O Caminho do Reino

CAPÍTULO 40

O CÉU E A TERRA PASSARÃO



Embora saibamos que tudo caminha para a Unidade em Deus - com o "trânsito" definido pelo Espírito de Verdade como sendo "do átomo ao arcanjo" (O Livro dos Espíritos, questão 540), que forma cadeias de vida, em laçadas que vão dos mundos primitivos, em que o reino mineral é "o instituto de recepção da onda criadora da vida"(Evolução em Dois Mundos, parte primeira, capítulo 6), ou seja, dos Princípios 1nteligentes, atravessando o reino vegetal e o reino animal, em gravitações reveladoras de potenciais intrínsecos para efeito de fixação de experiências, com que as estruturas do "perispírito" são desenhadas e automatizadas, permitindo o surgimento do "homem", com suas prerrogativas de "pensamento contínuo", até a exuberância da angelitude, em que o "Filho de Deus" surge para executar a obra que lhe compete no concerto da Criação –, vamos encontrar os "universos", os quais são relativos e surgem para desaparecer, quando cumprem sua missão, em termos coletivos e individuais.

No primeiro livro de Moisés, vamos identificar essa providência relativa, para definição de um contexto estimulador de progresso 180 e evolução aos que seriam os habitantes da Terra, assim que fora criada: "E disse Deus: Haja luminares na expansão dos céus, para haver separação entre o dia e a noite; e sejam eles para sinais e para tempos determinados e para dias e anos" (Gênesis 1:14). Aí, "céus e terra", "sol e lua", "estrelas e outros luminares" sinalizariam o nível de evolução compatível com o tempo e as características das almas então agrupadas. Era um primeiro e substancioso lance de vida e progresso apresentado aos seres, que deveriam lutar e sofrer para conquistar o seu "universo interior". São exatamente esses luminares e a própria terra então definida no Gênesis que perderiam sua validade, sua vitalidade, quando, no Sermão Profético, Jesus anuncia uma nova era, após sofrimentos e lutas depuradores dos sentidos até então obtusos e materialistas das almas: "E, logo depois da aflição daqueles dias, o sol escurecerá, e a lua não dará a sua luz, e as estrelas cairão do céu, e as potências dos céus serão abaladas" (MT 24:29).

Esses ciclos de evolução, descritos de modo alegórico por Jesus, se sucedem na Criação excelsa e, dependendo da posição conceitual e evolutiva dos Espíritos, têm duração maior ou menor, pois são, em figura de linguagem, "berços" ou "ninhos" de vida, acalentando potências que o Ser revelará em contato com esse tipo de matéria que define essas expressões ("A matéria é laço que prende o espírito" - O Livro dos Espíritos, questão 22): "Pela fé entendemos que os mundos pela palavra de Deus foram criados; de maneira que aquilo que se vê não foi feito do que é aparente" (Hebreus 11:3).

No versículo 32, do capítulo 24 de Mateus, vemos a proposição da Parábola da Figueira, anunciando, após a desativação do universo já explorado e em ruínas para a alma que o transcendeu em fixação de valores ali disponíveis (imagem do deserto, que é a transição entre polos ou ciclos evolutivos): "Quando já os seus ramos se tornam tenros e brotam folhas, sabeis que está próximo o verão". É a imagem do "renascimento", possível quando o sol - ou um "novo sol" - brilha com toda a sua intensidade, por isso o verão... Aqui Jesus caminha para as conclusões, após estudar, em figuras de linguagem, todo o périplo de evolução, em ciclos distintos de acordamento da mente, vislumbre de valores morais, dilemas entre retaguarda e vanguarda, afirmação de metas morais e seletividade na eleição de conteúdos, para que o "Filho do Homem" domine, e um novo "universo", em característica de "expansão", surja, como "caminho" para sua plenitude em Deus: "Igualmente, quando virdes todas estas coisas, sabei que ele está próximo, às portas. Em verdade vos digo que não passará esta geração sem que todas estas coisas aconteçam" (MT 24:33-34).

