O jejum, representando a "abstenção", pode ser interpretado por dois prismas distintos, à luz da Revelação Espírita. Há o jejum imposto, fruto de expiação, que retira do indivíduo enquadrado pela Lei ("fora da lei") as prerrogativas do livre-arbítrio (escolha): "Disse, então, o rei aos servos: Amarrai-o de pés e mãos, levai-o, e lançai-o nas trevas exteriores; ali haverá pranto e ranger de dentes" (MT
Neste aspecto, o jejum é obra da Lei em favor da reeducação moral do Ser, quando ele é obrigado a experimentar, vivenciar o fruto de seu esforço, de sua escolha, como meio de "saber" o que tem feito da prerrogativa divina da imortalidade (a vida e o viver). Dentro dessa órbita de formação elementar do caráter, identificamos o Antigo Testamento, que é definido por Emmanuel como sendo a súplica do homem a Deus (Coletânea do Além, capítulo 46). Daí Jesus dizer que, até João (o Batista), o Reino dos Céus sofre violência e os violentos se apoderam dele (MT
Há tempo para todo tipo de realização, seja o tempo do contato primacial com as coisas que Deus criou para imantação da mente humana, despertando-a para o fenômeno da vida inteligente (primitividade), seja o tempo destinado a depurar os valores já somados pelas reencarnações, com o objetivo de iluminar a alma (expiações e provas), até que, por essa base intelecto-moral, o discernimento, reunindo razão e sentimento, opere a projeção do indivíduo aos territórios da angelitude (missionários do Pai, Filhos de Deus): "Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu"(Eclesiastes
Na trajetória de conquistas evolutivas, porém, o jejum tem papel preponderante, e é o que Jesus quis significar quando responde aos fariseus e seus escribas: "E ele lhes disse: Podeis vós fazer jejuar os filhos das bodas, enquanto o esposo está com eles?" (LC
Quando renascemos, na condição infantil, somos conduzidos, pelo clã que nos acolhe em seu seio, para futura emancipação. Em termos psíquicos, Jesus passa a cuidar de nós, quando já dispostos a conhecer aspectos mais elevados da vida moral, da vida íntima com Deus, e, nesse sentido, Jesus nos fecunda, pois é Ele o elemento ativo, vigoroso, capaz, por sua autoridade espiritual ("guia e modelo"), de nos iniciar e nos nutrir de ideais para que surja o "Filho do Homem" - aquele tipo de perfeição e pureza a que aspiramos na Terra. É o iniciador de uma vida plena de graças: "Porque os que dantes conheceu também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos" (Romanos
Enquanto o aspirante à vida mais alta estuda e convive com os sublimes ideais (isso ocorre frequentemente com os que chegam às Casas Espíritas e se deparam com a opulência espiritual da Revelação dos Espíritos), permanece ele com o "esposo", ou seja, aquele que o inicia, que o conduz, que o fecunda psiquicamente de propósitos e aspirações morais, até que seja chamado às provas e testemunhos de aferição, e, nessa hora, é ele próprio quem deve aplicar tudo o que recebeu do Cristo, através da Doutrina Espírita codificada e desdobrada com o auxílio de grandes e nobres servidores encarnados e desencarnados.
Por isso, nas "bodas" ou "festa do casamento", em que a criatura se associa, de sentimento, ao Cristo, que passará a lhe conduzir as potências, as realizações, a evolução consciente, há abundância de "comida", de "bebida" e de alegria... Essa figura de linguagem ensina que, ao encontrarmos os grandes ideais, as respostas para a Vida infinita, o atendimento efetivo dos anseios da alma, conforme se registra nas "Bem-aventuranças" (MT
É nessa base de renovação, quando a humildade de coração opera o verdadeiro jejum (abstinência de orgulho e vaidade, presunção e domínio), que os males e vícios ancestrais (reencarnatórios) da criatura são desativados, e isso só é possível depois que o Cristo opera, através das "bodas" (casamento, união), o surgimento do "Filho do Homem". A partir desse entendimento, podemos compreender o que Jesus ensinou aos discípulos no episódio da cura de um lunático: "Mas esta casta de demônios não se expulsa senão pela oração e pelo jejum"(MT
E, se jejum é sinônimo de humildade, oração é caridade, pois implica comunhão com Deus, com Sua Vontade soberana e santa.