vitória total no setor espiritual, conquistada exatamente, através da derrota do plano material.
O simbolismo místico também está suficientemente claro: para conquista do triunfo espiritual, é mister inicialmente "mergulhar" no coração da terra (no corpo), onde se esconde o Cristo Interno pujante de vida; de beleza. Depois desse encontro sublime, é que virá a superação de todos os óbices e a derrota da morte e das fraquezas. E aqui compreendemos as palavras do Mestre: "eis aqui alguém maior que Jonas, maior que Salomão". A rainha do sul foi buscar longe a sabedoria de um homem, de Salomão.
Pois o Cristo, maior que Salomão, está em nosso âmago, esperando por nós, para manifestar-se.
Por que não ir a Ele, não ouvir-Lhe a voz? A alusão ao monarca antigo ajuda esta interpretação, pois as obras que escreveu ("Sabedoria" e sobretudo "Cântico dos Cânticos") são, sem sombra de dúvida, tratados místicos que ensinam a busca do Cristo Interno, para quem sabe entendê-las.