Jesus se refere depois ao dilúvio bíblico, quando Noé e os seus salvam da "destruição" um par de cada espécie existente (ou sete pares, de acordo com a espécie), na famosa Arca que construíra (Gênesis 7:1-3).

Como o assunto é evolução, a imagem não poderia ser mais perfeita.

Em Noé, temos a ordenação mental, a "casa mental", descrita por André Luiz na obra No Mundo Maior. E, diante dessas imagens de referência, em termos filosóficos, podemos ajuizar do que o Mestre descreve em seguida no seu Sermão tão rico de ciência da vida: "Porquanto, assim como, nos dias anteriores ao dilúvio, comiam, bebiam, casavam e davam-se em casamento, até ao dia em que Noé entrou na arca, e não o perceberam, até que veio o dilúvio, e os levou a todos, assim será também a vinda do Filho do Homem" (MT 24:38-39). O assunto diz respeito à preparação individual. A alusão aos que "casavam e davam-se em casamento" refere-se às escolhas pessoais, aos vínculos eletivos, pois, para buscar o Alto e a Deus, de modo a servi-lo, não podemos estar presos, escravizados a outros interesses: "Nenhum servo pode servir dois senhores; porque, ou há de odiar um e amar o outro, ou se há de chegar a um e desprezar o outro. Não podeis servir a Deus e a Mamom" (LC 16:13). Sem qualquer nota de radicalismo, esses textos revelam a "imaturidade" das criaturas, pois, sem foco, sem convencimento, a conversão a um ideal não se dá, e o coração estará sempre preso ao que mais interessa ao indivíduo.

Daí Deus usar o tempo e nunca violentar consciência alguma. "Comer e beber" significam as "trocas" compensatórias em que as almas se nutrem, se fixam, se entregam e se comprazem. Jesus nos daria um exemplo de sublimação desses atos, quando diz: "A minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou, e realizar a sua obra" (JO 4:34). "Então, estando dois no campo, será levado um, e deixado o outro; estando duas moendo no moinho, será levada uma, e deixada outra"(MT 24:40-41). Nestas imagens, a sabedoria do Senhor se estampa de modo extraordinário, vinculando razão e sentimento, homem e mulher, ativo e passivo, macho e fêmea, consoante ocorrera nos pares de toda espécie que adentraram o "porão" da Arca de Noé. O "campo" é externo, seu explorador é o "varão", ou seja, a "razão": "E Adão pôs os nomes a todo o gado, e às aves dos céus, e a todo o animal do campo" (Gênesis 2:20). Já o papel da "mulher", que é a expressão do "sentimento", como "adjutora" do "varão", é "moer no moinho", e este é trabalho interno, implicando decodificar, em plano prático, as concepções que o "varão" nomeia, para expansão da mente: "E chamou Adão o nome de sua mulher Eva; porquanto era a mãe de todos os viventes" (Gênesis 3:20). A dualidade que dinamiza a existência na Terra guarda essa peculiaridade, que pode ser concebida a partir do dilema "espírito" e "matéria". Os dois se fundem, mas, no momento da aferição, somente um é levado, ou seja, no plano das conquistas evolutivas, somente o valor moral, que é atributo do Espírito "desperto"(talento vivenciado, sabedoria), é que vai. O outro fica, por pertencer aos mundos onde as almas ainda primitivas ou viciadas irão dele se ocupar, para saturação e projeção essencial no tempo.

Desse modo, tudo passa, por ser condição transitória de aprendizado.

Os luminares da Terra e o nosso próprio Globo desaparecerão quando nossas almas se projetarem para mundos da ordem mais elevada, quais os existentes em Sirius, em Betelgeuse, em Canopus... Lá, os "sóis" são outros, e as "estrelas", que configuram conquistas, virtudes balizarão, através de influências dinâmicas e vivas, o nosso florescer para a grandeza imensurável do Criador e Pai. E tudo o que nos ensinou Jesus, o Cristo imortal, são palavras, ou melhor, verdades, que nunca se apagarão: "O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não hão de passar" (MT 24:35).






FIM